Pesquisar este blog

quinta-feira, 12 de junho de 2025

O espírito financeiro de um sobrevivente da hiperinflação que houve no Brasil nos anos 80

Vivi a hiperinflação brasileira quando era criança. Vi minha família correr ao supermercado logo após o pagamento, pois sabíamos que, se esperássemos uma semana, os preços dobrariam. Vi minha mãe fazer contas mirabolantes na ponta do lápis, e meu pai, com olhar grave, transformar salário em comida antes que virasse pó. E foi nessa escola dura — feita de prateleiras vazias, tabelas confusas e medo constante — que aprendi o que hoje chamo de cultura patrimonial.

Enquanto muitos hoje falam de educação financeira baseada em teorias importadas ou algoritmos de investimento, a minha lógica nasceu do instinto de sobrevivência em tempos de caos monetário. Essa cultura, herdada e cultivada, tornou-se um modo de ser. Um modo de resistir. Um modo de servir.

1. Dólar na máxima: precificar no pior cenário

Quando compro algo em dólar, trabalho com a máxima histórica da moeda — R$ 6,27, segundo meus registros. Não porque acredito que o dólar vá necessariamente voltar a esse patamar, mas porque aprendi que só se deve entrar em um compromisso financeiro se ele puder ser honrado no pior cenário possível.

É uma forma de praticar prudência, não pessimismo. E mais: é uma maneira de treinar o espírito para suportar adversidades sem perder a compostura.

2. Parcelamento consciente: 12 vezes sem juros, sempre

Evito juros como quem evita veneno. Parcelo minhas dívidas em 12 vezes iguais e sem juros — não para me iludir com o valor mensal, mas para administrar a liquidez com método e sobriedade. A dívida, assim organizada, torna-se um exercício de disciplina e controle, e não um peso ansioso no horizonte.

3. A regra dos três: poupança mínima de cobertura

Não executo uma compra ou um compromisso se minha poupança não cobre ao menos três vezes o valor da dívida. Essa é minha regra de ouro. Isso garante que não só consigo pagar, como também posso continuar vivendo e produzindo mesmo diante de eventos imprevistos.

Poupança, para mim, não é dinheiro parado. É capital moralizado. É confiança acumulada. É o fôlego do trabalhador honesto diante de um mundo instável.

4. Divisão por 60: o longo prazo como simulação de humildade

Quando o valor é alto demais, divido por 60. Não porque vá pagar por cinco anos, mas porque preciso visualizar o custo da paciência. Faço as contas como se tivesse que arcar com apenas R$ 5,00 por mês — o mínimo absoluto. E daí, vou multiplicando, ajustando, otimizando, até encontrar o valor ideal que não fere minha dignidade nem compromete meu dever de estado.

Essa prática me ensina que o tempo não é inimigo da riqueza, mas seu guardião. O homem que sabe esperar sem perder o controle é mais rico que o homem apressado com muitos bens.

5. Herança cultural e fé: a economia como serviço

Não sou apenas alguém que faz contas. Sou alguém que carrega a memória de um povo que sobreviveu ao colapso do seu próprio dinheiro. E não sobrevivi para repetir os erros, mas para reordenar as finanças segundo princípios mais altos.

Em tudo o que faço, recordo que meus talentos — inclusive os financeiros — não me foram dados para luxo, ostentação ou fuga da realidade. Foram me dados para servir, construir, socorrer e testemunhar. O capital que tenho é fruto do trabalho, da leitura, da vigilância e da oração. E é isso que tento multiplicar com inteligência e fidelidade.

Conclusão: O legado de uma cultura resiliente

Enquanto o mundo se agita ao sabor das bolsas, das criptomoedas e das promessas de enriquecimento fácil, sigo com meu modelo:

  • baseado no pior cenário,

  • ancorado na poupança concreta,

  • sustentado por valores eternos.

Minha economia é real porque nasceu do sofrimento real. E porque confio em um bem maior do que o ouro ou o dólar: a verdade que liberta e sustenta os justos.

Se um dia minha história puder servir a outros que buscam viver com integridade num mundo instável, então minha memória da hiperinflação não terá sido em vão.

Nenhum comentário:

Postar um comentário