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sexta-feira, 23 de maio de 2025

Do poste ao preposto: uma análise comparada entre Dilma Rousseff no Brasil e Andrzej Duda na Polônia

Introdução

O conceito popular de "poste" na política refere-se à figura de um governante colocado no cargo por um mentor mais poderoso, geralmente para manter sua influência sobre a máquina estatal sem ocupar formalmente o poder. Contudo, esse termo, muitas vezes usado de maneira vulgar e simplificada, carece de precisão técnica. Quando observado com rigor analítico, ele pode se desdobrar em figuras jurídicas e políticas bem mais densas, como preposto, fâmulo e até laranja — termos que indicam diferentes graus de instrumentalização de um agente por outro.

Este artigo busca comparar dois casos emblemáticos na política contemporânea: Dilma Rousseff no Brasil e Andrzej Duda na Polônia. Embora superficialmente ambos sejam rotulados como "postes" — respectivamente de Luiz Inácio Lula da Silva e Jarosław Kaczyński —, uma análise detida revela diferenças estruturais profundas, tanto na natureza da relação de subordinação quanto nos efeitos institucionais decorrentes.

O Caso Brasileiro: Dilma Rousseff, Mais que um Poste

Dilma Rousseff foi eleita presidenta do Brasil em 2010, sucedendo Luiz Inácio Lula da Silva, que encerrava seu segundo mandato com altos índices de popularidade. Desde o início, ficou claro que sua candidatura tinha como finalidade a preservação do projeto de poder do Partido dos Trabalhadores (PT) e, sobretudo, do próprio Lula.

No entanto, a relação de Dilma com Lula transcendeu o conceito de poste. A expressão, nesse caso, revela-se insuficiente para captar a natureza jurídica e política da relação. Dilma foi, na prática, preposta de Lula. No Direito, o preposto é aquele que age em nome de outrem, sob suas ordens e no interesse deste. Mais que isso, Dilma operou como fâmulo, termo que descreve alguém que executa as ordens de outro de maneira quase servil, sem autonomia decisória significativa.

Por fim, é possível sustentar, do ponto de vista penal, que Dilma funcionou também como laranja, no sentido de pessoa física que empresta seu nome e seu cargo para que outro — Lula, no caso — continue a exercer, de fato, influência direta sobre os negócios do governo, ainda que sem mandato formal.

O ponto central desse fenômeno se ancora na teoria do domínio final do fato, consagrada na doutrina penal moderna, especialmente por Claus Roxin. Lula, embora formalmente fora do governo, possuía controle sobre as decisões-chave, o que se caracteriza como exercício ilícito do poder, configurando tráfico de influência e, potencialmente, associação criminosa.

O Caso Polonês: Andrzej Duda e Jarosław Kaczyński

Na Polônia, a eleição de Andrzej Duda em 2015 pelo partido Lei e Justiça (PiS) também gerou acusações de que seria um "poste" de Jarosław Kaczyński, líder do partido e figura central da política polonesa desde o início dos anos 2000.

Contudo, a comparação direta com o caso brasileiro não resiste a uma análise mais fina. Embora Kaczyński exerça, sim, enorme influência no cenário político polonês e seja o principal arquiteto das estratégias do PiS, Andrzej Duda demonstrou, em momentos críticos, capacidade de contrariar os interesses do partido e do próprio Kaczyński. Vetou reformas judiciais radicais, questionou medidas do partido e estabeleceu uma linha de autonomia institucional, ainda que limitada.

Ao contrário de Dilma, que jamais rompeu com Lula durante seu governo, Duda jamais foi um preposto nos termos jurídicos ou operacionais. A relação é de alinhamento político, típico em sistemas democráticos de partidos fortes, mas não de submissão operacional ou jurídica.

Portanto, a acusação de que Duda seria "poste" de Kaczyński revela mais uma simplificação de discurso político do que uma realidade dos fatos. O PiS, enquanto partido, tem uma lógica de comando centralizado, sim, mas não exerce domínio final do fato sobre o executivo polonês nos termos em que o lulopetismo exerceu sobre o governo Dilma.

Análise Comparativa: entre a política e o crime

A diferença fundamental entre os dois casos repousa na linha tênue que separa influência política legítima de domínio criminoso sobre a máquina estatal.

Aspecto Caso Dilma-Lula Caso Duda-Kaczyński
Natureza da relação Preposto, fâmulo, laranja Alinhamento político
Domínio final do fato Sim, Lula exercia controle real Não, Duda exerceu independência pontual
Configuração criminosa Tráfico de influência, corrupção, lavagem Nenhuma comprovada
Quebra de alinhamento Nunca ocorreu Ocorreu em vetos e decisões-chave

 Enquanto no Brasil a instrumentalização da presidência por Lula resultou em evidentes crimes contra a administração pública, na Polônia a influência de Kaczyński permanece no campo das disputas políticas legítimas, ainda que controversas.

Conclusão

O uso do termo "poste" na análise política requer cuidado e precisão. No caso brasileiro, Dilma Rousseff excede o conceito vulgar e se encaixa tecnicamente nas figuras de preposto, fâmulo e laranja, configurando inclusive responsabilidade penal indireta por atos de Lula, que exercia domínio final do fato sobre seu governo.

Na Polônia, Andrzej Duda, apesar de sua vinculação partidária e ideológica com Jarosław Kaczyński, mantém-se dentro dos marcos institucionais, preservando espaços de autonomia que jamais estiveram disponíveis para Dilma no Brasil.

Essa análise não apenas esclarece o debate político, mas também serve como advertência sobre como o populismo e o culto à personalidade podem transbordar os limites da política e invadir o território do crime, quando não são devidamente contidos pelos freios e contrapesos institucionais.

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