Desde muito cedo, fui educado a acreditar que a estabilidade no funcionalismo público era uma espécie de redenção social. Para minha mãe e meu irmão, a ideia de "passar num concurso" sempre foi vista como o ápice da realização profissional. Um emprego estável, com salário fixo, benefícios garantidos e a sonhada aposentadoria ao final de décadas de serviço. O mito da segurança estatal sempre teve lugar cativo nas conversas de família.
Mas o que para eles soa como estabilidade, para mim soa como prisão. O que para eles representa "status" e "vitória", para mim representa o fim silencioso daquilo que há de mais essencial em mim: minha liberdade interior, minha integridade intelectual e a coerência com a verdade que procuro honrar todos os dias.
O Preço da Falsidade Cotidiana
Quem me conhece sabe: não sou movido por conveniências. Nunca fui. Tenho horror à ideia de fingir ser o que não sou para agradar chefias medíocres, cumprir metas artificiais ou participar de joguinhos de bastidores que sustentam a cultura do carreirismo barato. Entrar num ambiente dominado por esse ethos seria, para mim, pagar para trabalhar — e o preço não seria apenas financeiro. Seria existencial.
O dinheiro ganho ali acabaria escorrendo pelo ralo de consultas psiquiátricas, sessões de terapia, compra de remédios controlados ou, pior ainda, da completa dessensibilização da minha alma. Eu sei onde essa estrada termina: no esvaziamento interior. No tipo de morte que não é física, mas que consome a alma por dentro, devagar, até o ponto em que a pessoa já não sabe mais quem é.
O Tal "Subemprego"
Hoje, trabalho como escritor. Para minha mãe e meu irmão, isso é visto como "subemprego". Aos olhos deles, alguém com formação em Direito deveria estar "ganhando bem", de preferência com um crachá da administração pública no peito.
O que eles não entendem é que o que eles chamam de "subemprego" é, na verdade, o que me permite respirar, pensar e viver de forma coerente com o que acredito. É o que me permite servir a Cristo através da verdade, da palavra escrita, e da construção de um legado intelectual que, mesmo pequeno, é autêntico.
Cada linha que escrevo é fruto de um combate interior, de uma resistência contra essa cultura da conveniência, que conserva o que é cômodo e despreza o que é verdadeiro.
Publicar ou Perecer
Cheguei a um ponto em que a decisão é simples: vou publicar o meu trabalho. Quem quiser reconhecer o valor daquilo que produzo, ótimo. Quem não quiser, paciência. Não estou aqui para mendigar validação social de quem mede a vida pelos parâmetros de um contracheque estatal.
Aos que tentam me empurrar para essa direção, só tenho uma coisa a dizer, com toda a caridade possível, mas também com toda a firmeza que o momento exige: o lugar de quem conserva o que é conveniente e dissociado da verdade, especialmente em tempos de crise moral e cultural como os que vivemos, é no quinto dos infernos.
E eu não tenho nenhuma intenção de fazer companhia.
Uma questão de honra
Minha luta não é contra a administração pública em si. Se um dia eu decidir entrar nesse mundo, será por uma decisão estratégica, consciente e com o claro propósito de manter minha integridade intacta. Não por medo, não por conveniência, e muito menos para agradar expectativas alheias.
Minha luta é contra a mediocridade. Contra o espírito de acomodação. Contra essa cultura que sufoca talentos, adoece consciências e transforma pessoas vivas em burocratas mortos-vivos.
Se for para viver, que seja com verdade.
Se for para morrer, que seja com honra.
Mas vender a alma por um salário no final do mês… isso nunca.
Referências Bibliográficas:
-
ROYCE, Josiah. The Philosophy of Loyalty. New York: Macmillan, 1908.
-
CARVALHO, Olavo de. O Jardim das Aflições. Rio de Janeiro: Record, 1995.
-
SANTO TOMÁS DE AQUINO. Suma Teológica. Tradução de Alexandre Corrêa. São Paulo: Loyola, 2007.
Nenhum comentário:
Postar um comentário