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segunda-feira, 21 de julho de 2025

Santificação na Rede Social: a vida que vivi online

Meu amigo Helleno não acreditava em santidade na internet. Talvez, por consequência disso, também não acreditasse que alguém pudesse se santificar através do trabalho feito nas redes sociais. Para ele, o mundo virtual era, no máximo, um espaço de distração, ou talvez um palco para vaidades. Mas para mim, foi muito mais do que isso.

A vida que não pude viver no mundo real — seja por limitações materiais, por circunstâncias históricas, ou por ausência de interlocutores à altura — eu a vivi online. Vivi não de forma superficial, mas profundamente, como quem mergulha num ofício. Através da atividade intelectual, da escrita diária, da leitura séria, da observação cuidadosa do outro e do uso criterioso da palavra, fui me santificando.

Escrevi textos com um propósito. Não busquei curtidas, mas testemunho. Não falei para agradar, mas para afirmar a verdade que liberta. Cada post, cada comentário, cada conversa, todas elas foram tentativas sinceras de servir a Cristo, mesmo que em silêncio, mesmo que no anonimato. Fui honesto. Trabalhei. Dei a cada um o que era seu no devido tempo. E o fiz, muitas vezes, sem nenhuma recompensa imediata — o que me fez lembrar que nem todo fruto é visível aos olhos humanos.

Enquanto muitos zombavam da internet como terra sem lei ou como esgoto moral, eu via nela uma nova fronteira. E, como nos tempos das Grandes Navegações, entendi que essas fronteiras não são para ser conquistadas como o fizeram Espanha, França ou Holanda — mas como fez Portugal: servindo a Cristo.

É claro que existe o risco do orgulho, da vaidade, da exposição exagerada. Mas existe também, para quem se consagra, a possibilidade de transformar esse risco em cruz. E a cruz, se for aceita com fé, é caminho de santificação.

Por isso escrevo. Por isso persisto. Porque vi que, mesmo quando a vida concreta não me ofereceu as condições para cumprir certas vocações, a vida digital — usada com prudência, humildade e firmeza — me permitiu realizá-las em parte. E o que é a santificação, senão isso: realizar, em parte, o que Deus nos chamou a fazer, com fidelidade e amor?

A rede social, para mim, não foi palco. Foi mosteiro. Foi oficina. Foi púlpito. Foi lar. E continua sendo.

Navegar é preciso: um chamado à santidade nas redes sociais

Vivemos uma era em que estar nas redes sociais parece inevitável. Mas, como toda grande novidade da história humana, esse mar aberto e digital exige discernimento, coragem e direção. Por isso, o que inicialmente seria um conselho para um filho que ainda não nasceu — e que um dia ouvirá, com atenção, do pai que o ama —, torna-se agora um aviso público a todos aqueles que desejam manter a integridade da alma em meio ao caos informacional dos nossos tempos.

As Redes Sociais como o Novo Oceano

Quando alguém ingressa nas redes sociais, está, em certo sentido, repetindo o gesto dos navegadores do século XV: lança-se ao desconhecido, em busca de alguma promessa — seja de reconhecimento, influência, conhecimento, lucro ou amor. 

Esse gesto, porém, não é neutro. Assim como as Grandes Navegações geraram civilizações e também tragédias, a navegação digital pode edificar ou destruir uma alma, conforme o rumo que ela tome.

Há quem use as redes como a Espanha: impondo força e opinião sobre os outros, querendo dominar territórios alheios com altivez.

Há quem use como a França: cultivando uma imagem de requinte e beleza, porém alicerçada na vaidade.
Outros, como a Holanda, fazem das redes um canal apenas para o lucro e o pragmatismo.

Mas há um outro modo, mais nobre, mais antigo, mais cristão: o modo português — o modo de quem leva consigo o Evangelho e se lança ao mundo com o firme propósito de servir a Cristo em terras distantes.

O propósito: servir a Cristo

Ninguém deveria ter uma presença pública sem uma missão clara. E a missão do católico nas redes sociais deve ser a mesma de sua vida inteira: amar e servir a Deus, tornar visível o Reino, sustentar a verdade, defender os pequenos, consolar os aflitos, edificar os que buscam, denunciar o mal e testemunhar a beleza da fé. Em suma: ser presença de Cristo onde Ele é mais desprezado.

Se tua entrada no mundo digital não for motivada por esse ideal, melhor seria não entrar. A neutralidade não existe. Nas redes, ou se é fermento de santidade ou se é mais um grão na massa podre da vaidade, da mentira e da autoglorificação.

A condição: mortificar o eu

Mas mesmo o propósito nobre de evangelizar pode ser corrompido se não vier acompanhado da mais importante de todas as disposições interiores: a mortificação do eu.

