Introdução
No tabuleiro geopolítico da Eurásia, poucos países possuem um peso estratégico tão desproporcional ao seu tamanho quanto a Bielorrússia. Localizada no coração do continente, esse Estado se tornou um elo indispensável entre a produção industrial chinesa e os mercados consumidores da União Europeia. Dentro do contexto da Iniciativa do Cinturão e Rota (BRI), promovida por Pequim desde 2013, Minsk não é apenas uma escala logística: é o verdadeiro espaço vital da China no acesso terrestre ao Ocidente.
Centralidade Logística
Segundo dados recentes, cerca de 90% das mercadorias transportadas por trem da China para a Europa passam pela Bielorrússia, via Polônia. Esse corredor, articulado em torno da passagem Brest–Małaszewicze, movimentou em 2024 mais de US$ 29 bilhões em comércio.
O chamado Expresso Ferroviário China–Europa consolidou-se como projeto emblemático da BRI: mais rápido que o transporte marítimo e mais barato que o aéreo, ele permite que produtos chineses cheguem em poucas semanas a hubs como Varsóvia, Berlim e Duisburgo.
A Bielorrússia como "espaço vital"
Na tradição geopolítica, o termo espaço vital designa territórios indispensáveis à sobrevivência e expansão de um Estado. Aplicado à China, a Bielorrússia cumpre esse papel não por recursos naturais ou população, mas por ser o ponto de estrangulamento logístico da Nova Rota da Seda.
Enquanto rotas alternativas pelo Cáucaso, Ásia Central ou via marítima existem, nenhuma oferece a combinação de rapidez, custo reduzido e escala que o eixo bielorrusso-polaco proporciona. Nesse sentido, Minsk é para Pequim aquilo que o Canal de Suez representa para o comércio global: um gargalo estratégico.
Vulnerabilidade e Conflito Híbrido
O fechamento temporário da fronteira polaco-bielorrussa em setembro de 2025 mostrou os riscos dessa dependência. Milhares de containers chineses ficaram retidos na Bielorrússia, forçando o ministro das Relações Exteriores chinês a pressionar Varsóvia pela reabertura.
Esse episódio evidenciou como as ações híbridas da Rússia e da própria Bielorrússia contra a Polônia (migração instrumentalizada, exercícios militares provocativos, incursões de drones) podem transformar o espaço vital chinês em um calcanhar de Aquiles. Pequim se vê, assim, refém da instabilidade euroasiática.
A Polônia como parceiro crítico
Embora a Bielorrússia concentre o corredor ferroviário, é a Polônia que detém a chave de acesso à União Europeia. Varsóvia sabe disso e já deixou claro que pode usar a dependência chinesa como carta de pressão, exigindo de Pequim maior contenção sobre Moscou e Minsk. A Polônia não se limita a ser mera passagem logística, mas se afirma como ator geopolítico capaz de condicionar a Nova Rota da Seda.
Conclusão
A Bielorrússia é, para a China, um espaço vital dentro da Nova Rota da Seda. Sua geografia a coloca no centro do comércio ferroviário euroasiático, tornando-se indispensável para a estratégia de Pequim. Mas essa centralidade vem acompanhada de grande vulnerabilidade: a instabilidade política em Minsk, a hostilidade russa em relação à OTAN e a autonomia estratégica da Polônia podem transformar esse corredor em arma de pressão contra os interesses chineses.
Em última instância, o “espaço vital” da China na Bielorrússia não é apenas uma vantagem logística, mas também um risco permanente que obriga Pequim a navegar com pragmatismo entre Moscou, Minsk e Bruxelas.
Bibliografia
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