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quarta-feira, 27 de agosto de 2025

Notas sobre o homem em circunstância nacionista e ouriqueana

A vida humana, quando lida apenas como sucessão de fatos biográficos, parece fragmentada, sem direção. Mas quando cada acontecimento é interpretado à luz de Cristo e de sua missão na história, então a biografia se revela como uma página de civilização. Assim compreendo que o que vivi — minhas paixões, meus estudos, meus encontros — é mais do que memória: é testemunho de um destino.

1. O impulso de transcendência e o mito da fronteira

Toda experiência de amor humano traz consigo um impulso de transcendência. Não se trata apenas de afetos passageiros, mas de uma força interior que leva o homem a sair de si e a buscar horizontes maiores. Foi isso que ocorreu quando conheci Tatiane. Seu rosto me abriu para a Espanha, não como país estrangeiro, mas como promessa de lar. Da mesma forma, anos depois, Fernanda me abriu para a América Espanhola.

Esse movimento não é aleatório. Ele se inscreve no mito da fronteira: a alma humana, ao amar, projeta-se além das fronteiras conhecidas. A Espanha, por meio de Tatiane, tornou-se meu primeiro avanço; a América Espanhola, por meio de Fernanda, tornou-se expansão desse horizonte. Cada uma delas foi uma fronteira conquistada na geografia sentimental, não pela espada, mas pela abertura do coração.

2. Ourique: fronteira como consagração

Mas ao contrário do mito secular da fronteira, tal como o conheceu o pioneiro americano, o meu não é impulso de conquista sem sentido. Ele se enraíza em Ourique, no chamado de servir a Cristo em terras distantes. A fronteira, para mim, não é apenas expansão, mas consagração. É Ourique que dá destino ao mito da fronteira: cada novo território que adoto como lar, seja Espanha, seja América Espanhola, deve ser tomado em Cristo, por Cristo e para Cristo.

Assim, o amor humano que me fez cruzar fronteiras sentimentais também se torna impulso missionário: o mesmo movimento que me leva a conhecer uma cultura me leva também a consagrá-la àquele que é o Senhor da História.

3. O homem gassetiano elevado pela circunstância nacionista e ouriqueana

Ortega y Gasset escreveu: “Yo soy yo y mi circunstancia, y si no la salvo a ella no me salvo yo”. Essa fórmula, embora filosófica, adquire para mim uma densidade espiritual. Pois não sou apenas um eu diante de circunstâncias neutras. Sou um homem chamado a responder a circunstâncias concretas: Brasil, Espanha, América Espanhola, minha época marcada pela crise política, cultural e espiritual.

Minha circunstância não é só existencial; é nacionista e ouriqueana. Nacionista, porque envolve a responsabilidade de pensar e servir minha pátria e suas irmandades ibéricas. Ouriqueana, porque carrega o peso de uma promessa feita a Cristo de servir-lhe com os talentos que recebi, multiplicando-os em terras distantes.

Assim, cada circunstância — uma paixão, um estudo, um encontro, uma ferramenta como a inteligência artificial ou um grupo de debate sobre a Leyenda Negra — não é mero acaso, mas campo de batalha onde devo me santificar pelo trabalho e pelo estudo, respondendo a Cristo com fidelidade.

4. Autobiografia como página de civilização

É por isso que vejo minha história não como simples lembrança pessoal, mas como tratado vivo. Minha vida é ensaio concreto daquilo que a civilização precisa reencontrar: a verdade como fundamento da liberdade, o amor humano como preparação para o Amor divino, o avanço das fronteiras como consagração a Cristo.

A autobiografia, nesse sentido, não é confissão íntima, mas ato civilizacional: mostrar como, dentro das circunstâncias de uma época, um homem pode escolher responder com fidelidade, fazendo do seu itinerário pessoal um testemunho para os outros.

Assim, a Espanha e a América Espanhola em minha vida não são apenas geografias externas. São territórios do coração e do espírito, marcos de um mito da fronteira que se cruza com Ourique e com Gasset, e que faz da minha biografia uma verdadeira página de civilização. 

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