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segunda-feira, 11 de agosto de 2014

Comentários sobre a crise que a Revolução Liberal de 1820 causou no Brasil e em Portugal


1) Quando houve a revolução liberal do Porto em 1820, como um reflexo decorrente da Revolução Francesa, o cenário era de flagrante incerteza, agravado ainda mais pelo temperamento de D. João VI, que era indeciso.

2) Do debate que havia entre o conselheiro Thomaz Antônio, que era absolutista, e o Conde de Palmella, que fazia concessões aristocráticas e prudentes ao movimento constitucionalista, D. João costurava uma idéia e outra - e a costura se fundava na linha tênue da incerteza. Ele pedia conselhos constantemente e protelava uma medida, uma ação necessária - ele não sabia se devia conceder uma constituição para apaziguar os ânimos ou reprimir de vez a sedição soldadesca, que estava querendo uma constituição nos moldes da Constituição espanhola da época.

3) A constituição espanhola da época tinha uma cláusula de que o rei não podia ausentar-se do reino sem a permissão das cortes, sob pena da perda da coroa para um aventureiro qualquer. Como isso é estopim para a formação de uma república, o conselheiro Sylvestre pinheiro esteve coberto de razão de ficar irritado, pois é uma ofensa à pátria e ao sentido da aliança entre o altar e o trono, uma vez que Cristo fez D. Afonso Henriques e seus descendentes reis de Portugal, de modo a que este sirva a Cristo em terras distantes. Sylvestre Pinheiro foi o único que votou contra a partida de del-rey D. João VI para Lisboa.

4) Enquanto D. João não se decidia, as idéias vintistas já se alastravam por aqui, via Pará e Bahia. No Rio de Janeiro, já havia o Revérbero Constitucional Fluminense. O infante D. Pedro, que seria mais tarde D. Pedro I do Brasil e D. Pedro IV de Portugal, já havia aderido às idéias constitucionalistas. Já defendia um dualismo constitucional, posto que Portugal e Brasil tinham costumes e circunstâncias diferentes. Na prática, isso implicaria cisão do Brasil num Império independente, sobretudo porque se semeou entre nós a idéia de que o português era um usurpador que preteria o filho da terra aqui.

5) Por fim, chegou-se à decisão de se adotar provisoriamente a constituição da Espanha, enquanto Portugal não fazia a sua, e a partida definitiva de El-Rey para Lisboa. Como já disse antes, na cláusula espanhola o rei não poderia se ausentar do país sem a permissão da corte, que representa seu povo. Se ele ficasse fora, é sinal de que teria abandonado a coroa. Do ponto de vista desses que adotam as idéias liberais, adota-se a falácia de que a mudança da corte para o Rio foi um ato de covardia do Rei. E essa solução constitucional, considerando-se a realidade do mundo português como um todo, não é uma solução sensata.

6) Admitindo-se o fato de que o Brasil estivesse sendo invadido por forças estrangeiras, é mais sensato o soberano pôr-se a salvo em um lugar mais seguro e coordenar a resistência de fora. Pois não há tempo hábil para se pedir permissão à corte para se ausentar do país. Foi o que de fato houve na Noruega, ao longo da Segunda Guerra Mundial, quando o reino foi invadido pelos nazistas.

7) No caso do Brasil, D. Pedro II estava em idade avançada e ele costumava ir à Europa e aos EUA em busca de alta cultura e de coisas que pudessem dar causa ao desenvolvimento econômico do país, a longo prazo. Essas viagens, que tinham caráter particular, são muito necessárias - e no fundo tem uma natureza pública.

8) Quando o imperador se ausenta, ele desde cedo ensina o povo a conhecer seu futuro sucessor quando faz de seu filho mais velho um regente, como foi no caso da Princesa Isabel. E quando o regente faz coisas fantásticas, como sancionar a Lei Áurea, é sinal de que o País estaria bem encaminhado, quando o imperador falecer, já com o decorrer da idade. Tal como o pai que sai à rua para comprar coisas necessárias para casa ou quando sai por conta do serviço, o filho mais velho maior e capaz cuida dos mais novos e passa a ouvir as queixas dos irmãos, de modo a pôr ordem na casa, enquanto o pai está ausente. Eis aí mais um sentido da estabilidade política que se dá pela monarquia hereditária - o rei ou imperador prepara seus filhos para o comando, enquanto ele se ausenta do país em viagem para o bem do país.

9) Se ele ficar vinculado à permissão das cortes, a coroa pode cair nas mãos de um aventureiro e o país descambar numa república. Essa limitação da saída do rei é um golpe fatal no governo hereditário, pois a regência é um estágio final para que o futuro rei governe sem incidente algum, que se dá por falta de experiência.

10) A permissão de saída do mandatário na república faz mais sentido devido à natureza provisória da figura do chefe de Estado e também pelo fato de ele ser tanto chefe de Estado quanto de governo.

11) Se o chefe de Estado, o rei ou imperador, deixa um príncipe como regente, isso é sinal de que a chefia de Estado não estará vaga. Pois nenhum rei, enquanto bom pai de família que é, deixa seu povo desamparado. O regente age como um mandatário, um longa manus do rei, pois ouvir as queixas do povo é papel do rei, fundado no fato de que ele é pai da pátria. E o mandatário, o regente, responde perante o rei, tal como o filho mais velho presta contas ao pai, por conta do deveres fundados na ausência boa e necessária.

12) O filho mais velho, ao se tornar mandatário do pai, ele é não padrasto, e com isso garante a estabilidade da família. O padrasto tende a ser visto como um aventureiro ou deseducador, o que destrói de vez a família, por falta da referência paterna. É o começo da republicanização da pátria, quando os filhos da terra se perdem por conta da referência paterna do Rei, que é pai de muitos, tal como os padres, nas suas paróquias.

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