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domingo, 18 de agosto de 2024

A internet por um fio - sobre a guerra submarina que pode acabar com sua conexão

(0:01) Os atuais embates geopolíticos pelo poder tornam evidente a importância de proteger cada vez mais (0:08) as infraestruturas críticas de ataques. Uma dessas infraestruturas críticas, (0:15) que é pouco falada, mas desempenha um papel sensível no mundo, são os cabos submarinos. (0:25) Hoje nós vivemos em um mundo hiperconectado e os cabos submarinos são essenciais para (0:31) uma ampla gama de atividades vitais para a nossa sociedade moderna, desde transações financeiras (0:37) até comunicações globais ou cooperação científica internacional.

Somente no setor financeiro os cabos (0:44) submarinos transportam cerca de 10 trilhões de dólares em transferências financeiras diariamente. (0:51) Eles são comumente utilizados em redes internacionais de telecomunicações, interligam países e (0:56) continentes e são fundamentais para a utilização da internet da forma como conhecemos atualmente. (1:02) As primeiras conexões submarinas foram registradas em meados da década de 1850 entre Dover, na (1:09) Inglaterra, e Calais, na França, poucos anos após a invenção do telégrafo.

Em 1858 foi lançado ao (1:17) mar o primeiro cabo transatlântico ligando Londres à Terra Nova e Labrador, no Canadá. Na época eles (1:24) eram bem frágeis e protegidos por uma mistura de cânhamo, substância produzida com a folha da (1:30) cannabis, e uma borracha indiana. Desde então as conexões submarinas evoluíram, passaram a ser (1:36) feitas por fibra ótica e hoje podemos afirmar que os mais de 485 cabos submarinos existentes e (1:44) operantes são responsáveis pelo tráfego de mais de 95% dos dados intercontinentais.

O restante é (1:51) feito através de satélites que apresentam a mesma finalidade. Porém, os cabos submarinos ainda ganham (1:56) em termos de custo de instalação e manutenção, velocidade de transferência dos dados e quantidade (2:02) de dados transferidos. Eles são tão cruciais para a revolução digital quanto a expansão do poder (2:07) computacional e os avanços da inteligência artificial.

A construção desses cabos submarinos (2:13) remonta a tempos mais pacíficos. Além disso, eles ainda não representavam uma vantagem geopolítica (2:19) importante. O objetivo no início era apenas viabilizar serviços de comunicação mais ágeis.

(2:25) Por essa razão, eles não foram projetados para serem constantemente patrulhados e reparados. Porém, (2:31) hoje a realidade é outra. O advento da internet impulsionou a revolução das comunicações e alavancou (2:37) a importância dos cabos submarinos a um papel muito mais sensível e estratégico para a economia global (2:43) e para o sistema de comunicação mundial.

Não é apenas um volume crescente de dados atravessando (2:48) os cabos submarinos. A sensibilidade desses dados também está aumentando, envolvendo não somente (2:54) dados de pessoas privadas ou entes privados, como também de governos. Com isso, a proteção dos cabos (3:02) passou a estar diretamente relacionada à segurança nacional dos países.

Hoje, não estar conectado a (3:08) um cabo submarino significa não fazer parte do mundo. Um bom exemplo disso é o que ocorreu com (3:13) os residentes da ilha Matsu de Taiwan quando o navio chineses cortaram os dois cabos das ilhas (3:19) no início de fevereiro desse ano. Esse evento ficou conhecido como o bloqueio invisível e todos foram (3:25) afetados.

As empresas tiveram suas atividades afetadas sem acesso a seus sistemas, aeroportos (3:30) e hotéis também. Sem acesso à plataforma de comércio eletrônico, a logística básica foi (3:36) prejudicada para os negócios, como restaurantes e lojas. Durante 50 dias, os residentes ficaram (3:42) com acesso limitado à internet, utilizando um sistema de transmissão de rádio por micro-ondas (3:47) que fornecia também acesso limitado e lento à internet.

Mas os ilhéus de Matsu tiveram sorte. (3:54) Em 31 de março, as autoridades taiwanesas conseguiram que uma embarcação reparadora começasse a consertar (4:01) os cabos. Normalmente, a espera é muito longa porque a demanda pelos 60 navios de cabos do (4:08) mundo supera muito a oferta, especialmente porque alguns dos navios, além de fazerem reparos, (4:13) também fazem novas instalações.

