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quinta-feira, 12 de junho de 2025

O amor floresce no verão: por que o dia dos namorados faz mais sentido sob o sol?

Resumo

Este artigo propõe uma reflexão sobre a escolha da data do Dia dos Namorados no Brasil, considerando sua relação simbólica com as estações do ano, especialmente o verão. À luz da tradição cristã, argumenta-se que o namoro é uma forma elevada de amizade ordenada pela caridade, e que a celebração do amor entre homem e mulher ganha mais coerência simbólica e espiritual quando situada em uma estação que favorece o florescimento da vida, da convivência e do discernimento à luz da verdade.

Palavras-chave: namoro cristão, estações do ano, amizade, São Valentim, simbolismo.

Introdução

O Dia dos Namorados no Brasil é celebrado em 12 de junho, uma data próxima ao solstício de inverno. Embora popularmente associada a Santo Antônio, conhecido como “casamenteiro”, tal escolha não encontra respaldo em fundamentos simbólicos ou espirituais que justifiquem sua permanência nesta estação. O objetivo deste artigo é demonstrar que o verão, mais do que o inverno, oferece um ambiente simbólico e espiritual mais propício à celebração do amor cristão, entendido como amizade elevada e ordenada à caridade.

1. A amizade como fundamento do namoro cristão

A tradição cristã, especialmente a tomista, compreende a amizade como o mais nobre dos vínculos humanos. Para Tomás de Aquino, “a amizade é a virtude que mais se aproxima da caridade” (AQUINO, Suma Teológica, II-II, q. 23, a. 1). A caridade, por sua vez, é o amor a Deus acima de todas as coisas e ao próximo por amor a Deus. Assim, o verdadeiro namoro entre homem e mulher deve se configurar como uma amizade que se ordena aos fins da caridade, isto é, que deseja o bem eterno do outro.

Josiah Royce, em sua obra The Philosophy of Loyalty, sustenta que a amizade verdadeira exige compromisso mútuo com causas comuns (ROYCE, 1908). Este compromisso, no namoro cristão, é a busca da santidade. O casal, neste contexto, ama e rejeita aquilo que o próprio Cristo amou e rejeitou, discernindo juntos a vontade de Deus.

2. A estação da luz e do discernimento

O verão é, simbolicamente, a estação da plenitude da luz, do calor e da verdade. É o tempo da vida que se expande, dos encontros que se intensificam e das amizades que se fortalecem. As atividades ao ar livre, os encontros comunitários e a convivência contínua oferecem o cenário ideal para que o namoro se desenvolva com clareza, sinceridade e realismo.

Como explica Mircea Eliade, “as estações do ano não são apenas divisões cronológicas, mas modos simbólicos de existência” (ELIADE, 1978, p. 83). O inverno, marcado pela retração da natureza, simboliza introspecção e espera. Já o verão é símbolo de presença, manifestação e amadurecimento. Celebrar o amor no verão é, portanto, um gesto de adesão simbólica à luz, à clareza e à verdade, que são condições necessárias para o florescimento do amor cristão.

3. O deslocamento cultural da data no Brasil

Enquanto no hemisfério norte o Valentine’s Day é comemorado em 14 de fevereiro — no final do inverno, já na esperança da primavera —, no Brasil o Dia dos Namorados ocorre em 12 de junho, no início do inverno. A escolha da data no Brasil foi impulsionada por campanhas publicitárias da década de 1940 e associada à véspera da festa de Santo Antônio (GOMES, 2020). Não há, porém, relação com a simbologia das estações ou com a espiritualidade do amor cristão.

Cabe aqui uma pergunta crítica: por que não celebrar o amor em fevereiro, durante o verão brasileiro, quando se celebra também São Valentim, mártir do amor conjugal cristão? Tal deslocamento resgataria a coerência entre o amor humano elevado à caridade e a estação mais propícia ao seu florescimento.

4. A luz do sol, e a luz de Cristo, como condição do amor verdadeiro

O verão revela, o inverno esconde. As relações que sobrevivem à luz do verão — com seus convívios diários, exigências práticas e presenças constantes — são aquelas que tendem a amadurecer. O amor que depende apenas da proteção do frio, do isolamento romântico e da idealização sentimental pode ser belo, mas é muitas vezes frágil. A luz do verão prova os vínculos: revela o que é verdadeiro, desgasta o que é fantasioso e purifica o que é duradouro.

Como nos lembra Lewis: “o afeto entre homem e mulher só se torna caridade quando é iluminado pela verdade de Cristo” (LEWIS, 2005, p. 137). Nesse sentido, o verão não é apenas uma conveniência climática, mas um símbolo espiritual da verdade que deve iluminar os relacionamentos cristãos.

Considerações finais

O namoro cristão é uma forma de amizade orientada à santidade, vivida nos méritos de Cristo. Sendo uma amizade que exige discernimento, presença e clareza, faz mais sentido que sua celebração ocorra no verão — estação da luz, da convivência e do amadurecimento das relações. Resgatar o dia de São Valentim no Brasil como ocasião para celebrar o amor sob o sol seria, assim, um gesto simbólico e espiritual coerente com os princípios da fé cristã.

Notas de Rodapé

  1. A associação do Dia dos Namorados a Santo Antônio começou em São Paulo, com uma campanha publicitária da loja Clipper em 1949, organizada por João Doria, pai do ex-governador de São Paulo. Cf. GOMES (2020).

  2. São Valentim foi um sacerdote romano do século III que celebrava casamentos cristãos proibidos pelo império. Foi martirizado por fidelidade ao sacramento do matrimônio.

  3. O conceito de amizade como forma mais pura de convivência e princípio moral é explorado tanto por Tomás de Aquino quanto por Aristóteles. Cf. ARISTÓTELES (1991, Ética a Nicômaco, Livro VIII).

Referências bibliográficas

AQUINO, Tomás de. Suma Teológica. Trad. Alexandre Corrêa. São Paulo: Loyola, 2001. v. 3.

ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. Trad. Antonio de Castro Caeiro. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1991.

ELIADE, Mircea. O Mito do Eterno Retorno: arquétipos e repetição. 3. ed. Lisboa: Edições 70, 1978.

GOMES, Murilo. Dia dos Namorados: como surgiu a data no Brasil. Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br/nacional/dia-dos-namorados-como-surgiu-a-data-no-brasil/. Acesso em: 12 jun. 2025.

LEWIS, C. S. Os Quatro Amores. Trad. Fernanda Abreu. São Paulo: Thomas Nelson Brasil, 2005.

ROYCE, Josiah. The Philosophy of Loyalty. New York: Macmillan, 1908.

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