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terça-feira, 2 de setembro de 2025

A banalização do divino: de “Lua de Cristal” à política contemporânea

Em 1990, a música “Lua de Cristal”, interpretada por Xuxa, tornou-se um fenômeno cultural no Brasil. O refrão “Tudo que eu quiser, o cara lá de cima vai me dar” parecia inofensivo, voltado para o universo infantil, mas revela algo mais profundo: a redução da divindade ao nível do mundano. Ao se referir a Deus como “o cara lá de cima”, a música transforma o Todo-Poderoso em um prestador de serviços pessoal, submetido à vontade de cada indivíduo.

Essa representação não é apenas coloquialidade ou irreverência juvenil. É, em termos teológicos, uma forma de blasfêmia — não no sentido de insulto explícito, mas como uma distorção do respeito devido à majestade divina. Reduzir Deus à dimensão do cotidiano e da conveniência humana é uma maneira de domesticar o sagrado, transformando-o em instrumento de desejo pessoal.

O fenômeno atravessa a cultura e chega à política. Décadas antes de “Lua de Cristal” ser regravada em memórias afetivas, líderes públicos, como Lula, adotaram um registro semelhante. Ao chamar Deus de “cara”, não há exaltação, mas um rebaixamento da divindade, aproximando-o do nível humano e fazendo dele um quase-subordinado das vontades políticas e pessoais. A situação lembra, em termos simbólicos, o gesto de Obama ao lidar com líderes estrangeiros: uma dinâmica de proximidade que, quando aplicada a Deus, se transforma em desrespeito ritualizado, pois subverte a hierarquia natural entre Criador e criatura.

O problema não é meramente semântico. Trata-se de uma inversão moral e espiritual: quando Deus é domesticado, Ele deixa de ser referência ética e transcendente e se torna mero executor das conveniências humanas. A tradição cristã alerta que esse tipo de atitude é blasfema, porque corrompe a noção de santidade e transforma o Sagrado em uma ferramenta do mundano.

Mais do que uma crítica à música ou a gestos políticos isolados, o fenômeno revela algo sobre a cultura contemporânea: há uma tendência crescente de instrumentalizar o divino. Deus é reduzido a um facilitador, a um “fornecedor” de bênçãos, em vez de ser reconhecido como Soberano e Juiz Supremo. Essa inversão não é neutra; ela modela a percepção coletiva sobre o sagrado e enfraquece a consciência moral.

Portanto, a banalização de Deus na música, na mídia ou na política não é apenas irreverência. É um sintoma de blasfêmia moderna, que exige reflexão crítica. Chamar Deus de “cara” ou tratá-lo como prestador de desejos pessoais não é inofensivo: é um deslocamento espiritual que desafia a ordem ética e hierárquica estabelecida desde os tempos bíblicos. A preservação do respeito e da reverência à divindade é, assim, não apenas uma questão de fé, mas de ordem moral e cultural.

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