José Ortega y Gasset tornou célebre a frase: “Eu sou eu e minha circunstância, e se não a salvo, não salvo a mim mesmo.” Para o filósofo espanhol, o homem não existe em abstrato, mas sempre situado em um tempo, em um espaço e em uma condição concreta. O destino humano consiste, portanto, em assimilar e transformar a própria circunstância, integrando-a à vida.
Se transpusermos essa reflexão ao horizonte da nacionidade, o Brasil — herdeiro espiritual de Ourique pela sua formação lusitana — não pode ser compreendido sem a missão de servir a Cristo em terras distantes. Nossa circunstância, portanto, é dupla: não apenas o espaço geográfico em que nascemos, mas também os espaços que, pela fé e pela história, nos são dados como extensão da pátria.
É nesse ponto que surge a arte da instalação. Diferente de um turismo superficial e fugidio, a instalação é o processo de reassimilação das circunstâncias, pelo qual um estrangeiro se torna filho adotivo da terra em que escolheu viver, sem abandonar sua pátria de origem, mas unindo ambas em um mesmo lar em Cristo, por Cristo e para Cristo.
Essa reassimilação não é mera adaptação, mas integração espiritual. O indivíduo não se limita a habitar uma nova terra: ele a incorpora em sua identidade, tal como Portugal, ao nascer em Ourique, incorporou a si a missão universal do cristianismo. Assim, a instalação torna-se o modo contemporâneo de viver a vocação de Ourique, agora não apenas como conquista militar, mas como conquista cultural e espiritual, pela qual duas pátrias se fundem numa só fidelidade.
Portanto, se Ortega via na circunstância o limite e a possibilidade do homem, a nacionidade amplia esse horizonte: não somos apenas “eu e minha circunstância”, mas nós e nossas circunstâncias. E, quando vividas em Cristo, tais circunstâncias deixam de ser barreiras para se tornarem pontes, caminhos que nos permitem ter mais de uma pátria sem perder a unidade interior.
📚 Referências
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ORTEGA Y GASSET, José. Meditaciones del Quijote.
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ORTEGA Y GASSET, José. La rebelión de las masas.
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MATTOSO, José. D. Afonso Henriques.
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AQUINO, Santo Tomás de. Suma Teológica, II-II, q. 105.
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ANDERSON, Benedict. Comunidades Imaginadas.
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