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sábado, 12 de abril de 2025

Raízes Virtuais: Memória e Continuidade na Era Digital

Na década de 1980 e 1990, sempre que eu mudava de colégio, era como se uma parte da minha história fosse apagada. Perdia o contato com o grupo com o qual tinha estabelecido vínculos e, com isso, perdia também as referências afetivas que me davam algum senso de pertencimento. Cada mudança era, portanto, um recomeço forçado — uma espécie de amnésia social imposta pela instabilidade da vida escolar.

Essa falta de continuidade teve um impacto profundo na forma como me relacionava com os outros. Eu não conseguia me enturmar com facilidade. Como eu não conhecia ninguém e não havia sequer um rosto familiar que me servisse de ponte, acabava me sentindo deslocado, quase invisível. Estudei na Escola Municipal Nicarágua, depois no Centro Educacional Novo Mundo, mais tarde na Prioridade Hum — onde fiz o pré-vestibular —, até chegar à Universidade Federal Fluminense. Apesar de ter frequentado tantas instituições, nenhuma dessas passagens parecia fazer sentido para mim, pois eu não conseguia preservar os laços que havia construído nelas.

Foi apenas com a chegada das redes sociais que esse ciclo de rompimentos começou a se desfazer. A primeira comunidade online que me deu um certo sentido de pertencimento foi a "Marx é Inquestionável", onde conheci pessoas com quem mantive contato durante o período do Orkut. Pela primeira vez, meus vínculos não se apagavam com o tempo ou a distância. Pelo contrário: eles podiam ser revisitados, reencontrados, ressignificados. A vida online passou a oferecer uma estabilidade emocional e intelectual que a vida real, com suas mudanças bruscas e descontinuidades, nunca conseguiu me oferecer.

Com o tempo e as transformações políticas que se deram no Brasil, comecei a revisar meus contatos, descartando alguns com os quais já não compartilhava a mesma visão de mundo. Esse processo, embora seletivo, foi necessário para consolidar uma rede de convivência que refletisse meus valores mais profundos. Assim, a vida online se tornou a base da minha estabilidade diante da instabilidade do mundo físico.

Como escritor, esse ambiente virtual me ofereceu ainda mais: a possibilidade de ser lido, compreendido e de não depender da geografia imediata para cultivar minhas ideias e meus vínculos. Já não sou mais refém da mediocridade circunstancial daqueles que simplesmente compartilham o mesmo espaço geográfico que eu. Através da escrita, encontrei uma forma de permanência — uma forma de resistência à fragmentação do tempo e da memória.

Hoje, vejo com clareza: aquilo que a vida me negou em presença e continuidade, a linguagem e a tecnologia me devolveram com generosidade. Em vez de raízes fincadas no chão instável da infância e juventude, encontrei raízes digitais — e, nelas, firmei o solo onde posso, enfim, construir e recordar.

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