Uma ponte energética transatlântica entre o Brasil e a Europa: oportunidade estratégica após o apagão na Península Ibérica
O recente apagão que afetou Portugal e partes da Espanha em abril de 2025 trouxe à tona uma realidade incômoda: a matriz energética europeia, mesmo com os avanços em sustentabilidade e descentralização, ainda é vulnerável a falhas sistêmicas. O episódio escancarou a necessidade urgente de diversificação das fontes de energia e de fortalecimento das interconexões internacionais.
Nesse cenário, emerge uma oportunidade estratégica inédita: a construção de um cabo transatlântico de transmissão elétrica entre o Brasil e a Península Ibérica.
Por que conectar Brasil e Europa através da energia elétrica?
O Brasil detém uma das matrizes energéticas mais limpas do planeta. Cerca de 80% da eletricidade brasileira é gerada a partir de fontes renováveis — com predominância da energia hidrelétrica, seguida pelo crescimento exponencial das fontes solar e eólica. Já a Península Ibérica, embora venha investindo pesadamente em energias renováveis, continua sujeita à intermitência dessas fontes e à limitação de integração com o restante da Europa.
Um cabo transatlântico de alta voltagem em corrente contínua (HVDC) permitiria exportar o excedente energético limpo do Brasil para Portugal e Espanha, reforçando a segurança energética europeia e criando uma nova geopolítica do Atlântico Sul-Norte baseada na sustentabilidade.
Tecnologia e viabilidade
Projetos semelhantes já existem em outras regiões do mundo. O North Sea Link, por exemplo, conecta o Reino Unido à Noruega por um cabo submarino de 720 km. A tecnologia HVDC é madura, confiável e eficiente para longas distâncias submarinas. Embora o Atlântico represente um desafio logístico maior (cerca de 5.800 km), os avanços tecnológicos e a urgência climática tornam o projeto plausível.
O investimento necessário seria bilionário, mas não inalcançável, especialmente com o envolvimento de:
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Bancos multilaterais de desenvolvimento, como o Banco Europeu de Investimento (BEI) e o BNDES;
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Fundos verdes europeus e internacionais, que buscam projetos de alto impacto ambiental positivo;
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Empresas multinacionais de energia renovável, interessadas em diversificar suas redes globais.
Benefícios geoestratégicos
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Segurança energética para a Europa
O continente reduziria sua dependência de gás natural (particularmente o russo) e de fontes fósseis ainda ativas em países do Leste Europeu. -
Reconhecimento internacional do Brasil como potência verde
O projeto consolidaria a posição do Brasil como exportador global de energia limpa, atraindo investimentos e projeção política internacional. -
Integração Atlântica sustentável
Uma aliança energética baseada em sustentabilidade fortaleceria os laços diplomáticos e comerciais entre América do Sul e Europa. -
Diversificação econômica para o Brasil
A exportação de energia poderia gerar novas receitas em moeda forte, estimular cadeias produtivas e fomentar o desenvolvimento das regiões produtoras.
Desafios a serem enfrentados
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Viabilidade econômica e política: O custo da infraestrutura precisa ser compensado por acordos comerciais e garantias de longo prazo.
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Estabilidade regulatória e diplomática: O projeto depende da cooperação entre governos, marcos legais transparentes e estabilidade institucional.
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Complexidade ambiental: O impacto ecológico do cabo submarino e das subestações precisa ser rigorosamente avaliado.
Conclusão: o futuro começa no presente
O apagão na Península Ibérica foi um alerta. Mais do que um problema técnico, ele evidenciou uma oportunidade geopolítica. Conectar o Brasil à Europa por meio de um corredor energético renovável é uma ideia audaciosa, mas plenamente alinhada com os desafios do século XXI.
Num mundo em transição energética, quem tiver fontes limpas e confiáveis terá poder. O Brasil possui essas fontes. Falta apenas a visão estratégica e a coragem para transformá-las em um novo vetor de soberania, desenvolvimento e cooperação internacional.
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