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domingo, 16 de novembro de 2025

Subsidiariedade, Liberdade e Extinção do Imposto de Renda: um ensaio filosófico-teológico sobre a arquitetura moral do Estado cristão

1. Introdução — Quando a Ordem nasce da Pessoa e não do Estado

A Doutrina Social da Igreja — de Leão XIII até Bento XVI — afirma que a sociedade é construída de baixo para cima, e não o contrário.

O ser humano é:

  • imagem de Deus,

  • dotado de razão,

  • dotado de liberdade real,

  • responsável pela administração dos talentos recebidos.

A sociedade justa não é aquela que “dá tudo”, mas aquela que não impede a pessoa de florescer.

O princípio que governa essa dinâmica é a subsidiariedade:

“Não se deve retirar dos indivíduos e dos grupos menores aquilo que estes podem realizar por si mesmos.”
Pio XI, Quadragesimo Anno

Se isso vale para escolas, associações e comunidades, vale ainda mais para a realidade mais íntima da pessoa: a administração de seu trabalho, de sua renda e do fruto de seus talentos.

O Imposto de Renda, na perspectiva filosófica e teológica da liberdade cristã, sempre foi uma espécie de contradição moral tolerada — um poder estatal sobre a interioridade do trabalhador. Eliminá-lo não é apenas uma decisão econômica, mas um reordenamento espiritual das relações entre pessoa e Estado.

2. A antropologia cristã da liberdade: a renda pertence ao trabalhador porque o talento vem de Deus

Cristo não fala de “impostos sobre rendimentos”, mas fala diretamente:

  • “A cada um conforme sua capacidade.”

  • “Multiplica os talentos recebidos.”

  • “O trabalhador é digno de seu salário.”

A renda é o resultado direto do trabalho humano em cooperação com a graça. O Estado não tem direito teológico sobre o talento, e por extensão, não tem direito primário sobre os frutos desse talento.

O Estado só tem direito secundário e derivado, limitado pela ordem moral e pela subsidiariedade.

Daqui decorre:

O Imposto de Renda, moralmente, sempre foi uma exceção justificada por circunstâncias históricas — nunca um princípio.

O IR supõe:

  • acesso à vida privada,

  • violação da intimidade econômica,

  • poder discricionário sobre aquilo que pertence à pessoa,

  • e uma presunção de que o Estado administra melhor do que o indivíduo.

A subsidiariedade afirma o contrário.

3. Subsidiariedade e a esfera econômica: o que pertence ao indivíduo não deve ser absorvido pelo Estado

Segundo a doutrina social:

  • a família é anterior ao Estado;

  • o trabalho é anterior ao Estado;

  • o patrimônio é anterior ao Estado;

  • a cultura é anterior ao Estado.

Quando o Imposto de Renda retira uma parte essencial da atividade criadora do indivíduo, ele introduz uma inversão ontológica:

O que é originariamente privado torna-se originariamente estatal.

Isso é contrário ao que a Igreja sempre ensinou.

Francisco de Vitória, Bellarmino, Suárez e Leão XIII sustentam:

  • o Estado existe por delegação, não por origem;

  • a autoridade civil administra o que sobra, não o que pertence ao trabalhador;

  • o Estado deve apoiar, não substituir.

Extinguir o IR devolve ao trabalhador o que é dele por natureza. E devolve à subsidiariedade o que o estatismo extirpou.

4. A virtude cristã do trabalho e o problema moral do confisco

A tradição cristã vê o trabalho não como punição, mas como:

  • participação na criação,

  • via de santificação,

  • exercício de liberdade,

  • disciplina do espírito.

O mérito do trabalho — e seu fruto material — é parte da dignidade humana.

Quando o Estado cobra imposto diretamente sobre a renda:

  • ele cobra antes da família,

  • cobra antes do sustento,

  • cobra antes da poupança,

  • cobra antes da caridade voluntária.

Isso cria o equivalente moderno ao que a doutrina chama de usurpação moral:

o Estado se coloca entre o indivíduo e os frutos de sua cooperação com Deus.

A eliminação do IR é, nesse sentido, uma restauração moral: é o retorno da prioridade da pessoa sobre o Estado.

5. Liberdade cristã não é libertinagem fiscal — é responsabilidade subsidiária

Cristo não prega anarquia. Ele prega responsabilidade.

  • “A quem muito foi dado, muito será cobrado.”

  • “Dai a César o que é de César.”

  • “Sede perfeitos.”

Isso implica:

  • organização,

  • justiça distributiva,

  • solidariedade,

  • responsabilidade recíproca.

Mas nenhuma dessas virtudes exige a manutenção do IR. Elas exigem ordem fiscal proporcional, territorial, limitada e subsidiária.

Um Estado sem IR não é um Estado sem financiamentos. É um Estado que:

  • cobra pelo consumo, não pela alma;

  • cobra pelo uso, não pela pessoa;

  • cobra pela externalidade, não pelo talento.

Isso é exatamente o que a subsidiariedade exige.

6. A extinção do IR como ato de purificação política

Se o Estado deixa de tributar a renda:

  • ele deixa de espioná-la;

  • deixa de invadir contas, escritórios, recibos e intimidade;

  • deixa de usar a máquina fiscal como instrumento de perseguição;

  • e se obriga a funcionar como administrador, não como mestre.

Extinguir o IR obriga o Estado a:

  • viver dentro de seus limites,

  • não confundir poder com providência,

  • não substituir a moralidade familiar pela moralidade estatal,

  • não infantilizar o cidadão,

  • não usar a máquina tributária como mecanismo de chantagem política.

Em termos teológicos: eliminar o IR é retirar do Estado uma tentação constante de onipotência. E é recolocá-lo no seu devido lugar: um servidor da ordem, não um senhor do trabalho humano.

7. A dimensão espiritual: liberdade como via para a verdade

A libertação fiscal — quando feita dentro da moral cristã — não é apenas econômica.

É espiritual.

É a libertação:

  • da servidão interior,

  • da mentalidade de súdito,

  • da tentação de delegar ao Estado aquilo que Deus nos confiou,

  • da passividade diante da própria vida.

A extinção do IR devolve a cada ser humano a pergunta radical:

O que farei com os talentos que Deus me deu?

E recoloca no centro a tríade que você trabalha constantemente:

  • verdade (discernimento),

  • liberdade (ação responsável),

  • ordem (estrutura moral).

A subsidiariedade é simplesmente o nome político dessa tríade. A extinção do IR é a sua expressão econômica. E a liberdade é a sua expressão espiritual.

8. Conclusão — O Estado Subsidiário como Ordem Cristã da Liberdade

Um país que:

  • elimina o IR,

  • fortalece a subsidiariedade,

  • promove a liberdade responsável,

  • reconhece a precedência da pessoa sobre o Estado,

  • trata o trabalho como dom e vocação,

  • protege a poupança e a propriedade,

  • disciplina o poder civil dentro das fronteiras morais da tradição,

não está apenas fazendo reforma tributária.

Está restaurando a ordem criada, onde:

  • a pessoa é livre,

  • a família é célula primária,

  • a sociedade civil é ativa,

  • e o Estado é servidor — não senhor.

É a política elevada ao plano da teologia moral.
É a economia ordenada à dignidade humana.
É a subsidiariedade como coluna vertebral da liberdade.
É a extinção do IR como devolução da obra humana ao próprio homem.

Em última análise: a liberdade fiscal é um ato de fidelidade à verdade sobre a pessoa humana,
e essa verdade funda toda ordem civil justa.

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