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terça-feira, 9 de dezembro de 2025

A nacionalidade brasileira por opção: natureza, fundamento constitucional e consequências jurídicas

A nacionalidade é um dos pilares da personalidade jurídica no plano internacional. Ela define o vínculo político-jurídico entre o indivíduo e o Estado, permitindo a participação na comunidade política e a fruição de direitos fundamentais. No caso brasileiro, a Constituição Federal distingue com precisão brasileiros natos e brasileiros naturalizados, atribuindo à primeira categoria prerrogativas específicas. Entre os brasileiros natos, figura um grupo cuja inserção sempre despertou debates doutrinários: os nascidos no exterior, filhos de pai ou mãe brasileiros, que venham a residir no país antes da maioridade e optem, em qualquer tempo, pela nacionalidade brasileira.

Este instituto, conhecido como nacionalidade por opção, revela muito sobre a concepção constitucional brasileira de pertencimento e de continuidade da comunidade política. Longe de ser um artifício derivado de naturalização, ele integra os indivíduos desde a origem como membros da comunidade nacional. A seguir, analisamos seu fundamento constitucional, suas implicações e sua relação com a teoria geral da nacionalidade.

1. Fundamento Constitucional

O dispositivo-chave é o art. 12, I, “c”, da Constituição Federal, que estabelece:

São brasileiros natos:
c) os nascidos no estrangeiro de pai brasileiro ou mãe brasileira, desde que venham a residir na República Federativa do Brasil e optem, em qualquer tempo, pela nacionalidade brasileira.

A redação evidencia duas características essenciais:

  1. A filiação a brasileiro (jus sanguinis).

  2. A residência no Brasil antes da maioridade, indicando integração à comunidade política.

  3. A necessidade de opção formal, realizada a qualquer tempo.

Duas observações são necessárias:

  • O texto constitucional não utiliza o termo naturalização, mas sim opção.

  • A condição de nato está expressamente afirmada, o que elimina qualquer possibilidade interpretativa de equiparação ao naturalizado.

A Constituição, portanto, não cria uma nacionalidade derivada, mas apenas exige um ato confirmatório para ativar uma nacionalidade originária.

2. A natureza jurídica da opção

A opção não cria a nacionalidade — ela a reconhece.

Trata-se de um ato declaratório, e não constitutivo. O fundamento da nacionalidade do optante é a filiação (pelo sangue) e sua integração material ao Estado brasileiro mediante residência. A manifestação de vontade serve apenas como meio formal de confirmação desse vínculo.

Essa interpretação é dominante na doutrina constitucional e foi reforçada pela Emenda Constitucional 54/2007, que ampliou a proteção aos nascidos no exterior, tornando mais claro o caráter originário da nacionalidade.

3. O procedimento da opção

Após a Lei 13.445/2017 (Lei de Migração), o procedimento passou a ser mais simples e administrativo. A opção pode ocorrer:

  • No cartório de registro civil (para menores ou maiores), ou

  • Direto perante autoridade competente (se o registro originário não existia).

Para maiores de idade, a opção é feita pessoalmente; para menores, pelos responsáveis.

O ato é inscrito no registro civil brasileiro e produz efeitos imediatos.

4. Consequências Jurídicas da nacionalidade por opção

Porque o optante é classificado constitucionalmente como brasileiro nato, ele possui direitos privativos dessa categoria, entre eles:

4.1. Inafastabilidade da nacionalidade

O optante não pode ser extraditado, exceto em hipóteses excepcionalíssimas previstas em tratados de reciprocidade — e mesmo assim com enorme controvérsia jurídica.

4.2. Acesso a cargos privativos de natos

Ele pode exercer:

  • Presidência e Vice-Presidência da República

  • Presidência da Câmara dos Deputados

  • Presidência do Senado Federal

  • Ministro do STF

  • Carreira diplomática

  • Oficial das Forças Armadas

  • Ministro da Defesa

A nationalidade por opção não gera qualquer restrição.

4.3. Igualdade plena

O optante é tratado em igualdade total com qualquer brasileiro nato nascido em território nacional.

5. A questão histórica e a superação de controvérsias antigas

Antes de 2007, havia insegurança jurídica sobre duas situações:

  1. O registro diretamente no exterior, sem comparecer ao Brasil.

  2. A perda da nacionalidade se o indivíduo não viesse ao Brasil antes da maioridade.

A Emenda Constitucional 54/2007 resolveu ambos os problemas, reforçando:

  • O caráter originário da nacionalidade;

  • A possibilidade de opção “em qualquer tempo”;

  • A regularização posterior por simples registro ou manifestação de vontade.

Desde então, tanto a jurisprudência quanto a doutrina convergem: trata-se de nacionalidade originária, e não de naturalização.

6. Consequências políticas e filosóficas

A nacionalidade por opção expressa uma visão de continuidade familiar e cultural, típica do constitucionalismo brasileiro:

  • reconhece a centralidade da família como transmissora de identidade nacional;

  • preserva vínculos comunitários apesar da migração;

  • evita a fragmentação político-jurídica de famílias brasileiras que se deslocam ao exterior.

A exigência de residência e opção apenas garante que o indivíduo, de fato, se integre à sociedade brasileira, exercendo sua cidadania de forma consciente.

Conclusão

A nacionalidade por opção — conferida aos filhos de brasileiros nascidos no exterior e que venham ao Brasil antes da maioridade — não é uma forma derivada de aquisição de cidadania, mas sim o reconhecimento de uma nacionalidade originária, que coloca o indivíduo no rol dos brasileiros natos, com todas as prerrogativas associadas.

A Constituição de 1988 consolidou essa posição, e a evolução normativa subsequente pacificou qualquer dúvida remanescente.

Assim, do ponto de vista jurídico e constitucional, o optante não é naturalizado: é brasileiro nato em sentido pleno, com todos os direitos, proteções e qualificações próprias dos membros originários da comunidade política brasileira.

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