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quinta-feira, 10 de julho de 2025

Entre cidades e civilizações: o elo perdido dos jogos estratégicos dos anos 90

No final dos anos 80 e início dos 90, três jogos fundadores estabeleceram os pilares da simulação estratégica digital:

  • SimCity (1989), criado por Will Wright;

  • Sid Meier’s Railroad Tycoon (1990);

  • Sid Meier’s Civilization (1991).

Esses três títulos não apenas nasceram em sequência, como conversam entre si silenciosamente — cada um abordando, sob uma lente distinta, a grande pergunta da modernidade:
Como construir, sustentar e expandir uma ordem civilizacional?

SimCity: A Arquitetura da Ordem

SimCity oferecia ao jogador a experiência de ser arquiteto e prefeito, decidindo zoneamento urbano, gestão fiscal e infraestrutura. A lógica era interna, centrada na cidade como organismo vivo.

O jogador de SimCity aprende, por tentativa e erro, que cidades são sistemas interdependentes. Água, eletricidade, transporte, impostos e educação formam uma rede de equilíbrios delicados. Era um jogo silencioso, sem batalhas, mas não menos dramático — o caos urbano era a punição por decisões desastrosas.

Railroad Tycoon: A Malha do Progresso

Railroad Tycoon inseria o jogador numa rede mais ampla: a dos fluxos entre cidades.
Ao conectar centros urbanos, o jogo ensina que o crescimento não vem apenas de dentro, mas da circulação entre polos.

No cenário alternativo do século XX sem automóveis, como discutimos, o jogo transcende sua dimensão logística e se torna um híbrido entre planejamento urbano e estratégia de mercado. O jogador deixa de ser apenas um barão dos trilhos e passa a ser um modelador de padrões civilizacionais.

É aqui que Railroad Tycoon vira o ponto de contato entre SimCity e Civilization.

Civilization: O Espírito do Tempo

Civilization, lançado em 1991, leva o raciocínio estratégico para a escala do tempo histórico e da cultura. O jogador já não controla uma cidade, nem uma ferrovia, mas uma civilização inteira, do alvorecer da humanidade até o futuro.

Enquanto SimCity foca no espaço urbano e Railroad Tycoon nos fluxos econômicos, Civilization trata da continuidade histórica, onde cada decisão molda o destino coletivo por milênios.

O elo que une: a conquista pela ordem

O que une esses três jogos é a ideia de ordem aplicada ao caos humano:

  • SimCity busca ordenar o presente urbano.

  • Railroad Tycoon busca ordenar o espaço entre cidades.

  • Civilization busca ordenar o tempo da história.

No mundo alternativo em que os trilhos dominam o século XX, o jogador de Railroad Tycoon é o elo que faltava entre o prefeito de SimCity e o líder de Civilization. Ele:

  • Planeja cidades ferroviárias (como em SimCity);

  • Conecta culturas e economias (como em Civilization);

  • E faz tudo isso com uma visão empresarial, mas profundamente enraizada na logística do mundo real.

Conclusão: A Trindade Fundadora da Estratégia

Entre 1989 e 1991, algo raro aconteceu: três jogos fundaram, em sequência, os três níveis da estratégia civilizacional:

  1. Cidade (SimCity),

  2. Rede (Railroad Tycoon),

  3. Civilização (Civilization).

Se retomarmos hoje o Railroad Tycoon com a mentalidade do século XXI — pensando em cidades ferroviárias, turismo sem carro e hubs intermodais — estamos, na verdade, realizando uma síntese do pensamento desses três jogos.

Não seria exagero dizer que a era de ouro da estratégia digital começou ali — e que seu espírito ainda pulsa quando pensamos em como planejar o futuro das cidades, das redes e das nações.

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