Enquanto muitos são levados à emigração por motivos de necessidade — seja para escapar de regimes autoritários, seja em busca de melhores condições econômicas —, há aqueles cuja motivação transcende a mera sobrevivência. Esses não fogem da adversidade, mas respondem a um chamado interior: o de servir a Cristo em terras distantes, tomando diversas nações como um mesmo lar — em Cristo, por Cristo e para Cristo.
Nesse contexto, o matrimônio com uma pessoa digna, que compartilhe dos mesmos valores espirituais e morais, pode representar mais do que uma união pessoal. Pode tornar-se uma via legítima para o cumprimento de uma vocação superior. A obtenção da cidadania por meio do casamento, nesse caso, não decorre de interesse utilitário, mas de uma aliança fundada na verdade, na liberdade e no serviço.
Diferente daqueles que migram impulsionados por carências externas, quem se move por esse tipo de propósito o faz em liberdade. A liberdade, aqui, não é entendida como autonomia desvinculada da verdade, mas como dom do Espírito que capacita o ser humano a entregar-se plenamente à missão que lhe foi confiada. Como ensina São Paulo: “Onde está o Espírito do Senhor, aí está a liberdade” (2Cor 3,17).
Santo Agostinho, em sua obra A Cidade de Deus, afirma que “a verdadeira liberdade é estar sujeito à verdade de Deus” (cf. De civitate Dei, X, 6). E, ecoando esse espírito, São Tomás de Aquino ensina que o amor pela verdade impele o homem a mover-se, não por instinto ou temor, mas por razão e caridade (Summa Theologiae, I-II, q. 17, a. 1).
Essa forma de emigração — não como fuga, mas como envio — encontra também respaldo no Magistério da Igreja. O Papa Leão XIII, na encíclica Rerum Novarum, recorda que o trabalho e o esforço pessoal, unidos à fé, devem ser reconhecidos como expressão legítima da dignidade humana e fonte de capital, inclusive espiritual, acumulado ao longo do tempo (cf. Rerum Novarum, §§ 4-9). Já São João Paulo II, ele mesmo filho de uma terra marcada pela emigração, afirmava: “As nações não se encontram simplesmente umas ao lado das outras; elas estão destinadas a encontrar-se no coração do homem, na verdade que liberta e na caridade que une” (cf. Mensagem para o Dia Mundial da Paz, 2001).
Aqueles que se propõem a servir a Cristo além das fronteiras nacionais, assumindo diferentes terras como expressão de uma única missão, vivem de modo concreto a catolicidade da fé. Como escreveu São João Crisóstomo: “A pátria do cristão é onde ele pode viver em conformidade com a vontade de Deus” (cf. Homiliae in Acta Apostolorum).
Trata-se, portanto, de uma forma superior de emigração — não motivada pela escassez, mas pela plenitude de um chamado. Uma escolha deliberada e consciente, orientada por princípios eternos, capaz de transformar a mobilidade geográfica em expressão de fidelidade, de serviço e de testemunho cristão.
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