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terça-feira, 2 de setembro de 2025

Os segredos do poder para quem não conhece

O conceito de poder é tão central para as ciências sociais quanto o de energia é para a física. Bertrand Russell já apontava essa analogia, lembrando que nada pode ser compreendido na física sem recorrer à noção de energia. Da mesma forma, nenhuma análise social ou política se sustenta sem encarar a realidade do poder.

Mas, afinal, o que é o poder?

Antes de tudo, é preciso compreendê-lo como a capacidade de realizar uma ação deliberada, voltada para um fim específico. Não se trata de qualquer movimento, mas de uma intervenção consciente, seja para mudar uma situação, seja para preservá-la. Assim, toda ação humana pressupõe algum grau de poder — e é daí que surge a necessidade de compreender seus meios e formas.

As três formas de poder

O poder não se exerce no vazio: ele depende de meios de ação. Esses meios podem ser classificados em três grandes tipos:

  1. Poder político-militar – É o mais imediato, baseado na força, na ameaça de morte ou de dano físico. Ele age diretamente sobre o corpo e a vida.

  2. Poder econômico-financeiro – Atua oferecendo ou negando vantagens materiais. Embora poderoso, depende do primeiro: dinheiro algum intimida por si só, mas pode contratar a força de quem intimida.

  3. Poder intelectual ou psíquico – É a origem remota de todos os demais, porque consiste na capacidade de convencer, persuadir e formar programas de ação. Sem essa base, nem a riqueza nem a força se sustentam.

Em termos de velocidade, o poder militar é imediato, o econômico requer negociação, e o intelectual opera no longo prazo, lançando as sementes que depois se transformam em riqueza e em força.

O poder dos meios

A análise política exige sempre a pergunta: quais meios de ação um agente possui? Ignorar essa questão leva a interpretações superficiais, baseadas em prestígio ou aparência de força.

A história política brasileira oferece exemplos claros. Enquanto especialistas previam a derrota do Partido dos Trabalhadores em determinada eleição, a vitória era inevitável porque apenas ele possuía militância organizada, capaz de influenciar diretamente a população nas fábricas, nas ruas, nas portas das casas. Os demais partidos, baseados apenas em prestígio passado ou em propaganda difusa, careciam de meios concretos de mobilização.

Militância não é eleitorado. O eleitor vota de maneira livre, muitas vezes por motivos dispersos e individuais. Já a militância é uma massa organizada, obediente a comandos, capaz de agir de forma coordenada. Nesse sentido, quem detém militância detém poder real.

Ilusões e Realidades do Poder

Muitos confundem prestígio, títulos ou riqueza com poder efetivo. Um ex-presidente pode ser lembrado, mas isso, isoladamente, não lhe dá capacidade de ação política. Um bilionário pode concentrar fortunas, mas sem redes de influência intelectual, sem militância ou sem acesso à força, sua capacidade de agir é limitada.

O verdadeiro segredo do poder está na articulação dos meios de ação. Ele nasce na inteligência, transforma-se em influência econômica e se impõe, quando necessário, pela força. Entender essa dinâmica é compreender como sociedades se organizam, como partidos vencem eleições e como indivíduos podem ou não deixar sua marca na história.

Conclusão: 

O poder não é um conceito abstrato ou meramente simbólico. Ele é sempre ação planejada, apoiada em meios concretos. Compreender os segredos do poder significa enxergar além das aparências, distinguir entre prestígio e capacidade de ação, e perceber que toda transformação política começa, inevitavelmente, no campo intelectual — lá onde se moldam as ideias que movem dinheiro, corpos e nações. 

Bibliografia

  • Russell, Bertrand. Power: A New Social Analysis. London: Allen & Unwin, 1938.
    (Obra clássica que compara o conceito de poder nas ciências sociais ao de energia na física.)

  • Mises, Ludwig von. Human Action: A Treatise on Economics. New Haven: Yale University Press, 1949.
    (Fundamenta a praxeologia, a filosofia da ação, base para compreender o poder como exercício deliberado.)

  • Foucault, Michel. Microfísica do Poder. Rio de Janeiro: Graal, 1979.
    (Apesar das críticas na transcrição, sua visão de poder como onipresente na vida social é uma referência incontornável.)

  • Weber, Max. Economia e Sociedade. Brasília: Editora UnB, 1999 [1922].
    (Define poder como a probabilidade de impor a própria vontade em uma relação social, mesmo contra resistências.)

  • Arendt, Hannah. Sobre a Violência. Rio de Janeiro: Relume-Dumará, 1994 [1970].
    (Distingue poder, força, autoridade e violência, ressaltando o caráter coletivo do poder político.)

  • Machiavelli, Niccolò. O Príncipe. São Paulo: Martins Fontes, 2001 [1532].
    (Clássico sobre a conquista e manutenção do poder político, ainda fundamental para análises contemporâneas.)

  • Pareto, Vilfredo. As Elites e a Sociedade. Rio de Janeiro: Zahar, 1984.
    (Explica como as elites se renovam e mantém o poder através de diferentes meios de ação.)

  • Olavo de Carvalho. O Imbecil Coletivo. Rio de Janeiro: Record, 1996.
    (Obra em que o autor – de quem a transcrição provavelmente é uma aula – discute o papel da intelectualidade na formação do poder cultural e político no Brasil.) 

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