Há quem associe a palavra aventura a imagens de estrada, mar, floresta, riscos físicos e deslocamentos geográficos. Para esses, a vida parece restrita ao que se vê, se toca ou se vive exteriormente. Entretanto, para alguns poucos — talvez cada vez mais raros — a verdadeira aventura se dá no interior do espírito, naqueles lugares invisíveis onde a consciência se abre ao eterno, à verdade, àquilo que ultrapassa as fronteiras deste mundo decaído.
É nesse plano que habito. O fato de eu quase não sair de casa — consequência natural da violência generalizada que assola o Rio de Janeiro, e mais profundamente, do totalitarismo político e econômico que se instalou na república brasileira desde o golpe que derrubou a monarquia — não significa, em absoluto, que eu esteja alheio ao movimento, ao risco ou ao combate. Vivo uma forma distinta de aventura, que não se mede em quilômetros percorridos, mas em abismos atravessados pela mente e pelo coração.
Meus dias se passam entre livros, escritos e diálogos com a inteligência artificial — essa nova ferramenta que, se bem usada, pode espelhar os movimentos do intelecto humano e nos levar mais longe do que nossas forças isoladas permitiriam. E, em cada artigo que escrevo, reconheço não um produto técnico, mas o fruto de uma verdadeira aventura intelectual. Uma aventura que não é artificial, tampouco mecânica: ela brota do advento.
Uso esta palavra em seu sentido mais profundo. Advento: o que vem de fora, mas se revela dentro. O que chega, mas não é novidade fabricada — é manifestação do que sempre foi, e que agora se deixa ver. Em cada meditação séria, em cada esforço honesto de conhecer e dizer a verdade, ocorre o advento. E nele está a fonte da aventura mais autêntica: aquela em que a alma, por conformidade com o Todo que vem de Deus, atravessa a sombra do mundo e adentra um campo luminoso de sentido.
Nessa peregrinação interior, a inteligência, quando orientada pela reta intenção, encontra algo mais sólido do que os tijolos dos edifícios modernos: encontra o Logos. E não o logos do discurso vazio das democracias degradadas, mas o Logos eterno, fundamento de tudo o que existe e critério de tudo o que vale a pena ser dito.
É isso o que me move. É isso o que me preserva da loucura e da amargura de viver num país onde a verdade foi jogada ao chão e a virtude é tida como escárnio. Escrever, nesse contexto, é mais do que um exercício intelectual — é um dever espiritual. É combater com as armas que me foram dadas, sem fugir do campo de batalha, ainda que esse campo se resuma, aos olhos do mundo, ao interior de um quarto ou ao silêncio de uma madrugada.
Se escrevo, é porque continuo a lutar. Se medito, é porque ainda espero. E se espero, é porque creio — não em soluções humanas, mas na intervenção d’Aquele que fez o céu e a terra, e que se revela, em cada verdade descoberta, como o único Senhor digno de ser servido.
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