Assim, fica evidente como os cabos submarinos passaram a (4:18) representar um tema sensível para os países. Ainda mais agora que o mundo enfrenta um cenário (4:22) de forte instabilidade nas relações internacionais entre grandes potências e com a invasão da Rússia (4:28) à Ucrânia, podendo então os cabos se tornarem um alvo para disputas geopolíticas. Um fator (4:34) importante que complica a proteção de cabos submarinos para os países é que eles são em (4:39) grande parte de propriedade de empresas de comunicações privadas.

Os cabos geralmente (4:44) são financiados por consórcios de empresas de telecomunicações, envolvendo também cada vez mais (4:50) grandes empresas de tecnologia. O mercado é dominado por quatro fornecedores principais. (4:55) A primeira é a Alcatel Submarine Networks, da França, subsidiária da Nokia.

A segunda é a (5:01) Subcom, com sede nos Estados Unidos. A terceira é a NEC, do Japão. E a quarta é a Huawei Marine (5:08) Networks, chinesa, que controla 10% do mercado submarino de cabos de internet no mundo.

Os (5:15) provedores, tais quais Amazon, Facebook, Google, Microsoft, estão aumentando sua participação e (5:23) transformando completamente o mercado de cabos submarinos, construindo a infraestrutura necessária (5:28) por conta própria. Por costume, nenhuma empresa operadora dos cabos está pensando na segurança (5:34) do sistema global ou considerando os grandes desafios geopolíticos futuros que podem ameaçá-los. Além (5:41) disso, os proprietários privados têm mostrado até agora uma grande relutância em assumir os custos (5:47) de aumentar as medidas de proteção.

A propriedade privada de cabos submarinos fez com que muitos (5:52) governos, até muito recentemente, não tivessem o mesmo papel ativo que em outras indústrias (5:57) estratégicas, como energia e transporte marítimo, por exemplo. Além disso, os cabos submarinos não (6:04) têm bandeira, ou seja, são em sua maioria propriedades privadas. Eles não são legalmente (6:10) associados a nenhum país em particular.

Isso complica o status dos cabos sob a lei internacional. (6:16) A Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, de 1982, por exemplo, não apresenta (6:22) disposições que proíbem os Estados de tratar os cabos submarinos como alvos militares legítimos (6:28) durante a guerra. Talvez o ponto mais preocupante relacionado a ataques contra a infraestrutura de (6:33) comunicação submarina seja que agentes mal intencionados não precisam ameaçar ou (6:38) perpetrar ataques em cabos ou infraestrutura de outros atores.

Eles podem simplesmente controlar (6:44) e dominar redes de cabos submarinos próprias para coagir e punir inimigos. Ao dominar uma rede, (6:50) os governos poderiam usar a vantagem tecnoeconômica e o controle desses cabos para alavancagem política. (6:58) Por exemplo, um Estado que domina uma rede pode ameaçar o livre acesso à internet para aqueles (7:04) a quem os cabos chegam.

Isso pode criar uma dependência entre os países que utilizam o (7:09) mesmo cabo, aumentando também a vulnerabilidade desses países. Outra preocupação que tem surgido (7:15) também se respeita a espionagem e os ataques cibernéticos. Por mais que sejam atividades mais (7:21) difíceis do que simplesmente cortar o cabo, por envolver a necessidade de se chegar a ter um (7:26) ponto estratégico no cabo, no fundo do mar, para instalar o material necessário para a espionagem, (7:31) ainda assim é um risco real que muito preocupa os países, levando o debate sobre a necessidade de (7:36) se aprimorar a tecnologia e as estratégias de monitoramento ou patrulhamento.

Essa questão (7:42) está relacionada à entrada no mercado de grandes instaladores e operadores de cabos estatais ou (7:48) afiliados ou financiados pela China, Rússia e outros estados autoritários. Países onde a diferença (7:54) entre público e privado é muitas vezes tênue. Isso significa que questões sobre segurança, (8:00) competição e domínio de cabos submarinos podem passar a ser propositalmente incorporadas às (8:07) políticas desses países.

