Há um ano atrás, o professor Olavo de Carvalho falou isto:
"Se O Donald Trump for eleito, ele e o Putin têm todas as condições para restaurar a bipolaridade que assegurou a paz desde 1945, É o melhor que pode acontecer no mundo". (Facebook, 05/12/2015)
Este argumento, o do mundo bipolar, foi contestado pelo colega Thomas Dreschh.
1) Ele disse que a bipolaridade não assegurou a paz. Na verdade, isso criou uma verdadeira paz armada, cujo equilíbrio foi precariamente garantido por dois agentes de ideologias antagônicas, como os EUA e a União Soviética. Nesse cenário, o mundo estava em risco de uma guerra quente - e houve momentos em que essa guerra foi realmente quente, como na Guerra da Coréia e na Guerra do Vietnã.
2) O que assegura o equilíbrio das forças é o mundo multipolar, aquele mesmo sistema de equilíbrio que foi criado por força da Guerra dos 30 anos, por força da Paz de Westphalen. Esse equilíbrio foi dinamitado na Primeira Guerra Mundial, principalmente com a queda das monarquias em repúblicas. A maior prova de que o mundo multipolar está mesmo renascendo é que as repúblicas estão caindo em descrédito e, aos poucos, as monarquias estão voltando. A Romênia e Bulgária estão à beira de restaurar suas monarquias. A Rússia está considerando seriamente restaurar o regime dos czares. Portugal e Brasil estão com seus movimentos monárquicos em franco crescimento.
3.1) No caso da Alemanha, o país está se libertando da dependência do petróleo - e esse processo se completará a partir de 2035, quando se passarão 60 anos da Revolução Verde, que surgiu na Alemanha nos anos 70, completando o ciclo de Kondratiov, que é o espaço de duas gerações. Some-se a isso o fato de que a Alemanha tem um superávit comercial de 250 bilhões de Euros, sobretudo por conta dos fortes investimentos que este país vem fazendo no estrangeiro, sobretudo na China. Contudo, segundo meu colega, este investimento na China não é a causa que leva ao descompasso da Rússia, com relação ao esquema russo-chinês. O que faz com que a Rússia perca influência se deve à sua própria incompetência e a seu gasto militar exagerado. Além disso, o país tem ficado cada vez mais dependente da exportação de hidrocarbonetos, se comparado à economia alemã, que é diversificada e complexa. Talvez a Rússia queira compensar esse descompasso provocando uma guerra, mas perderá esta guerra para as forças da OTAN, principalmente para o poderio do parque industrial alemão, que é invejável, se comparado ao Russo, que está sucateado e desatualizado, por conta dos muitos anos de comunismo. Além disso, a Alemanha não está interessada numa guerra - até porque um país forte não procura guerra, como diz o colega Allan dos Santos, mas se defende de uma, tal como o Brasil, em relação à Guerra do Paraguai, da qual saiu vencedor. A nação germânica está mais interessada em construir sua influência geopolítica por meio do
softpower, coisa que se faz através da discrição, sem muito alarde jornalístico. E a marca desse
softpower é mesmo a União Européia, que, apesar dos pesares, trouxe estabilidade política a um continente historicamente instável, por conta de tanta guerra.
3.2) Outro fator que favorece o aumento da influência alemã no cenário geopolítico europeu e mundial é que a dívida soberana do país está a 60% do PIB e caindo. A economia anda tão segura que os juros estão negativos, o que fomenta ainda mais investimento em atividade produtiva, já que a atividade especulativa, fundada na poupança, está dando prejuízo.
José Octavio Dettmann
Rio de Janeiro, 5 de dezembro de 2016.
Comentários adicionais (contraponto) 1:
1) A bipolaridade da Guerra Fria foi totalmente artificial. Depois que a SGM terminou, a economia soviética tava tão mal que os EUA poderiam destruir a URSS mediante a simples recusa de ajuda econômica, o que geraria uma rebelião social incontrolável. Além disso, a URSS proibia os partidos de direita, enquanto os EUA permitiam a existência de partidos de esquerda, portanto a guerra fria foi assimétrica, pois o lado soviético não permitia a atuação da direita enquanto o lado americano permitia a atuação da esquerda, sendo minado por seus inimigos internos.
2) A Europa só foi multipolar durante a Idade Média, e ainda assim com uma certa hegemonia da França, que acabou sendo contestada pela Inglaterra no final do período medieval. Com as navegações, a Espanha virou a potência hegemônica, posição que foi suplantada pela França depois da Guerra dos Trinta Anos. Com o passar das décadas, a hegemonia francesa foi cada vez mais contestada pela Inglaterra até resultar nas Guerras Napoleônicas. Depois do Congresso de Viena, passou a vigorar uma bipolaridade entre Inglaterra e França, a ponto de ambas dividirem a África em partes iguais, apesar de haver uma certa superioridade econômica da Inglaterra. Foi essa bipolaridade entre Inglaterra e França que manteve a paz na Europa no século XIX, até que a Alemanha decidiu contestar essa bipolaridade e estourou a Primeira Guerra Mundial.
3) Mas a União Européia também restringe a soberania da Alemanha assim como também restringia a soberania da Inglaterra. A função da Alemanha é ser o império transitório que deverá dar a luz ao império definitivo da União Européia, e depois dissolver-se nele, desaparecendo como entidade identificável. Portanto, não faz sentido enxergar a União Européia como extensão do poder alemão.
(Robert Luís)
Comentários adicionais (contraponto 2):
Acredito que o comentário do professor Olavo foi mal entendido. Ele não disse que a bipolaridade era o melhor dos mundos, mas que para a situação atual era o melhor cenário que poderíamos ter diante de um possível conflito armado entre Russia e Otan. Há fortes evidências que Obama queria provocar uma guerra entre as duas potências para atender os globalistas Islâmicos ou até os globalistas ocidentais. (Jerry Anderson)