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segunda-feira, 5 de março de 2018

O dinheiro é um mineral e ele não se reproduz ou das razões pelas quais os povos da mesopotâmia condenavam a usura e não reprovavam a cobrança de juros

1) Se você estuda civilizações antigas como a Babilônia, a Suméria, a Assíria, então você descobrirá um fenómeno muito curioso. Tal como a Igreja Católica, essas civilizações condenavam a usura, mas permitiam uma espécie de cobrança de "juros" quando se tratava de empréstimo para o plantio e a criação de animais. Esses "juros" não eram recebidos em dinheiro, mas em produtos.

2) A lógica é simples: animais e vegetais se reproduzem, pois aumentam a riqueza. O dinheiro não, pois ele é um mineral; ele não se reproduz, pois sua quantidade continua sempre a mesma. Eis por que todas as grandes civilizações sempre condenaram a usura.

Roberto Santos 

(https://web.facebook.com/roberto.santos.3114/posts/10215912478268280?pnref=story)

Facebook, 5 de março de 2018.


Comentários adicionais:

Murilo Rezende Ferreira: Isso não tem o menor sentido. A idéia da não-reprodução do dinheiro em Aristóteles era principalmente ligada ao caráter pouco capitalista da economia da época, isto é, a maior parte dos empréstimos se voltava para agiotagem e a expropriação dos desesperados. Para aceitar o que vai acima é preciso negar todo o caráter do dinheiro como meio de pagamento indireto.

Roberto Santos:

1) Nessas civilizações que citei no post, o dinheiro era emitido pelo Templo, e era livre de débito. O Templo cobrava uma taxa ou juros pelo dinheiro emprestado, mas havia a instituição do Clean Slate, muito parecido com o sistema judaico do jubileu, que perdoava a dívida pública de 7 em 7 anos. E isso é um dado histórico.

2.1) A emissão de moeda pelo Templo estava estritamente regulada pelo que hoje chamaríamos de PIB. Com o tempo, a emissão da moeda foi usurpada pelos bullion brokers (metalistas), que passaram a lastrear a moeda em metais preciosos, e aí, sim, o fenômeno da usura começou.

Murilo Rezende Ferreira:

1) Não há tantas informações assim sobre a totalidade das instituições monetárias dessas civilizações, muito menos se tinham uma estatística semelhante à do PIB.

2) Como é que você vai rastrear as instituições da Suméria e da Babilônia com nossos parcos conhecimentos históricos? Há todo tipo de instituição monetária nessas sociedades e só temos fragmentos históricos. E que idéia é essa de usurpação feita pelos vendilhões de metal (bullion brokers), que passaram a lastrear a moeda em metais e a fazer da moeda uma commodity?

3) Os metais simplesmente eram a moeda - praticamente todas as grandes civilizações chegaram à moeda metálica.

4) Todas as grandes civilizações desenvolveram atividades bancárias e financeiras - o caráter daquilo que é chamado de usura não é sempre claro. Além disso, não faz sentido chamar de "juros" no mesmo sentido o dinheiro pago ao sistema de reserva fracionária e o dinheiro pago a um emprestador que realmente poupou recursos financeiros (que correspondem indiretamente a bens reais), embora sempre tenha havia uma discussão sobre a natureza da atividade financeira, se ela sempre se desenvolveu nas grandes civilizações da mesma forma como se deu nas cidades italianas, na época da Renascença.

Roberto Santos: Na verdade, a "moeda" nessas civilizações era como uma nota promissória, uma tábua de cerâmica que era emitida pelo Templo.

Murilo Rezende Ferreira:

1) Isso realmente existiu em alguns lugares, mas nunca foi o centro de nenhum sistema econômico de grande escala. Um sistema de contabilidade de escribas era necessariamente muito restrito.

2) É verdade que o princípio do empréstimo a juros na sociedade capitalista é o investimento produtivo, mas não se pode afirmar que o empréstimo a juros só possa ser feito através da troca direta de bens reais por bens reais, pois isso seria negar a própria natureza da moeda como instrumento de troca universal. Além disso, a escala econômica dessas civilizações era bem inferior à do Império Romano - e  mais ainda em relação à nossa época. Além disso, não é possível avaliar a dimensão quantitativa desse sistema de moeda e crédito por via de "book keeping".

Roberto Santos: Esse sistema "restrito" foi responsável pelo florescimento de uma civilização que produziu uma das sete maravilhas do mundo, sem contar que os atuais estudos arqueológicos demonstram que a sua sociedade era cultíssima, tendo praticamente todas as instituições que temos hoje em dia.

Murilo Rezende Ferreira Se entendi bem, o argumento vem da turma que defende que o problema da moeda fiduciária é a existência de emissores privados e que tudo seria solucionado com um sistema em que o Estado fornecesse crédito ou moeda de forma abundante. A estrutura social e econômica dessas cidades antigas tendia a privilegiar a agiotagem: o empréstimo a juros abusivos, só aceito por gente desesperada, com a finalidade do uso do sistema jurídico para a expropriação dos devedores.

Roberto Santos: Eu não estou argumentando nada. Estou apresentando um dado histórico corroborado por descobertas arqueológicas atuais. As implicações e a interpretação disso tudo ficam a cargo de cada um.

Murilo Rezende Ferreira: Bem, seria bom apresentar mais fontes e desenvolver mais os conceitos. É uma seara brutalmente complexa, onde não existem generalizações simples.

Murilo Rezende Ferreira: Este é um dos melhores livros sobre o assunto, junto com o do Jesus Huerta de Soto: https://mises.org/library/money-and-man

Murilo Rezende Ferreira: Ele narra essa questão do papel do endividamento junto do recrutamento militar na Roma Antiga. Sem dúvida o moderno sistema de reserva fracionária reproduz muitas características desse sistema socioeconômico antigo, mas os mecanismos são bem diferentes e até inversos.

Bibliografia:

Michael Hudson - Creating Economic Order: Record-keeping, Standardization, and the Development of Accounting in the Ancient Near East

Michael Hudson - The Lost Tradition of Biblical Debt Cancellations. 

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