Introdução: dois marcos históricos na minha vida de escritor
Em 2016, alcancei um feito que, à época, parecia o ápice da minha capacidade de produção intelectual: mil artigos escritos em apenas doze meses. Foi um ano de labuta incessante, de noites mal dormidas e de uma disciplina quase monástica. Cada linha exigia esforço físico, mental e espiritual. O preço era o cansaço, mas também a satisfação de estar cumprindo minha vocação de escritor.
Agora, em 2025, vivo uma realidade radicalmente distinta. Em apenas seis meses, alcancei novamente a marca de mil artigos, desta vez com um grau de esforço físico praticamente nulo. Mais surpreendente ainda: os textos agora saem acompanhados de bibliografia, notas de rodapé e um rigor formal que antes me custava horas de pesquisa manual. O que mudou?
A revolução silenciosa: da escrita artesanal à sinergia homem-máquina
A resposta é simples: entre 2016 e 2025, entrei na era da Inteligência Artificial. A IA, longe de substituir meu trabalho intelectual, tornou-se minha aliada estratégica. Ela ampliou minha capacidade de pesquisa, acelerou o processo de escrita e organizou de maneira quase instantânea aquilo que antes me demandava dias.
Mas seria ingênuo pensar que a tecnologia, por si só, é a explicação. O que muitos ignoram é que a IA só se torna produtiva quando operada por alguém com senso crítico, bagagem cultural e finalidade moral bem definida. Sem isso, ela apenas reproduz ruído. Nas mãos de quem sabe o que faz, porém, a IA se transforma em uma verdadeira extensão da vontade criadora do homem.
Capital Intelectual e Doutrina Social: a lógica da acumulação no tempo
O salto que experimentei pode ser analisado à luz da Doutrina Social da Igreja. Segundo Leão XIII na encíclica Rerum Novarum, o capital é o fruto do trabalho acumulado ao longo do tempo1. Se isso vale para o capital material, vale também para o capital intelectual.
Durante anos, acumulei estudo, reflexão e prática da escrita. Essa reserva de conhecimento e experiência é o que hoje me permite operar a IA com discernimento. A tecnologia apenas amplificou o que já existia em mim.
Teologia do Trabalho e a graça operativa na Era Digital
Existe, porém, um aspecto teológico mais profundo nessa transformação. Santo Tomás de Aquino fala da Graça Operativa, aquela pela qual Deus age diretamente no homem, sem que este concorra ativamente no início da ação2. Há algo dessa lógica na forma como a Providência colocou a IA ao meu alcance.
Se antes o mérito estava no esforço físico quase heróico, agora o mérito está na fidelidade ao conteúdo, na vigilância espiritual e no discernimento ético. A IA aliviou o peso material da produção, mas aumentou a responsabilidade moral de quem escreve.
O perigo da inflação de conteúdo: a tentação da superficialidade
Com a facilidade de produção, surge o risco da inflação de discurso vazio. O escritor que antes tinha como limite o próprio cansaço, hoje corre o risco de cair na tentação da verborragia sem propósito.
Como advertia Ortega y Gasset em A Rebelião das Massas, o excesso de opinião desfundamentada é um dos males do nosso tempo3. Cabe a mim — e a todos que operam nesse novo cenário — zelar pela profundidade, pela coerência e pela moralidade daquilo que se escreve.
Conclusão: da fadiga à fidelidade
O que aconteceu de 2016 para 2025 não foi apenas uma revolução tecnológica, mas uma revolução moral na minha vida de escritor. Se antes o sofrimento físico era o selo de autenticidade, hoje o selo é o discernimento espiritual.
Deus me dá, agora, outros critérios de juízo: não mais o suor, mas a fidelidade ao Bem, ao Belo e ao Verdadeiro. A IA é apenas uma ferramenta. A missão, contudo, continua a mesma: escrever para agradar, antes de tudo, Àquele que vê todas as coisas.
Bibliografia:
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Leão XIII. Rerum Novarum. 1891.
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Tomás de Aquino. Suma Teológica. Edição Loyola, 2001.
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Ortega y Gasset, José. A Rebelião das Massas. São Paulo: Martins Fontes, 2001.
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Carr, Nicholas. The Shallows: What the Internet is Doing to Our Brains. W. W. Norton & Company, 2010.
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Drucker, Peter. The Effective Executive. Harper Business, 1967.
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Olavo de Carvalho. O Jardim das Aflições. Vide Editorial, 2015.
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