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sexta-feira, 17 de outubro de 2025

A ofensiva saudita no mundo dos videogames: Ubisoft, EA e SNK sob a mesma órbita de investimento

Introdução

Nos últimos anos, a Arábia Saudita tem dado passos ousados para se tornar um dos principais atores no mercado global de entretenimento digital. Através do Public Investment Fund (PIF) e de empresas ligadas à família real, o país vem adquirindo participações estratégicas em estúdios e editoras, como parte de um projeto maior de diversificação econômica — o Vision 2030. Ubisoft, Electronic Arts (EA) e SNK já estão sob a influência desse capital, ainda que em diferentes graus e formatos.

O caso Ubisoft

A Ubisoft, tradicional editora francesa conhecida por franquias como Assassin’s Creed e Far Cry, segue como empresa independente, controlada pela família Guillemot e por acionistas minoritários como a Tencent. 

Recentemente, porém, a Arábia Saudita ganhou destaque no universo da empresa com a produção da DLC gratuita “Valley of Memory”, de Assassin’s Creed Mirage, ambientada em AlUla, sítio histórico e vitrine turística do país. Esse conteúdo, financiado em grande parte por fundos sauditas, é visto como um gesto de “soft power cultural”, ao mesmo tempo em que gera polêmica dentro da Ubisoft — funcionários questionam se o apoio saudita não compromete a imagem da empresa.

O caso Electronic Arts

Em setembro de 2025, veio a notícia que sacudiu o setor: a EA será adquirida por um consórcio liderado pelo PIF, ao lado das firmas Silver Lake e Affinity Partners, por cerca de US$ 55 bilhões. A operação transformará a EA em uma empresa privada (take-private), tirando-a da Bolsa de Nova York. 

Defensores da transação argumentam que a companhia ficará menos refém da pressão de resultados trimestrais, podendo reorganizar sua estrutura e investir em inovação de longo prazo. Críticos, por outro lado, levantam preocupações geopolíticas e regulatórias, sobretudo nos EUA, onde senadores já pedem revisão minuciosa do negócio.

O caso SNK

O estúdio japonês SNK, conhecido por séries como King of Fighters e Metal Slug, foi um dos primeiros alvos diretos do capital saudita. Em 2020, a Electronic Gaming Development Company (EGDC), vinculada ao príncipe Mohammed bin Salman, adquiriu 33,3 % das ações da SNK, tornando-se o maior acionista da empresa. Esse movimento consolidou a entrada saudita em um estúdio com forte legado no mercado asiático.

Há uma “mesma empresa”?

Apesar de EA, SNK e Ubisoft estarem sob a órbita do mesmo capital investidor — em maior ou menor grau —, não se pode afirmar que elas sejam “a mesma empresa”.

  • EA caminha para se tornar controlada diretamente por um consórcio liderado pelo PIF.

  • SNK já tem participação majoritária saudita consolidada.

  • Ubisoft mantém independência estrutural, mas já abre espaço a colaborações culturais e de financiamento ligadas ao mesmo grupo.

O que existe, portanto, não é fusão ou integração corporativa, mas um ecossistema comum de investimentos: a Arábia Saudita se torna a “sócia oculta” de várias gigantes do setor, o que pode gerar alinhamentos estratégicos e influência indireta.

Implicações estratégicas

  1. Soft power e turismo: inserir AlUla em Assassin’s Creed Mirage é mais que conteúdo extra, é marketing nacional disfarçado de narrativa cultural.

  2. Reorganização de mercado: com a EA fora da bolsa, pode haver maior liberdade de inovação, mas também risco de concentração de poder em mãos de investidores geopolíticos.

  3. Imagem e reputação: enquanto os jogadores recebem conteúdo gratuito, internamente empresas como Ubisoft enfrentam dilemas éticos e reputacionais.

  4. Consolidação global: se outros estúdios forem comprados ou receberem aportes, veremos um bloco de entretenimento digital alinhado ao PIF, que poderia rivalizar com gigantes americanos e chineses.

Conclusão

A Arábia Saudita não está apenas “investindo em jogos” — está redefinindo o tabuleiro global da indústria de videogames. Ubisoft, EA e SNK não são uma única empresa, mas já compartilham um mesmo denominador comum: o capital saudita.

Se a estratégia será lembrada como uma “melhoria” ou como uma “captura” da indústria por interesses externos ainda é incerto. O que é certo é que, de agora em diante, a política do Oriente Médio e a economia global dos jogos caminharão cada vez mais juntas.

Bibliografia

  • The Verge. Electronic Arts to go private in $55 billion acquisition by Saudi PIF-led consortium. Set. 2025.

  • PC Gamer. A company owned by the Crown Prince of Saudi Arabia just became SNK’s largest shareholder. 2020.

  • Wikipedia. Ubisoft (estrutura acionária).

  • IGN / GamesRadar / Kotaku. Reportagens sobre Assassin’s Creed Mirage – Valley of Memory e as controvérsias ligadas a AlUla.

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