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terça-feira, 26 de agosto de 2025

A República Brasileira: entre o formalismo constitucional e a realidade sociopolítica

Introdução

A historiografia tradicional brasileira frequentemente classifica a República em ciclos baseados nas sucessivas constituições promulgadas desde 1889. Contudo, essa abordagem formalista e positivista tende a obscurecer as dinâmicas sociopolíticas e econômicas que efetivamente moldaram a estrutura do Estado brasileiro. Uma análise mais profunda revela que a história republicana do Brasil é caracterizada por um interregno político iniciado em 15 de novembro de 1889, que representa não apenas a substituição de uma forma de governo, mas a negação da continuidade dinástica do Império e a construção de uma nova ordem política.

O formalismo constitucional e suas limitações

A classificação das repúblicas brasileiras com base no número de constituições promulgadas reflete uma visão institucionalista e positivista da história. Essa perspectiva, embora útil para fins de organização jurídica, não captura as complexas transformações sociais e políticas que ocorreram no país. As constituições, muitas vezes, permaneceram como documentos formais, sem refletir efetivamente as relações de poder e as estruturas sociais vigentes.

A perspectiva sociológica: a análise de Ferdinand Lassalle

Ferdinand Lassalle, em sua obra "A Essência da Constituição" (1862), propôs uma abordagem sociológica para compreender a constituição de um Estado. Para Lassalle, a verdadeira constituição de um país não reside apenas em seus textos legais, mas nas relações de poder efetivas que determinam a organização política e social. Essa perspectiva permite uma análise mais realista da história republicana brasileira, focando nas estruturas de poder e nas dinâmicas sociais que influenciaram a formação do Estado republicano. JusBrasil+3seer.ufrgs.br+3JusBrasil+3

O interregno de 1889: ruptura e construção de uma nova ordem

O evento de 15 de novembro de 1889, que resultou na Proclamação da República, não deve ser entendido apenas como uma mudança de regime, mas como uma ruptura com a continuidade dinástica do Império. A ascensão de Isabel II como imperatriz foi negada, e com ela, a possibilidade de continuidade monárquica. Esse interregno político criou um vácuo de poder e uma incerteza institucional que perduraram por décadas, caracterizando a história republicana brasileira como um processo de construção e reconstrução de sua identidade política.

A República como continuidade interrompida

A história republicana brasileira pode ser interpretada como uma continuidade interrompida, na qual o interregno de 1889 representou uma negação da ordem anterior e a busca por uma nova legitimidade política. Essa interpretação permite compreender os ciclos republicanos não apenas como sucessões de constituições, mas como períodos de transformação e adaptação às novas realidades sociais e políticas.

Conclusão

Uma análise crítica da história republicana brasileira, à luz das contribuições de Ferdinand Lassalle e de uma perspectiva sociológica, revela que a verdadeira constituição do país está nas relações de poder e nas estruturas sociais que moldam a política. A classificação das repúblicas brasileiras deve, portanto, considerar não apenas os textos constitucionais, mas também as dinâmicas sociopolíticas que efetivamente determinaram a organização do Estado. Essa abordagem proporciona uma compreensão mais profunda e realista da evolução política do Brasil.

Bibliografia

  • Carvalho, José Murilo de. Cidadania no Brasil: O longo caminho. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001.

  • Fausto, Boris. História do Brasil. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2019.

  • Lassalle, Ferdinand. A Essência da Constituição. Leipzig: 1862.

  • Schwarcz, Lilia Moritz; Starling, Heloisa Murgel. Brasil: Uma Biografia. São Paulo: Companhia das Letras, 2015.

  • Vianna, Oliveira. História do Brasil: Formação e desenvolvimento. Rio de Janeiro: José Olympio, 1987.

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