Resumo
Este artigo analisa as consequências da abolição do Index Librorum Prohibitorum em 1966, sob o pontificado de Paulo VI, à luz das mudanças eclesiásticas ocorridas após o Concílio Vaticano II. Argumenta-se que tal abolição, embora justificada como uma adaptação à maturidade dos fiéis e à liberdade intelectual, representou um erro estratégico que abriu caminho para a infiltração ideológica da teologia da libertação. Sustenta-se que a ausência de um mecanismo eficaz de discernimento doutrinário permitiu a expansão de ideias marxistas em instituições de ensino católicas, especialmente nos cursos de filosofia, história e geografia. O artigo propõe uma revalorização da tradição católica no combate aos erros modernos.
Palavras-chave: Index Librorum Prohibitorum, teologia da libertação, Concílio Vaticano II, modernismo, educação católica, Paulo VI, marxismo cultural.
1. Introdução
O desaparecimento do Index Librorum Prohibitorum, decretado oficialmente em 14 de junho de 1966 por Paulo VI, foi um marco decisivo na relação entre a Igreja Católica e a cultura contemporânea. Criado como instrumento disciplinar após o Concílio de Trento, o Index visava proteger os fiéis dos erros doutrinários que ameaçavam a fé e os costumes. Com sua abolição, a Igreja optou por substituir a proibição pela formação da consciência, confiando na maturidade espiritual e intelectual dos fiéis. No entanto, como argumenta-se neste artigo, tal decisão revelou-se equivocada à luz dos frutos colhidos nas décadas seguintes, especialmente no campo da educação católica e da ascensão da teologia da libertação.
2. O Index como instrumento de defesa da fé
Instituído de forma sistemática por Paulo IV, em 1559, e reformado por Pio IV em 1564, o Index passou a ser gerido pela Sagrada Congregação do Índice, posteriormente incorporada à Congregação para a Doutrina da Fé. O critério para inclusão de obras era teológico, filosófico e moral. O Papa Leão XIII, em sua encíclica Aeterni Patris (1879), reforça o papel do Magistério na vigilância doutrinária e na proteção dos fiéis contra os erros filosóficos do tempo — especialmente o racionalismo e o naturalismo1.
A função do Index era, portanto, pedagógica e pastoral. Como observa o cardeal Giuseppe Siri, a autoridade do Magistério “não visa sufocar a liberdade, mas guiar o intelecto pela luz da verdade revelada”2. A Igreja não proibia por censura moral, mas por zelo pastoral.
3. A abolição do Index no contexto do Concílio Vaticano II
O Concílio Vaticano II (1962–1965) promoveu uma abertura ao mundo moderno, especialmente através das constituições Gaudium et Spes e Dignitatis Humanae, que reformularam a relação entre fé e liberdade religiosa. Nesse novo clima eclesial, a manutenção do Index foi considerada inadequada. A Instrução da Sagrada Congregação para a Doutrina da Fé, de 1966, declara:
“A Igreja confia agora mais do que nunca na consciência dos fiéis instruídos, na responsabilidade dos educadores e dos teólogos”3.
Entretanto, essa confiança mostrou-se excessiva e não acompanhada por uma formação doutrinária sólida, especialmente no clero e nos professores de escolas e universidades católicas.
4. A teologia da libertação e o vácuo deixado pelo Index
A partir do final da década de 1960, teólogos como Gustavo Gutiérrez, Leonardo Boff e Jon Sobrino começaram a articular um novo paradigma teológico que interpretava a fé à luz das categorias marxistas. Embora João Paulo II e Bento XVI tenham promovido uma crítica contundente à teologia da libertação4, o estrago já estava feito: essa teologia encontrou espaço exatamente onde a vigilância doutrinária foi relaxada.
Na prática, muitos seminários, escolas católicas e universidades se tornaram espaços de propagação de ideias revolucionárias, revestidas de linguagem cristã. Em vez de preservar a doutrina dos Apóstolos, essas instituições passaram a formar agentes de transformação social com inclinações comunistas.
5. A escola católica como risco de doutrinação ideológica
Nos tempos atuais, paradoxalmente, o ambiente mais perigoso para a fé de uma criança pode ser justamente uma escola católica, se nela imperarem professores doutrinados pela teologia da libertação ou por uma visão secularizante da história. Os cursos de filosofia, história e geografia, em especial, são os mais contaminados.
Como dizia Dom Antônio de Castro Mayer:
“Se a autoridade não vigia os erros que se infiltram, acaba sendo cúmplice deles”5.
A omissão pastoral, fruto do abandono do rigor doutrinário representado pelo Index, é uma das causas principais da decadência do ensino católico e da perda da fé por parte de muitos jovens.
6. Considerações finais
A abolição do Index Librorum Prohibitorum deve ser considerada, do ponto de vista histórico e estratégico, um erro grave da parte da hierarquia eclesiástica. Ao retirar um dos instrumentos mais eficazes de vigilância doutrinária sem colocar em seu lugar outro mecanismo funcional, a Igreja permitiu a infiltração de doutrinas perigosas, como a teologia da libertação. A crise atual da fé católica, especialmente no campo educacional, exige a recuperação da vigilância doutrinal, da autoridade magisterial e da fidelidade à tradição.
Referências
LEÃO XIII. Aeterni Patris. Roma, 1879. Disponível em: https://www.vatican.va. ↩
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SIRI, Giuseppe. Gethsemani: Riflessioni sul Movimento Teologico Contemporaneo. Roma: Edizioni Fiducia, 1980. ↩
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CONGREGAÇÃO PARA A DOUTRINA DA FÉ. Notificação sobre o Index dos livros proibidos, 1966. ↩
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JOÃO PAULO II. Instrução sobre alguns aspectos da Teologia da Libertação. Congregação para a Doutrina da Fé, 1984. Assinada pelo Cardeal Joseph Ratzinger. ↩
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CASTRO MAYER, Dom Antônio. Cartas Pastorais e Textos Doutrinários. Campos: Editora Permanência, 1981. ↩
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