Quando acompanho a política, não o faço como quem assiste a um espetáculo ou busca uma torcida para chamar de sua. Acompanho com olhos de historiador. Aprendi que todo fato político é, antes de tudo, um documento histórico bruto: algo que só revela sua verdadeira natureza depois que o tempo o depura. O que hoje parece escandaloso, amanhã será banal. O que hoje parece grandioso, amanhã talvez não passe de um erro de cálculo. Por isso, me reservo o direito de esperar.
Essa atitude de espera — que me parece cada vez mais necessária — foi a minha defesa contra o alarmismo e o sensacionalismo das notícias. Recuso-me a ser arrastado pelas ondas da indignação instantânea ou da comoção fabricada. Não porque seja frio, mas porque entendo que a emoção, para ser justa, precisa vir acompanhada da verdade. E a verdade, quase sempre, chega atrasada.
Foi por essa postura que me tornei, paradoxalmente, sensível ao que realmente importa e insensível ao que apenas parece importante. E isso, curiosamente, me vacinou contra o hype — não apenas na política, mas na vida.
A indústria dos jogos, por exemplo, vive de criar uma sensação de urgência artificial: ou você compra agora, ou perderá algo para sempre. Mas eu aprendi a esperar. O que hoje custa R$ 300, amanhã estará a R$ 30 — e melhor otimizado. Eu não compro o jogo do agora; eu compro o jogo do amanhã. E é com o dinheiro do amanhã, poupado hoje, que o trago para o presente. A poupança, nesse sentido, é a minha máquina do tempo. Através dos juros, compro o futuro com o suor do passado.
A mesma atitude vale para tudo aquilo que é vendido como “necessário”, “urgente”, “imperdível”. Aprendi a blindar-me contra o hype porque compreendi que ele é apenas a política do mercado aplicada à alma do consumidor. Ele quer me tornar histérico, reativo, viciado em recompensas imediatas. Mas eu prefiro ser lento, deliberado e — quem sabe — sábio.
Nicolás Gómez Dávila tem uma frase que me acompanha: “Quem não percebe a vaidade da política não compreendeu nada do homem”¹. A vaidade está no espetáculo, no frenesi, no presente contínuo sem memória nem finalidade. Contra isso, só a consciência do tempo salva — o tempo histórico, que tem relação com o kairológico, não com o cronológico. É nesse ponto que Eric Voegelin me ensinou que a consciência política verdadeira é sempre simbólica e está enraizada em experiências de ordem².
Foi Olavo de Carvalho, por sua vez, quem me advertiu que “o histérico é o escravo do tempo, o filósofo é seu mestre”³. A histeria é o alimento do hype. A filosofia, sua antítese. A espera deliberada, a recusa em se curvar ao “agora”, é um ato de resistência contra a decadência.
Essa forma de vida tem um preço: é preciso suportar o escárnio dos apressados, a incompreensão dos entusiastas e o silêncio dos algoritmos. Mas também tem uma recompensa: a liberdade.
É por isso que não nutro ilusões sobre esta vida. Sei que tudo passa, que a espuma dos dias se dissipa, e que o tempo é o único juiz que jamais erra. Por isso, espero. E, esperando, permaneço.
Notas de rodapé
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DÁVILA, Nicolás Gómez. Escolios a un texto implícito. Bogotá: Villegas Editores, 2001.
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VOEGELIN, Eric. A nova ciência da política. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1982.
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CARVALHO, Olavo de. O imbecil coletivo: atualidades inculturais brasileiras. 3. ed. Rio de Janeiro: Record, 1998.
Referências
CARVALHO, Olavo de. O imbecil coletivo: atualidades inculturais brasileiras. 3. ed. Rio de Janeiro: Record, 1998.
DÁVILA, Nicolás Gómez. Escolios a un texto implícito. Bogotá: Villegas Editores, 2001.
VOEGELIN, Eric. A nova ciência da política: uma introdução. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1982.
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