Certa vez me perguntaram, com aquele tom de brincadeira misturada com provocação: “Se você pudesse me raptar, para onde me levaria?”
De imediato, a pergunta parece apenas um jogo de imaginação. Mas, quando a encaro com a seriedade que dou às coisas do espírito, percebo que ela toca em algo mais profundo: o mistério da liberdade humana diante da vontade de Deus e da ordem objetiva das coisas.
O ato de raptar alguém, mesmo que consensual, carrega em si um simbolismo teológico que não posso ignorar: ele implica o exercício da minha vontade sobre a realidade de modo abrupto, forçando um deslocamento — geográfico, psicológico e moral — que nem sempre corresponde à ordem que Deus estabeleceu para as almas.
Se tudo fosse permitido, se a liberdade fosse apenas fazer o que se quer no momento em que se quer, talvez eu dissesse: “Eu te levaria para a Polônia”.
Não por mero capricho, mas porque a Polônia, para mim, é terra de testemunho, de fidelidade à Cruz em meio ao sofrimento, de resistência espiritual diante das potências que tentaram apagar nela a marca de Cristo. Levar alguém para lá seria, simbolicamente, levar para um lugar onde a história ensinou o valor da fé, da perseverança e da redenção.
Mas, ao mesmo tempo, sei que nem todas as fugas são legítimas. Nem toda aventura é santa. Há uma pedagogia da história pessoal que Deus conduz com sabedoria, e que me ensina que os laços que tenho com minha família — com seus limites, suas virtudes e suas fragilidades — são também instrumentos de minha santificação.
Meu pai e minha mãe, com sua visão conservadora da vida, são para mim um espelho da autoridade legítima. Neles, reconheço o eco da quarta promessa do Decálogo: “Honra teu pai e tua mãe, para que se prolonguem os teus dias sobre a terra.”
E se a obediência a essa ordem me custa, tanto melhor: é nesse custo que o amor se prova autêntico e a liberdade se purifica.
Raptar alguém, mesmo de modo consensual, seria romper com o princípio da harmonia entre a minha vontade e a vontade de Deus sobre a minha história. Porque a liberdade cristã não é licença para o capricho. Ela é sempre uma resposta responsável, iluminada pela consciência reta, moldada pela oração e afinada ao compasso da Providência.
Se um dia for para partir com alguém, que seja com a bênção dos que me amam e a quem devo honra. Que seja à luz do dia, sem sombra de culpa, sem escândalo, sem violência contra a paz dos outros. Que seja num espírito de missão, não de fuga.
Afinal, tudo aquilo que nasce contra a ordem de Deus, cedo ou tarde, traz consigo o peso da correção. E eu prefiro aprender pela via da graça do que pela via da dor.
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