1. Introdução
A história econômica brasileira mostra que o país desenvolveu, sobretudo ao longo do século XX, uma arquitetura complexa de empresas estatais, cujas funções ultrapassavam a simples operação comercial. Essas entidades — as kaishas econômicas — eram instrumentos de fomento, coordenação produtiva, construção de infraestrutura, integração territorial, proteção social e mediação geoestratégica.
Contudo, há uma distinção essencial que precisa ser recuperada para compreender o lugar dessas kaishas na restauração das estruturas civilizacionais do Império do Brasil:
-
Kaishas econômicas produtivas, isto é, indústrias de base (Petrobrás, CSN, Vale até 1997, etc.) — empresas destinadas a criar as condições materiais da soberania e do desenvolvimento industrial.
-
Kaishas econômicas estratégicas, que constituem a infraestrutura institucional de fomento, financiamento e integração nacional (ECT, BNDES, Caixa Econômica Federal, Banco do Brasil em seu papel originário, etc.).
A restauração da pátria — compreendida aqui como reintegração das instituições à sua teleologia civilizacional — não consiste simplesmente em privatizar ou estatizar. Trata-se, antes, de recolocar essas instituições sob a direção de uma classe dirigente moralmente qualificada, comprometida com os valores civilizacionais do Império do Brasil e capaz de dirigir a economia segundo esses princípios.
2. O sentido das kaishas econômicas: além do estatal e do privado
O termo “kaisha”, tomado do japonês (会社), não se limita ao significado moderno de “empresa”. Ele implica:
-
identidade institucional forte;
-
propósito nacional;
-
hierarquia funcional;
-
integração do indivíduo a uma missão coletiva;
-
continuidade histórica da organização;
-
compromisso ético entre empresa e sociedade.
As kaishas econômicas brasileiras — tanto as produtivas quanto as estratégicas — nasceram, nos melhores momentos, com esse espírito. O problema não é a sua existência; é a perversão de sua finalidade.
2.1. A perversão burocrático-republicana
Com a República, essas instituições deixaram de servir ao bem comum para servir:
-
a interesses partidários;
-
a suseranias privadas e transnacionais;
-
a elites políticas cooptadas;
-
a projetos ideológicos desconectados da tradição civilizacional brasileira.
O resultado é que as kaishas tornaram-se:
-
burocracias;
-
máquinas de intermediação política;
-
centros de poder parassoberano;
-
instrumentos de guerra de facções.
Assim, o diagnóstico fundamental que você aponta é correto: não basta privatizar. A simples mudança da propriedade não civiliza uma instituição. É necessário restaurar sua identidade, reordenar sua teleologia e recompor sua direção moral.
3. A necessidade de uma classe dirigente restauradora
A restauração institucional pressupõe, antes de tudo, uma classe econômica e política que assuma o comando dessas kaishas e as administre conforme os valores civilizacionais do Império do Brasil:
-
dignidade do trabalho;
-
honra aristocrática (no sentido moral, não de castas);
-
serviço público como extensão do serviço a Deus;
-
respeito à legalidade imperial;
-
disciplina administrativa;
-
orientação para o bem comum;
-
integração orgânica entre autoridade e responsabilidade.
Sem essa classe dirigente, qualquer reforma estrutural é meramente técnica — e o problema do Brasil é civilizacional, não técnico.
4. A Caixa Econômica Federal como matriz institucional
Quando criada pela monarquia, a Caixa Econômica Federal (então Caixa Econômica e Monte de Socorro) era:
-
instrumento de poupança popular;
-
instituição de confiança absoluta;
-
mecanismo de inclusão social;
-
expressão do paternalismo cristão da monarquia;
-
eixo regulador do crédito debaixo de princípios morais.
Ou seja, era uma kaisha civilizacional, não apenas financeira.
A restauração exige que as demais kaishas — produtivas ou estratégicas — recuperem esse ethos:
-
missão clara;
-
administração honorífica;
-
disciplina;
-
austeridade;
-
identidade institucional forte;
-
serviço público como vocação, não carreira.
5. O modelo Handelsbanken: crédito peer-to-peer e autonomia responsável
O Svenska Handelsbanken é um caso extraordinário de continuidade civilizacional na gestão bancária. Seu modelo se apoia em:
-
Decentralisation radical: as decisões de crédito são tomadas nas agências locais, por quem conhece as pessoas, as empresas e as comunidades.
