Introdução
A morte de um proprietário de imóvel gera uma série de efeitos jurídicos, especialmente no campo do direito tributário e do direito sucessório. Uma dúvida recorrente é: é legal cobrar IPTU de uma pessoa falecida? Quem responde por esse tributo? Este artigo aborda essa questão à luz da legislação brasileira, da doutrina e da jurisprudência, oferecendo esclarecimentos sobre os direitos e deveres dos sucessores em relação ao IPTU.
1. O que é o IPTU e quem é o sujeito passivo?
O Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) é um tributo municipal, de competência dos Municípios e do Distrito Federal, conforme estabelece o artigo 156, I, da Constituição Federal de 1988.
O sujeito passivo do IPTU é, em regra, o proprietário, o titular do domínio útil ou o possuidor do imóvel urbano, conforme o artigo 34 do Código Tributário Nacional (Lei nº 5.172/1966):
Art. 34. Sujeito passivo do imposto é o proprietário do imóvel, o titular do seu domínio útil, ou o seu possuidor a qualquer título.
2. O que acontece com o IPTU após o óbito?
Quando o proprietário falece, não se extingue imediatamente a obrigação tributária, mas ocorre uma alteração no sujeito passivo.
O artigo 131, I, do Código Tributário Nacional (CTN) prevê:
Art. 131. São pessoalmente responsáveis:
I - o espólio, pelos tributos devidos pelo de cujus até a data da abertura da sucessão.
Portanto, até a conclusão do inventário, o espólio — que é a massa patrimonial do falecido — responde pelos tributos, incluindo o IPTU.
Após o encerramento do inventário, os herdeiros passam a ser responsáveis na proporção dos bens que lhes couberam, conforme o artigo 130 do CTN:
Art. 130. Os créditos tributários relativos a impostos cujo fato gerador seja a propriedade, o domínio útil ou a posse de bens imóveis transmitem-se aos adquirentes a qualquer título e aos sucessores, a qualquer título, de bens imóveis.
3. A ilegalidade de cobrar IPTU diretamente do falecido
É ilegal e tecnicamente nula qualquer cobrança de IPTU direcionada a uma pessoa falecida, uma vez que, na linguagem jurídica, essa pessoa não possui mais personalidade civil nem capacidade tributária passiva.
Nos termos do artigo 6º do Código Civil:
Art. 6º. A existência da pessoa natural termina com a morte.
Portanto, ao falecer, extingue-se a personalidade civil e, consequentemente, a titularidade ativa e passiva de direitos e deveres.
Se a Prefeitura, por erro, ajuiza uma execução fiscal em nome do falecido, esse processo é absolutamente nulo, conforme entendimento pacífico da jurisprudência.
✔️ Jurisprudência exemplificativa:
“É nula a execução fiscal ajuizada em face de pessoa falecida, devendo ser extinta sem resolução do mérito, nos termos do art. 485, VI, do CPC.”
(TJSP - Apelação Cível nº 1016495-59.2019.8.26.0003)
4. Como deve proceder a administração tributária
A Fazenda Pública deve observar o correto procedimento:
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Identificar, por meio dos cartórios de registro de imóveis e cartórios de registro civil, a ocorrência do óbito;
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Direcionar a cobrança tributária ao espólio, representado pelo inventariante;
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Na ausência de inventário, pode direcionar aos herdeiros conhecidos, conforme dispõe o artigo 796 do Código de Processo Civil (CPC).
Art. 796. O espólio será representado em juízo, ativa e passivamente, pelo inventariante.
5. Responsabilidade dos herdeiros
Os herdeiros não respondem ilimitadamente pelos débitos tributários do falecido. O artigo 1.997 do Código Civil determina:
Art. 1.997. Os herdeiros não respondem por encargos superiores às forças da herança.
Portanto, a dívida de IPTU e de outros tributos incidentes sobre o imóvel não pode ultrapassar o valor dos bens herdados.
6. Conclusão
Não é possível, sob nenhuma hipótese, cobrar IPTU diretamente de uma pessoa falecida. Tal cobrança é nula, e qualquer execução fiscal ajuizada em nome de pessoa que já faleceu deve ser extinta sem resolução do mérito.
Por outro lado, o espólio responde pelos tributos incidentes sobre os bens deixados, inclusive o IPTU, até a partilha. Após a partilha, os herdeiros assumem a responsabilidade, sempre limitada ao valor dos bens recebidos.
Referências Legais
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Constituição Federal, art. 156, I;
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Código Tributário Nacional (Lei 5.172/66), arts. 34, 130 e 131;
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Código Civil, arts. 6º e 1.997;
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Código de Processo Civil, art. 796.
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