I. O equilíbrio entre o espírito e a lei
Em toda a história das nações, liberdade e autoridade foram vistas como polos em tensão. Mas o que Lacerda vislumbrou — e que o Brasil pode realizar — é a síntese desses contrários: uma autoridade que protege a liberdade e uma liberdade que legitima a autoridade.
Na Nova Jerusalém dos Trópicos, a autoridade não é tirania, mas paternidade ordenadora; a liberdade não é rebeldia, mas filiação consciente. Ambas refletem o modelo trinitário: o Pai dá a Lei, o Filho obedece por amor, o Espírito comunica essa obediência como vida interior.
Quando o Brasil entender essa dinâmica, sua Constituição deixará de ser apenas um código e se tornará uma aliança viva — uma lex vivens em que a obediência é liberdade porque provém da verdade.
II. O profetismo político de Carlos Lacerda
Lacerda percebia que o Brasil só se tornaria plenamente civilizado quando conseguisse combinar autoridade moral e liberdade política. Em seus discursos — especialmente nas campanhas de 1954 e 1960 — ele insistia que a democracia brasileira seria inviável sem autoridade fundada no mérito e no dever, e que nenhuma autoridade seria legítima sem respeito à liberdade do espírito.
Essa era, em termos espirituais, uma profecia do Reino do Espírito: a antecipação da ordem em que o poder e a consciência já não se opõem. Lacerda, como eco distante de Jaime Cortesão e de António Vieira, via no Brasil um povo capaz de unir disciplina e inspiração, hierarquia e generosidade. Sua retórica republicana carregava, em fundo, um anseio de redenção nacional.
III. A liberdade como forma da graça
Na Nova Jerusalém dos Trópicos, a liberdade deixa de ser mera permissão e se torna forma da graça: é a capacidade de o homem agir segundo o bem porque o bem habita nele. E a autoridade deixa de ser coerção exterior, para tornar-se expressão visível da ordem interior. Assim, ambas se interpenetram — como as Pessoas divinas se interpenetram em amor recíproco (perichóresis).
O Estado, nesse modelo, é o guardião da liberdade como sacramento civil; e o cidadão, o portador da autoridade moral. Essa é a profecia de Lacerda em chave escatológica: um Brasil onde a lei respira e a consciência governa.
IV. O selo do fractal constitucional
Do ponto de vista do fractal constitucional, liberdade e autoridade são as duas dimensões complementares da autossimilaridade:
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a autoridade garante a continuidade da forma;
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a liberdade, a expansão criadora da vida.
Sem autoridade, o fractal se dissolve; sem liberdade, ele se fossiliza. O equilíbrio das duas forças é o segredo da harmonia federativa — e também o segredo do cosmos. O Brasil, ao conciliá-las, se torna o modelo de uma ordem viva, imagem da Nova Jerusalém, onde a cidade tem muralhas (autoridade) e portas sempre abertas (liberdade).
V. A comunhão luso-brasileira consumada
O sonho de Cortesão — a comunhão entre rei, povo e fé — e a profecia de Tito Lívio Ferreira — o Brasil como novo Portugal — alcançam aqui o seu ápice: a síntese entre liberdade e autoridade como forma de comunhão. Portugal deu ao mundo o império do dever; o Brasil está destinado a oferecer o império da consciência iluminada. Quando o poder servir e a liberdade obedecer, ambos estarão reconciliados em Cristo, e os trópicos resplandecerão como o altar do mundo.
VI. Conclusão: o coro final da profecia
Na Nova Jerusalém dos Trópicos, as colunas do templo serão a Liberdade e a Autoridade, unidas pela pedra angular da Verdade. O juramento de Ourique, a doutrina de Santo Agostinho, a geometria de Mandelbrot e a esperança de Lacerda convergem numa só imagem: o Brasil como cidade espiritual onde a lei é música e a liberdade, harmonia.
Assim, cumpre-se o fractal da história luso-brasileira:
“E vi descer do céu a Cidade Santa, adornada como uma esposa para o seu esposo.” (Ap 21, 2)
O esposo é Cristo; a esposa, a Nação que O serve. E se há de haver uma Jerusalém sob o sol equatorial,ela falará português e chamará a todos os povos para a comunhão do Espírito.
Bibliografia complementar
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Carlos Lacerda, Discursos Parlamentares e Ensaios Políticos, Brasília – Senado Federal, 1978.
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Santo Agostinho, De Libero Arbitrio, Paulus, 2001.
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Jaime Cortesão, Os Fatores Democráticos na Formação de Portugal, Sá da Costa, 1940.
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Tito Lívio Ferreira, O Novo Portugal, Cia Editora Nacional, 1958.
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Teixeira de Pascoaes, A Arte de Ser Português, INCM, 1998.
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