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terça-feira, 26 de agosto de 2025

O mau servo e a falsa elite econômica brasileira

A parábola dos talentos (Mt 25,14-30) nos oferece um símbolo poderoso para compreender a crise de liderança econômica que marca a história recente do Brasil. Nela, o Senhor confia talentos a seus servos e espera que eles os multipliquem. Dois servos correspondem, fazem frutificar o que receberam e são recompensados. Mas um deles, tomado pelo medo e pelo egoísmo, enterra o talento e nada produz. O castigo recai severamente sobre ele, pois desperdiçou a oportunidade de transformar o dom recebido em benefício maior¹.

Ao observarmos o agronegócio e a elite financeira da Faria Lima, percebemos uma semelhança inquietante com esse mau servo. Essas classes receberam muito: terras férteis, abundância de recursos naturais, proteção estatal, crédito subsidiado, infraestrutura financiada pelo erário, além da tutela militar durante décadas². Receberam o talento único de que depende a vida da nação. Mas, em vez de multiplicarem-no para o bem comum, preferiram enterrá-lo no solo estéril do egoísmo.

O resultado é a formação de uma classe ociosa, no sentido em que já denunciava Thorstein Veblen em The Theory of the Leisure Class³: uma elite que consome, ostenta e acumula, mas não lidera o processo de inovação, industrialização e emancipação nacional. Ao contrário, mantém o país refém de exportações primárias e do rentismo financeiro, indiferente ao desenvolvimento humano e à soberania política⁴.

Esse comportamento gera um alto custo de oportunidade histórico. Enquanto outras nações, em igual ou menor condição, aproveitaram seus talentos para criar indústrias, tecnologia e bem-estar social, o Brasil viu sua chance ser desperdiçada. O tempo perdido não retorna, e a consequência é que o povo brasileiro enfrenta não apenas a ameaça de uma esquerda ideologizada, mas também a traição de uma falsa elite econômica⁵.

No plano espiritual, o problema é ainda mais grave. O mau servo não falha apenas diante de seu Senhor, mas diante do próprio Deus. Multiplicar os talentos significa reconhecer que toda riqueza, seja material ou intelectual, tem um destino que ultrapassa o indivíduo: deve servir ao próximo, edificar a comunidade e glorificar o Criador⁶. Quando a elite econômica coloca o amor de si acima de tudo — desprezando a Deus, a pátria e o bem comum —, ela se condena ao mesmo castigo da parábola: ser expulsa das trevas da indolência para o ranger de dentes da irrelevância.

Portanto, a crise brasileira não é apenas política ou econômica: é também moral e espiritual. Enquanto não houver uma elite que compreenda sua missão como multiplicadora dos talentos recebidos — não apenas para si, mas para o povo e para Deus —, o Brasil continuará prisioneiro de uma classe dirigente que age como o mau servo. E, como diz o Evangelho, “ao servo inútil lançai-o nas trevas exteriores; ali haverá choro e ranger de dentes”¹.

Notas de Rodapé

  1. Mt 25,14-30. Bíblia Sagrada. Tradução da CNBB.

  2. Furtado, Celso. Formação Econômica do Brasil. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 2007.

  3. Veblen, Thorstein. The Theory of the Leisure Class. New York: Macmillan, 1899.

  4. Prado Jr., Caio. Formação do Brasil Contemporâneo. São Paulo: Companhia das Letras, 2011.

  5. Bresser-Pereira, Luiz Carlos. A Construção Política do Brasil: Sociedade, Economia e Estado desde a Independência. São Paulo: Editora 34, 2014.

  6. Leão XIII. Rerum Novarum (1891).

Bibliografia

  • Bíblia Sagrada. Tradução da CNBB.

  • Bresser-Pereira, Luiz Carlos. A Construção Política do Brasil: Sociedade, Economia e Estado desde a Independência. São Paulo: Editora 34, 2014.

  • Furtado, Celso. Formação Econômica do Brasil. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 2007.

  • Leão XIII. Rerum Novarum. Vaticano, 1891.

  • Prado Jr., Caio. Formação do Brasil Contemporâneo. São Paulo: Companhia das Letras, 2011.

  • Veblen, Thorstein. The Theory of the Leisure Class. New York: Macmillan, 1899.

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