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terça-feira, 8 de julho de 2025

Folga como Estratégia: a gestão de talentos no beisebol profissional

Em poucas modalidades esportivas o desgaste físico e mental é tão constante quanto no beisebol profissional. Na Major League Baseball (MLB), por exemplo, as equipes enfrentam uma maratona de 162 jogos durante a temporada regular, sem contar os playoffs. Com partidas praticamente todos os dias — muitas vezes em cidades diferentes, exigindo viagens aéreas constantes e mudanças de fuso horário —, a manutenção da performance dos atletas se torna um desafio tanto físico quanto estratégico.

Nesse contexto, a prática de conceder dias de folga remunerada aos jogadores mais produtivos não é apenas um gesto de cortesia. Trata-se de uma medida calculada, com objetivos de curto, médio e longo prazo. A folga, nesse caso, não é sinônimo de ausência ou displicência — é parte de um plano de conservação e maximização do talento ao longo de uma longa e exigente jornada competitiva.

Descanso como ativo

Tomemos como exemplo Clayton Kershaw, arremessador do Los Angeles Dodgers. Em várias temporadas, Kershaw teve seu calendário cuidadosamente administrado, com folgas intercaladas durante a temporada regular, mesmo estando em plena forma. O objetivo? Preservar seu braço para outubro, quando os Dodgers esperavam disputar a World Series¹.

Outro exemplo é Aaron Judge, astro do New York Yankees, conhecido por sua explosão ofensiva. Em 2022, mesmo em meio a uma temporada histórica com 62 home runs — quebrando o recorde da Liga Americana —, o técnico Aaron Boone o poupou em algumas partidas estratégicas para manter sua consistência ao longo da temporada². Resultado: Judge não apenas terminou como líder em home runs, mas também foi coroado com o prêmio de MVP.

Esses casos revelam que o descanso, longe de ser sinal de fraqueza ou luxo, é ativo tático fundamental em uma liga que exige constância e resiliência.

Desenvolvimento de novos talentos

Essas folgas abrem espaço para outro objetivo igualmente importante: dar rodagem aos jovens jogadores das ligas menores (Minor Leagues). Cada franquia da MLB possui um sistema de desenvolvimento robusto, com várias equipes afiliadas em categorias como Triple-A, Double-A e Single-A. Quando um titular recebe folga, é comum que o time promova um jovem promissor para ocupar temporariamente sua vaga no elenco principal.

Foi o que aconteceu, por exemplo, com Juan Soto, promovido ao time principal do Washington Nationals em 2018, aos 19 anos, após uma lesão e descanso programado de alguns veteranos³. O jovem dominicano brilhou de imediato, tornando-se peça-chave na campanha que culminou no título da World Series em 2019.

Esses testes antecipados são fundamentais para preparar os jogadores para a atmosfera das grandes ligas, ensinando-lhes a lidar com a pressão do público, com a mídia, com o calendário apertado e, sobretudo, com o nível técnico dos adversários.

Comparações com outras modalidades

Essa filosofia de rotatividade e descanso seletivo também pode ser observada, com adaptações, em outras modalidades esportivas. Na NBA, por exemplo, tornou-se comum o conceito de load management, sobretudo com estrelas como Kawhi Leonard ou LeBron James, que em determinadas partidas da temporada regular são poupados para preservar seu rendimento nos playoffs⁴.

No futebol europeu, clubes como o Real Madrid ou o Manchester City frequentemente fazem rotação de elenco durante os torneios nacionais menos relevantes, poupando suas estrelas para a Champions League. A diferença, no entanto, é que o beisebol não oferece essa mesma flexibilidade tática durante os jogos: a substituição de um jogador é, na maior parte das vezes, definitiva. Isso exige ainda mais planejamento por parte dos técnicos.

Uma lição de gestão

No fundo, a prática de conceder folgas estratégicas é expressão de uma filosofia organizacional madura: reconhecer o valor do descanso, valorizar os talentos formados em casa e preparar o futuro sem sacrificar o presente. A franquia que consegue equilibrar essas dimensões forma uma cultura vencedora, onde o desempenho individual é protegido, o coletivo é fortalecido e o futuro é cultivado com sabedoria.

Em um mundo que glorifica a produtividade contínua e o esforço ininterrupto, o beisebol ensina algo precioso: saber parar é, muitas vezes, o que permite continuar vencendo.

Notas de rodapé

  1. VERDUCCI, Tom. Inside the Dodgers' master plan to manage Clayton Kershaw. Sports Illustrated, 2017.

  2. MLB. Aaron Judge rests as Yankees plan postseason push. Major League Baseball, 2022.

  3. SHEEHAN, Joe. The meteoric rise of Juan Soto. Baseball Prospectus, 2019.

  4. LEMIRE, Joe. The NBA's load management dilemma: science or strategy? The Athletic, 2021.

Referências bibliográficas 

LEMIRE, Joe. The NBA's load management dilemma: science or strategy?. The Athletic, 2021. Disponível em: https://theathletic.com. Acesso em: 08 jul. 2025.

MAJOR LEAGUE BASEBALL. Aaron Judge rests as Yankees plan postseason push. MLB, 2022. Disponível em: https://mlb.com. Acesso em: 08 jul. 2025.

SHEEHAN, Joe. The meteoric rise of Juan Soto. Baseball Prospectus, 2019. Disponível em: https://www.baseballprospectus.com. Acesso em: 08 jul. 2025.

VERDUCCI, Tom. Inside the Dodgers' master plan to manage Clayton Kershaw. Sports Illustrated, 2017. Disponível em: https://www.si.com. Acesso em: 08 jul. 2025.

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