A China, por exemplo, está explorando a vulnerabilidade das redes, (8:13) investindo nos cabos submarinos e financiando projetos como uma extensão submarina de sua (8:19) iniciativa do Belt and Road, que é a nova rota da seda. Isso passou a configurar como uma estratégia (8:25) de influência, pois os líderes chineses entendem bem a importância de controlar, (8:30) acessar e distribuir informações e inteligência para as populações. O Plano Estratégico Made (8:36) in China 2025 visa que a China controle 60% do mercado global de fibra ótica até 2025.

(8:45) Até o momento, das sete maiores empresas de cabos de fibra ótica do mundo, cinco são chinesas. O (8:51) país está expandindo continuamente a sua frota submarina e desenvolvendo seu próprio setor de (8:56) cabos submarinos. Além disso, oferece a outros países projetos de instalação de cabos a preços (9:02) baixos, uma estratégia que, por mais que pareça altruísta, levanta preocupações em relação à (9:07) dependência e à vulnerabilidade dos países em relação à China.

Na região do Pacífico, (9:12) muitas ilhas ainda não estão conectadas e sofrem com uma infraestrutura precária para a internet. (9:18) Lá, observamos uma corrida constante entre empresas americanas e chinesas para liderar (9:23) a instalação de cabos na região. A Micronese Oriental, por exemplo, abriu um processo de (9:28) licitação para ter seu próprio cabo submarino e o financiamento ficou com o Banco de Desenvolvimento (9:33) Asiático.

Essa licitação desagradou os Estados Unidos, que investem em cabos na região e não (9:39) querem a China interferindo no negócio. O governo dos Estados Unidos, que possui uma forte influência (9:44) pela região, disse que o cabo pode gerar ameaças à segurança caso instalados por uma empresa (9:49) chinesa. Por conta disso, os estados federados da Micronese recuaram e desistiram por hora de (9:56) usar o financiamento do Banco Asiático.

A competição entre Estados Unidos e China aumenta a perspectiva (10:01) de outros países usarem os cabos para se impor geopoliticamente. A Global Cloud Exchange da (10:08) Índia, por exemplo, é proprietária do cabo Falcon, que conecta Egito, Sudão, Arábia Saudita, Iêmen, (10:16) Oman, Emirados Árabes Unidos, Catar, Bahrein, Kuwait, Iraque, Irã, Índia, Sri Lanka e Maldivas. (10:23) Se, por exemplo, a reaproximação do Irã e da Arábia Saudita, mediada pela China, se desgastar, (10:30) um dos parceiros pode optar por inviabilizar o seu ponto de recepção do cabo ou optar pela (10:36) utilização de um outro cabo, prejudicando assim todos os envolvidos.

Todos esses fatos nos levam (10:42) a traçar três tendências que estão acelerando os riscos à segurança dos cabos submarinos. Primeiro, (10:48) à medida que o mundo continua a se digitalizar, muito mais cabos serão necessários nos próximos (10:53) anos. Espera-se que seu número cresça cerca de 30% ao ano e, com isso, a relevância dos mesmos (10:59) para o mundo também vai aumentar.

Segundo, o volume de dados enviado cresce diariamente, (11:05) assim como a sua sensibilidade. E terceiro, essa infraestrutura crítica será vista cada (11:10) vez mais por países autoritários como uma ferramenta para promover o seu poder e influência. (11:16) Dada a importância crítica dos cabos submarinos para a segurança transatlântica, garantir sua (11:22) total proteção deve ser uma prioridade coletiva.

Embora os cabos sejam gerenciados, (11:28) mantidos e protegidos de forma privada, os governos têm de promover avaliações de risco (11:33) nacional referentes aos projetos, garantir o compromisso do setor privado com a segurança (11:39) através de leis e desenvolver recursos nacionais de monitoramento e reparo dos cabos. Além disso, (11:46) o desenvolvimento de tecnologias emergentes, como a criptografia avançada e a inteligência (11:51) artificial, pode fortalecer ainda mais a segurança deles, impedindo ataques cibernéticos e garantindo (11:57) a integridade das comunicações. Para os próximos anos, esperamos que tanto os países quanto as (12:03) empresas que compõem o mercado se unam para proteger o que hoje conhecemos como a espinha (12:08) dorsal que sustenta a comunicação global.

Professor HOC

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