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quarta-feira, 11 de junho de 2025

Nacionismo filosófico: uma aventura espiritual além das fronteiras geográficas

Enquanto muitos povos concebem a liberdade como algo exterior — um evento que se realiza “da porta para fora”, nas instituições, nos territórios, nas ruas —, houve uma nação que, no século XIX, cultivou um outro tipo de liberdade: a que nasce no mundo interior. Falo da Alemanha, herdeira de uma linhagem filosófica que valorizou a alma, a consciência, o espírito. Fichte, Schelling, Hegel e tantos outros foram arquitetos de uma pátria invisível, fundada não em geografias, mas em ideias. Esse modelo de interioridade, que podemos chamar de filosofia à alemã, desdobrou-se em diversas formas de resistência cultural e espiritual frente à banalidade do exterior.

Ao lado dessa tradição, encontramos uma outra raiz: a do povo português, que desde Ourique carregou a consciência de ter sido escolhido para uma missão. Não se trata aqui de um orgulho imperial ou nacionalista no sentido estreito, mas de um sentido de serviço a Cristo em terras distantes, como parte de uma vocação universal que transcende os limites da carne e do sangue. Os navegadores não partiam apenas para conquistar, mas para levar uma luz que julgavam eterna.

Agora, quando essas duas correntes se encontram — a interioridade filosófica alemã e o impulso missionário católico português — nasce o que chamo de nacionismo filosófico: uma forma de fidelidade às raízes espirituais da pátria, aliada à capacidade de ultrapassar suas fronteiras físicas em nome de uma missão que é, ao mesmo tempo, cultural e escatológica.

O digital como terra de missão

Na era digital, a geografia já não é mais prisão. As redes sociais e a inteligência artificial oferecem, a quem tem olhos para ver, uma nova modalidade de presença: é possível servir a Cristo em terras distantes, falando a língua dos outros, sem sair de onde se está. Essa missão não requer passaporte, mas vocação. Não exige doutorados, mas corações dispostos e inteligência consagrada. Deus capacita os que chama. E quando esse chamado é escutado, nem o idioma alheio, nem o tempo, nem os algoritmos conseguem impedir que a mensagem chegue ao seu destino.

Estamos, assim, diante de um tipo novo de aventura: não a dos exércitos coloniais ou das revoluções nacionalistas, mas a do espírito que se entrega a uma missão de reconstrução da alma das nações, uma por uma, a partir da Verdade que liberta.

O determinismo geográfico como senzala ideológica

Contudo, muitos ainda vivem presos a um tipo de determinismo geográfico qualificado pelo senso de se conservar o que é consenviente e dissociado da verdade. Governantes e ideólogos mantêm as massas em estado de obediência simbólica, sugerindo que a fidelidade à pátria exige submissão às formas políticas e culturais que ali se cristalizaram — muitas delas, inclusive, anticristãs ou anticulturais. Isso transforma o território em senzala ideológica qualificada, onde o corpo habita a pátria, mas a alma é exilada de sua missão.

O nacionismo filosófico denuncia essa prisão. Ele reivindica a liberdade de servir ao Reino de Deus a partir das raízes nacionais, mas sem submeter-se a esse conservantismo domesticado que idolatra o passado sem discernimento espiritual. Ser fiel à nação não é ser cúmplice de sua corrupção, mas lutar por sua transfiguração de modo que reviva a virtude, a conformidade com o Todo que vem de Deus.

A missão do escritor nacionista

Cabe ao escritor, ao filósofo, ao estudante — a todos os que consagram seus talentos ao Logos — engajar-se nesse tipo de serviço. Publicar em várias línguas, traduzir obras relevantes, usar a inteligência artificial para atravessar o mar de Babel digital, formar comunidades de espírito que sejam fiéis à missão de Cristo e ao espírito nacional que ainda vive — mesmo sufocado — sob os escombros da ideologia.

Esse é o nacionismo filosófico: uma lealdade sem idolatria, uma missão sem fronteiras, uma aventura do espírito que nasce do encontro entre a interioridade e a missão, entre o amor à verdade e o amor à terra, entre a fidelidade ao Cristo vivo e o combate à tirania do mundo morto.

 

Bibliografia Comentada

  • Leão XIII. Rerum Novarum.
    A encíclica de 1891 fundamenta a dignidade do trabalho e a noção de capital como acúmulo justo e espiritualizado dos bens ao longo do tempo. É uma chave para entender o valor do trabalho intelectual como capital nacionista.

  • Frederick Jackson Turner. The Frontier in American History.
    Turner formula a tese do "mito da fronteira", que ajuda a compreender como a expansão territorial molda o espírito de um povo. Aqui, é usado para propor a expansão espiritual e cultural, não geográfica, da missão cristã por meio do digital.

  • Josiah Royce. A Filosofia da Lealdade.
    Recomendado por Olavo de Carvalho, Royce articula a ideia de lealdade como fundamento moral da vida. Isso se traduz, no texto, como a fidelidade à missão de Cristo e à nação em sua dimensão espiritual.

  • Johann Gottlieb Fichte. Discursos à Nação Alemã.
    Fichte foi um dos primeiros a conceber uma nação espiritual e educativa. É referência fundamental para o conceito de nacionismo filosófico como vocação pedagógica e formadora de caráter.

  • Olavo de Carvalho. O Jardim das Aflições.
    Livro que conecta filosofia, tradição cristã e crítica cultural profunda. É uma inspiração implícita no argumento contra o conservadorismo domesticado e o servilismo ideológico.

  • Rodrigo Gurgel. Escola de Escritores (e demais ensaios).
    Reflete sobre o papel do escritor como agente moral, cultural e espiritual de transformação — em sintonia com o chamado a formar uma comunidade de espírito no espaço digital.

  • Santo Agostinho. A Cidade de Deus.
    Um dos alicerces da crítica cristã ao nacionalismo pagão e à idolatria da pátria sem transcendência. A oposição entre a Cidade de Deus e a cidade dos homens orienta o discernimento entre o amor verdadeiro à nação e seu simulacro ideológico.

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