-
Peer-to-peer credit: a relação financeira é baseada na confiança pessoal.
-
Foco na poupança e prudência, não no endividamento agressivo.
-
Ausência de metas de vendas (que destróem a moral bancária).
-
Continuidade institucional e estabilidade administrativa.
-
Baixíssimo índice de perdas históricas.
5.1. Aplicação ao Brasil imperial restaurado
O Brasil teria aqui um modelo capaz de:
-
quebrar o patrimonialismo;
-
eliminar a intermediação político-burocrática;
-
moralizar o crédito;
-
fortalecer a poupança popular;
-
integrar pequenas comunidades ao projeto civilizacional;
-
reforçar a soberania econômica nas margens do território.
Caixa Econômica Federal (em sua versão imperial restaurada) seria o pilar desse sistema, atuando ao mesmo tempo como:
-
banco de varejo;
-
banco de poupança popular;
-
banco de fomento descentralizado;
-
eixo moral do sistema financeiro.
6. Privatizar ou civilizar?
A fórmula correta é:
Privatizar o que deve ser privatizado.
Civilizar tudo o que deve ser civilizado.
Sacralizar o que é fundacional.
As indústrias de base podem ser privatizadas, desde que sob:
-
governança civilizacional;
-
direção de uma classe empresarial restauradora;
-
compromisso contratual com o bem público;
-
proteção jurídica da soberania nacional.
Mas as kaishas estratégicas — ECT, BNDES, Caixa, Banco do Brasil (em parte) — precisam ser civilizadas, não privatizadas.
7. Conclusão
O Brasil não se reconstrói trocando o estatismo pelo privatismo; isso seria apenas substituir um ídolo por outro. Reconstrói-se retomando a raiz civilizacional que orientava a monarquia:
-
economia a serviço da moral;
-
instituições a serviço da pátria;
-
crédito a serviço do bem comum;
-
administração a serviço de Deus.
A restauração das kaishas econômicas é parte essencial desse processo.
Não é questão de estatizar ou privatizar, mas de restaurar a ordem, recompor a classe dirigente, civilizar a técnica, impor disciplina moral e reconectar as instituições à verdade que as criou.
Bibliografia Comentada
1. Max Weber — Economia e Sociedade
Obra fundamental para entender como tipos de autoridade (tradicional, carismática e racional) moldam instituições. Ajuda a compreender como a burocracia republicana destruiu as kaishas.
2. Roberto Campos — Lanterna na Popa
Apesar do liberalismo do autor, sua visão técnica e bem informada do BNDES, do Banco do Brasil e das estatais da Era Vargas é valiosa. Entende o papel estratégico dessas instituições.
3. Werner Sombart — O Burguês
Importante para compreender a formação das classes econômicas e a diferença entre burguesia civilizadora e burguesia revolucionária. Essencial para pensar a “classe dirigente restauradora”.
4. James Coleman — Foundations of Social Theory
A melhor obra para entender sistemas baseados em confiança e capital social, fundamentos essenciais do modelo peer-to-peer do Handelsbanken.
5. Stefan Jutterström; Jonas Söderberg — Handelsbanken Culture: Achieving Success through Values-Based Banking
Estudo de caso sobre o Handelsbanken e seu sistema de crédito baseado em autonomia responsável. Relevante para a ideia de descentralização moralizada.
6. Ray Dalio — Principles for Navigating Big Debt Crises
Ajuda a compreender como sistemas financeiros entram em colapso quando abandonam princípios e incentivo à poupança, reforçando a crítica ao modelo bancário republicano brasileiro.
7. Sérgio Buarque de Holanda — Raízes do Brasil
Apesar de ser uma obra interpretativa marcada pelo liberalismo, é útil para diagnosticar os vícios patrimonialistas que deformaram as instituições brasileiras e impediram sua civilização.
8. Heitor Lyra — História de Dom Pedro II
Esclarece como funcionavam as instituições da monarquia e sua relação com a poupança, a honra administrativa e o serviço público — matriz da Caixa Econômica original.
9. José Murilo de Carvalho — A Construção da Ordem
Explica a formação da elite burocrática imperial e como ela foi substituída por elites facciosas na República. Essencial para compreender a decadência das kaishas.
Nenhum comentário:
Postar um comentário