Introdução
O Estreito de Ormuz constitui uma das rotas marítimas mais estratégicas do mundo contemporâneo. Localizado entre o Golfo Pérsico e o Golfo de Omã, essa passagem estreita tem pouco mais de 30 quilômetros de largura e é responsável por uma parcela significativa do comércio global de petróleo. Sua importância estratégica e econômica atrai a atenção constante de grandes potências, como os Estados Unidos, a China e a Rússia, além dos países do Oriente Médio.
A importância geopolítica do estreito
O Estreito de Ormuz é uma via vital para o escoamento do petróleo extraído nas monarquias do Golfo, como Arábia Saudita, Kuwait, Emirados Árabes Unidos, Bahrein e Qatar. Aproximadamente 20% do petróleo mundial passa por esse estreito, o que representa cerca de um quinto da produção global¹. Essa dependência torna o local um verdadeiro "gargalo" para a economia internacional.
Além disso, o estreito é uma via crítica para o fornecimento de gás natural, principalmente do Qatar, o maior exportador mundial de gás natural liquefeito (GNL)². O controle ou bloqueio dessa passagem teria impactos diretos sobre os preços globais de energia, com consequências econômicas de grande escala, especialmente em momentos de conflito no Oriente Médio.
A conjuntura regional e os interesses das potências
O Irã, localizado na margem norte do estreito, desempenha papel central nessa equação. O país frequentemente ameaça fechar o Estreito de Ormuz como forma de retaliação a sanções internacionais ou a ações militares adversárias, especialmente dos Estados Unidos³. Essa ameaça é levada a sério por Washington, que mantém bases militares na região e patrulhas navais constantes com o objetivo de garantir a liberdade de navegação.
O temor de um eventual conflito entre Irã e seus adversários geopolíticos, sobretudo Arábia Saudita, Israel e Estados Unidos, torna o estreito uma zona de constante tensão. Os EUA consideram qualquer bloqueio ao Estreito de Ormuz como uma "linha vermelha" — uma violação grave da ordem internacional, que justificaria ações militares imediatas⁴.
As potências emergentes e a disputa pelo controle marítimo
A China, que depende crescentemente das importações de petróleo do Oriente Médio, tem manifestado preocupação com a segurança dessa rota. Investimentos chineses em infraestrutura portuária, corredores energéticos e acordos estratégicos com países do Golfo revelam a tentativa de Pequim de garantir acesso estável aos recursos energéticos⁵. A Rússia, por sua vez, embora não dependa diretamente do Estreito de Ormuz, vê na instabilidade regional uma oportunidade para ampliar sua influência no Oriente Médio, principalmente por meio da cooperação com o Irã e a Síria.
Histórico e Direito Internacional do Estreito de Ormuz
Historicamente, o Estreito de Ormuz foi controlado por diferentes impérios — persas, árabes, otomanos e, por um período, europeus (notadamente portugueses e britânicos). Desde o século XVI, a navegação pelo estreito teve valor estratégico para a dominação dos mares e o controle do comércio entre Europa e Ásia.
Do ponto de vista jurídico, o Estreito de Ormuz é regido por princípios do Direito Internacional Marítimo, em especial pela Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar (CNUDM), assinada em Montego Bay em 1982. O artigo 38 da convenção garante o direito de passagem de trânsito por estreitos utilizados para a navegação internacional⁶. No entanto, o Irã não é signatário da CNUDM e argumenta que apenas o direito de passagem inocente se aplica ao estreito — uma distinção que implica restrições, especialmente no caso de navios militares.
Essa ambiguidade jurídica serve como instrumento de pressão por parte do Irã, que, apesar de não impedir rotineiramente o tráfego, mantém o poder de ameaçar sua interrupção como instrumento de barganha.
Conclusão
O Estreito de Ormuz é mais do que uma simples passagem marítima: é um ponto nevrálgico da geopolítica mundial. Controlá-lo — ou mantê-lo aberto — significa garantir a fluidez do comércio global de petróleo e, portanto, a estabilidade da economia mundial. Em tempos de tensão internacional, como os que vivemos, o estreito assume uma centralidade estratégica incontornável. A vigilância permanente das potências sobre a região revela que, enquanto o mundo depender de petróleo e gás natural, Ormuz continuará sendo um dos epicentros da geopolítica global.
Notas de Rodapé
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U.S. Energy Information Administration (EIA). World Oil Transit Chokepoints. Washington, D.C.: EIA, 2023. Disponível em: https://www.eia.gov.
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International Energy Agency (IEA). Gas 2023: Analysis and Forecast to 2026. Paris: IEA, 2023.
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BBC News. Iran threatens to close Strait of Hormuz amid tensions with US. BBC, 4 jan. 2020.
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CHOMSKY, Noam. Who Rules the World? New York: Metropolitan Books, 2016. Cap. 8: "The Persian Gulf and Strategic Oil".
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ROLLAND, Nadège. China’s Eurasian Century? Political and Strategic Implications of the Belt and Road Initiative. Washington, D.C.: National Bureau of Asian Research, 2017.
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UNITED NATIONS. United Nations Convention on the Law of the Sea (UNCLOS). Montego Bay, 10 December 1982. Art. 38.
Referências Bibliográficas
BBC NEWS. Iran threatens to close Strait of Hormuz amid tensions with US. BBC News, 4 jan. 2020. Disponível em: https://www.bbc.com/news/world-middle-east-50979463. Acesso em: 2 ago. 2025.
CHOMSKY, Noam. Who Rules the World? New York: Metropolitan Books, 2016.
INTERNATIONAL ENERGY AGENCY. Gas 2023: Analysis and Forecast to 2026. Paris: IEA, 2023. Disponível em: https://www.iea.org/reports/gas-2023. Acesso em: 2 ago. 2025.
ROLLAND, Nadège. China’s Eurasian Century? Political and Strategic Implications of the Belt and Road Initiative. Washington, D.C.: National Bureau of Asian Research, 2017.
UNITED NATIONS. United Nations Convention on the Law of the Sea. Montego Bay, 10 dez. 1982. Disponível em: https://www.un.org/depts/los/convention_agreements/texts/unclos/unclos_e.pdf. Acesso em: 2 ago. 2025.
U.S. ENERGY INFORMATION ADMINISTRATION. World Oil Transit Chokepoints. Washington, D.C.: EIA, 2023. Disponível em: https://www.eia.gov/international/analysis/special-topics/World_Oil_Transit_Chokepoints. Acesso em: 2 ago. 2025.
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