No português, a palavra vilão possui uma origem surpreendentemente literal: derivada do latim villanus, designava o habitante de uma vila, o camponês ou aldeão que vivia afastado dos centros urbanos e das cortes. Longe de qualquer conotação moral negativa, o vilão medieval era simplesmente alguém provinciano, limitado ao espaço e às preocupações de sua comunidade local. Somente com o tempo a palavra adquiriu o sentido de “malfeitor” na língua, uma mudança semântica fruto da literatura, do teatro e da cultura popular.
Essa etimologia fornece uma lente para compreender problemas contemporâneos na política brasileira. A classe política que se mantém provinciana, com uma visão restrita e limitada do país, cria as condições para a vilania institucional: decisões que preservam privilégios e narrativas convenientes, mesmo quando dissociadas da verdade ou do bem comum.
Olavo de Carvalho criticou de forma incisiva a natureza provinciana e inculta da elite brasileira, destacando que esta permanece confinada à própria “vila”, reproduzindo hábitos e valores que consolidam seu poder imediato, sem se projetar para o universal. Tal mentalidade limita a capacidade do país de agir de forma estratégica e alinhada à verdade, perpetuando uma vilania estrutural que não é apenas moral, mas também política e cultural.
No entanto, a história não permite que a vila permaneça isolada. Marshall McLuhan, em suas análises sobre comunicação, destacou o surgimento da aldeia global, na qual as fronteiras geográficas perdem importância diante da interconexão instantânea entre sociedades, economias e culturas. No Brasil, esse fenômeno se reflete na necessidade de líderes que transcendam a visão limitada da “vila” e compreendam a amplitude das relações globais.
Essa ideia também é explorada por Loryel Rocha em Manifesto sobre o Gran-Brasil: o Império dos impérios do mundo (IMUB, 2023), obra que analisa o potencial do Brasil no contexto mundial e denuncia a incapacidade da elite provinciana de acompanhar as dinâmicas globais. A obra reforça a urgência de superar práticas vilanescas, voltadas apenas à manutenção de interesses locais, e de abraçar uma mentalidade estratégica que permita ao país se tornar protagonista em escala global.
Portanto, compreender a origem do vilão e sua evolução semântica não é apenas um exercício etimológico: trata-se de diagnosticar a mentalidade provinciana que ainda impede o Brasil de atuar plenamente na aldeia global. A superação dessa vilania exige líderes e cidadãos capazes de agir com visão ampla, ancorados na verdade e na responsabilidade coletiva, e não apenas na conveniência imediata de sua “vila”.
Bibliografia
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Carvalho, Olavo de. O Jardim das Aflições: Mitos e Paradigmas. São Paulo: Vide Editorial, 1995.
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McLuhan, Marshall. Understanding Media: The Extensions of Man. New York: McGraw-Hill, 1964.
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Rocha, Loryel. Manifesto sobre o Gran-Brasil: o Império dos impérios do mundo. Rio de Janeiro: IMUB, 2023.
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Houaiss, Antônio. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Editora Objetiva, 2001.
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