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segunda-feira, 19 de março de 2018

Notas sobre pessoas perenes, o instituto do fideicomisso e o problema do comodismo inerente numa sociedade que vê a riqueza como um sinal de salvação

1) Se uma pessoa jurídica é uma pessoa perene, então seria mais provável que essa pessoa fosse acessória, seguindo a sorte de seu principal - no caso, a família que constituiu tal pessoa, de modo a transmitir direitos hereditários por meio do fideicomisso. Somente uma pessoa perene pode ser confiável a ponto de ser testemunha de várias transmissões de direitos de propriedade por meio da herança, ao longo do tempo. É a tradição em pessoa, pois contempla até mesmo pessoas não nascidas na época em que foi aberta uma eventual sucessão testamentária.

2.1) Roberto Santos bem apontou que pessoas perenes cometem pecados perenes.

2.2) Isso existe porque pessoas jurídicas são criadas com intuito de gerarem lucro, quando lidam com a questão de produzir riqueza de maneira organizada (empresas). Elas permanecem vivas numa sociedade onde a riqueza é vista como um sinal de salvação, dado que pessoas físicas diferentes assumem o comando da corporação, sem se levar em conta o critério da origem da família, mas tão-somente o mérito corporativo, que é um critério puramente humano. Assim, a obra deixa de seguir a sorte de seu criador, a ponto de que acabar seguindo caminhos sinuosos, nefastos, contrários à filosofia familiar que norteou à fundação da empresa.

2.3) Por força do critério da sucessão corporativa, fundada no mérito, maldito será o homem que confia no homem, a ponto de gerar uma sucessão desastrosa, fundada no amor de si até o desprezo de Deus, já que a riqueza se tornou um sinal de salvação. Dessa forma, o corpo institucional se liberta do corpo social mais básico, a família - o que confirma a natureza gnóstica dessas pessoas jurídicas, como se existissem por si mesmas tal como são as pessoas físicas - e isso é uma ilusão.

3.1) Ora, uma pessoa jurídica, embora tenha patrimônio, não pode agir por si mesma, pois uma pessoa física precisa dirigi-la.

3.2.1) Os atos nefastos que essa pessoa praticar seguem a sorte dos atos que a direção praticar - por isso, não pode ser qualquer pessoa que pode suceder tal instituição, pois atos nefastos podem ser praticados a ponto de irem até mesmo contra a finalidade pela qual a pessoa jurídica foi constituída, o que leva à desconsideração da pessoa jurídica, de modo a se apurar a responsabilidade civil e até mesmo criminal de seu diretor.

3.2.2) Tal como na República Romana, espera-se uma pessoa preparada, que tenha sido recrutada pela empresa ainda jovem e que tenha percorrido todo o caminho das honras corporativo de modo que possa bem comandá-la - e nem sempre esse novo comandante vem de alguém vindo da família.

3.3.1) As repúblicas corporativas sofrem do problema do comodismo, pois o filho do fundador da corporação nem sempre está preparado para assumir a sucessão da empresa, uma vez que não há nas corporações algo análogo à figura da coroa no Reino, onde funcionários regiamente pagos se encarregam de preparar o príncipe desde pequeno até chegar à maioridade pronto para governar a empresa.

3.3.2) Esse instituto análogo pode existir quando existe a figura do fideicomisso. Nela, uma pessoa jurídica ligada à família cuida dos direitos sucessórios até o momento em que o menor incapaz se torna apto a assumir a empresa do pai e continuar cuidando o negócio da família.

4.1) É pelo fideicomisso que as pessoas perenes tendem a ser moderadas, de modo que não cometam pecados perenes, que são pecados de pessoas físicas que se estendem no tempo e no espaço, produzindo danos extremos, devastadores.

4.2.1) Se os poderes de usar, gozar e dispor não fossem tão concentrados em poucas mãos, este instituto poderia ser democratizado, com o avanço do distributivismo.

4.2.2) Se os pais são como pequenos reis, então haveria pequenas coroas que cuidariam do patrimônio das empresas da família até o momento em que os herdeiros estivessem prontos para comandar as empresas e expandir o trabalho do antecessor.

4.2.3) Essas pequenas coroas serviriam de poder moderador, moderando os atos do novo patriarca da família de modo que o orgulho e a má consciência não destruam o patrimônio construído pela geração anterior, que existe para que se sirva a Deus e para que o país seja tomado como um lar em Cristo, o que prepara todo um povo para a pátria definitiva, a qual se dá no Céu.

José Octavio Dettmann

Rio de Janeiro, 19 de março de 2018.

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