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terça-feira, 9 de setembro de 2025

Saudade e a Verdadeira Transformação Social

A expressão “transformação social” tornou-se parte do vocabulário político moderno, sobretudo nos discursos de esquerda. Porém, muitas vezes trata-se de uma expressão vazia, incapaz de oferecer critérios de verdade. A promessa de ruptura com o passado costuma se reduzir a um slogan que legitima a conservação de conveniências momentâneas.

Contudo, existe uma forma autêntica de transformação: a que nasce da saudade. Quando entendida como presença transformada, a saudade não é apenas lamento, mas força de continuidade. Ela reconcilia o tempo, pois — como já afirmava Santo Agostinho — o passado não desaparece, mas permanece na memória, que o torna presente. Nesse sentido, a saudade é a tradição que permanece viva, a herança que não se perde, a raiz que nutre o presente.

Dessa forma, a saudade não paralisa: ela transforma ao restaurar. Nela, aquilo que foi perdido retorna, não como repetição, mas como renovação. Enquanto a ideologia busca romper com o passado, a saudade preserva o essencial, depura o acessório e reabre o futuro a partir da verdade que não pode ser esquecida.

Heidegger descreveu a verdade como aletheia, isto é, desvelamento. A saudade cumpre esse papel: traz à luz o que estava oculto pelo tempo ou pelo esquecimento. Assim, não é um sentimento passivo, mas um movimento ativo de conservação criadora, capaz de transformar a sociedade não pela ruptura, mas pela restauração do que lhe é mais essencial.

Em síntese:

  • A transformação ideológica rompe sem critério, conservando apenas conveniências.

  • A transformação pela saudade reconcilia tempo e memória, conserva o que é essencial e restaura o que foi perdido.

Portanto, a verdadeira transformação social não está no slogan político, mas na saudade que se faz tradição viva, no desvelamento que restitui a verdade, no movimento de restauração que preserva a dignidade da vida em comum.

Bibliografia comentada

Santo Agostinho de Hipona. Confissões.
Obra fundamental para compreender a relação entre tempo e memória. Santo Agostinho descreve o tempo como distensão da alma, onde passado, presente e futuro se encontram na consciência. A saudade, nesse horizonte, é a forma de tornar o passado presente.

Heidegger, Martin. Ser e Tempo.
Aqui se desenvolve a noção de verdade como aletheia (desvelamento). A saudade pode ser lida como uma experiência existencial de desvelar o ser do passado no presente, restaurando o vínculo entre tradição e futuro.

Ricoeur, Paul. A memória, a história, o esquecimento.
Ricoeur analisa como a memória funda a identidade pessoal e coletiva. Sua reflexão ajuda a entender a saudade como elemento de transformação social, não apenas afetivo, mas constitutivo do sentido histórico.

Halbwachs, Maurice. A memória coletiva.
Esse estudo mostra como a memória não é apenas individual, mas social. A saudade, nesse contexto, pode ser vista como força de coesão comunitária, sustentando tradições e restaurando vínculos de pertencimento.

Gusdorf, Georges. Mémoires et Personne.
Um estudo sobre como a memória molda a pessoa e a sociedade. Reforça a ideia de que a transformação genuína não ocorre pela ruptura ideológica, mas pela conservação criadora.

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