Resumo
Este artigo reflete sobre a diferença substancial entre o ato de declarar imposto de renda numa monarquia cristã e numa república secular. Propõe-se que, sob o Império do Brasil — herdeiro espiritual da tradição portuguesa fundada no milagre de Ourique —, o tributo adquire um caráter de prestação moral, confissão pública e confirmação da ordem justa. Em contraste, sob a república burocrática e positivista, o imposto se torna frio, contábil e desumanizador. O texto argumenta que apenas dentro de uma monarquia legítima, fundamentada nos méritos de Cristo e sustentada pelo Poder Moderador, o ato tributário revela sua verdade como poiesis social.
1. Introdução
Dentre os inúmeros atos que um cidadão realiza ao longo da vida, poucos parecem tão áridos quanto a declaração do imposto de renda. Na república moderna, este rito anual é reduzido a um dever contábil, imposto por um Estado que não é pai, mas carcereiro. No entanto, à luz da tradição monárquica cristã, este mesmo ato pode adquirir um significado radicalmente diferente: a prestação de contas a um soberano legítimo, que, como vassalo de Cristo, exerce o poder em nome do bem comum.
2. A Monarquia como ordem providencial
Desde o milagre de Ourique, no qual D. Afonso Henriques ouviu de Cristo o chamado para fundar um reino, a monarquia portuguesa foi concebida como uma missão espiritual: proteger o povo, expandir a fé e manter a unidade^1. O Brasil, como desdobramento desse projeto, herdou essa missão. Dom Pedro II, em seu reinado, encarnou essa continuidade histórica, sendo não apenas chefe de Estado, mas pai da nação.
A monarquia, segundo Burke, “é a mais poética de todas as instituições políticas”^2. Ela estabelece uma relação viva entre o governante e o governado — uma relação que é mais do que contrato: é aliança. Por isso, a tributação sob o Império do Brasil não deveria ser entendida como extorsão, mas como manifestação de pertença a uma ordem superior.
3. O imposto como ato de confissão pública
Ao declarar o imposto de renda sob a autoridade de um imperador — vassalo de Cristo e guardião da justiça —, o cidadão reconhece a fonte legítima de poder. O tributo deixa de ser apenas uma transferência de recursos e se torna um testemunho do que faço e deixo de fazer diante do soberano. A tradição cristã sempre viu o rei como ministro da justiça de Deus^3, e o ato fiscal, nesse contexto, torna-se um gesto de consciência.
O imposto é então comparável à confissão: revela o trabalho realizado, as posses adquiridas e os bens administrados, tudo isso dentro da ordem moral. É um exame de consciência público, perante aquele que, ungido pelo dever do Poder Moderador, vela pela justiça e equilibra os poderes.
4. A frieza republicana
A república, fundada sobre os escombros da monarquia e imersa no positivismo jurídico, rompe esse laço sagrado. O Estado moderno já não é expressão do bem comum, mas instrumento de vontade partidária e interesse ideológico. A cobrança de tributos sob tal regime é desprovida de beleza, de justiça e de proporção.
Na linguagem contábil da Receita Federal, o cidadão não é mais sujeito moral, mas contribuinte. A declaração do imposto torna-se então um ato coercitivo, despersonalizado, submetido ao terror fiscal do Leão, símbolo de força bruta e não de realeza legítima.
5. O Poder Moderador e a proteção contra os maus governos
O Poder Moderador, tal como estabelecido na Constituição do Império de 1824, era a instância espiritual da política brasileira^4. Não servia para governar diretamente, mas para impedir que as paixões humanas corrompessem o governo. Ele representa o freio último ao arbítrio dos poderes e garante a unidade nacional.
Sob este regime, o imposto de renda é um ato de confiança: o povo oferece parte de seus frutos ao soberano, confiando que este os empregará com sabedoria, nos méritos de Cristo. A beleza dessa relação é visível: trata-se de uma poesia em ato, como dizia o autor deste ensaio.
6. Conclusão: conhecer a verdade, viver a beleza
A monarquia cristã revela o sentido histórico das coisas porque se ancora na verdade. Ao conhecer a verdade sobre a ordem política, reconhece-se que o imposto pode ser uma forma de serviço, não de servidão; uma manifestação de liberdade ordenada, não de submissão fiscal.
Por isso, afirmar que a declaração do imposto de renda é bela sob a monarquia e fria sob a república não é exagero, mas expressão de uma verdade que une teologia, história e filosofia política. É reconhecer que a beleza da ordem justa não está na forma do formulário, mas no coração daquele que oferece, sabendo que sua oferta se insere num projeto de salvação comum.
Referências
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COSTA, A. C. Ourique: Mito e História. Lisboa: Fundação para a Ciência e a Tecnologia, 2004.
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BURKE, Edmund. Reflexões sobre a Revolução em França. São Paulo: Martins Fontes, 2002.
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SANTO TOMÁS DE AQUINO. Suma Teológica, I-II, q. 96-97. Trad. Frei Leonardo. São Paulo: Loyola, 2005.
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BRASIL. Constituição Política do Império do Brasil (1824). Disponível em: http://www.planalto.gov.br. Acesso em: 18 jul. 2025.
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