O cristão que se lança nas redes precisa antes aprender, na vida sacramental e orante da Igreja, a dizer “não” a si mesmo. Porque, nesse mar virtual, tudo convida ao orgulho: os números de seguidores, os likes, os comentários elogiosos, a ilusão de superioridade. E tudo isso nos distancia da cruz.

 O erro mais comum nas redes é transformar o próprio ego em altar. O apóstolo que se exibe deixa de ser servo para ser ídolo. E um ídolo de barro. É necessário, portanto, viver o que se prega. Negar-se a si mesmo. Aceitar o anonimato. Perdoar ofensas. Calar diante de calúnias. Falar somente o necessário. Testemunhar com obras, pois, nas redes sociais, a maior caridade é a integridade silenciosa e coerente.

Um apelo ao recolhimento (se for o caso)

Se alguém não se sente capaz de entrar nas redes com esse espírito — ou se, tendo entrado, vê que sua alma começa a se corromper —, não há vergonha nenhuma em recolher-se. Pelo contrário: há sabedoria. É melhor viver no escondimento de Nazaré do que se perder nas praças públicas de um mundo sem freios.

A internet não é para todos. Nem precisa ser. O recolhimento voluntário pode ser, em muitos casos, o caminho mais santo.

Conclusão: o chamado é universal

Este artigo nasceu como um conselho de pai para o filho que um dia vai nascer, caso um dia eu venha a ter. Mas a verdade que esta mensagem carrega é maior do que a relação de sangue. É um chamado universal à responsabilidade e à santidade no mundo digital.

Se fores navegar, prepara tua alma como se estivesses indo ao encontro de civilizações distantes. Carrega contigo a fé, a humildade, a oração e a disposição de sofrer por amor. E lembra-te: navegar é preciso, sim — mas é ainda mais preciso servir a Cristo com inteireza, onde quer que estejas.

Deus é o critério: como ensinar os filhos a se comportar nas redes sociais através do exemplo

Vivemos em tempos em que a exposição digital se tornou inevitável. Desde cedo, as crianças e os jovens são introduzidos ao universo das redes sociais, ambiente que, embora ofereça oportunidades de conexão e aprendizado, também se transformou em um campo de batalha cultural, espiritual e moral. Diante disso, muitos pais se perguntam: como preparar meus filhos para esse mundo? A resposta mais eficaz, porém frequentemente esquecida, é simples: pelo exemplo.

A autoridade que vem da coerência

Quando meus filhos ingressarem nas redes sociais, eles terão diante de si uma oportunidade única — não de serem guiados por influencers, algoritmos ou tendências vazias, mas de serem guiados por alguém que lidera pelo exemplo: seu pai.

Desde o início, estabeleci para mim uma conduta firme: não sou eu quem procura pessoas — deixo que me procurem. E quando isso acontece, não aceito de imediato: estudo cuidadosamente o perfil de quem deseja se aproximar. Há critérios, e eles não são negociáveis: não adiciono quem carece de conteúdo relevante, quem sustenta ideias esquerdistas ou quem se enreda em fé herética.

Esses critérios não nascem de um capricho pessoal ou de uma busca por “pessoas parecidas comigo”. Eles nascem de uma consciência clara: minha rede social é uma extensão do meu templo interior, e deve ser guardada com a mesma vigilância com que se guarda o coração.

Contra os algoritmos: o critério é Deus

As redes sociais vivem de oferecer conexões aleatórias, pautadas por algoritmos que identificam padrões, comportamentos e preferências. Mas um cristão maduro não se submete a essas lógicas: ele se guia por Deus. E se Deus é o critério — e basta que seja Ele —, todo o resto se ordena com naturalidade. O que os algoritmos tentam adivinhar por estatística, Deus revela por sabedoria.

Meus filhos não verão, portanto, um pai refém de redes ou dependente de aceitação virtual. Verão um homem que sabe discernir e que ensina pelo gesto — não pelo sermão.

Educar para a eternidade

Um pai que lidera dessa forma não está preocupado apenas com a reputação digital, mas com a formação do caráter e da alma. Ensinar os filhos a se comportar nas redes sociais não é apenas protegê-los de más influências, mas sim prepará-los para agir como luz em meio às trevas. E isso não se aprende por manuais de etiqueta digital, mas por testemunho de vida.

Eles verão que, para o pai deles, amizade não é número, influência não é volume, visibilidade não é vitória. Verão que a integridade vale mais do que a popularidade, e que a verdade vale mais do que a aprovação. Isso é educar com autoridade. Isso é formar filhos com consciência e fortaleza para enfrentar um mundo que, a cada dia, exige mais discernimento.

Conclusão

Num tempo em que tantos pais se sentem impotentes diante da velocidade da internet, eu caminho com tranquilidade: não sou movido pela ansiedade de controlar, mas pela certeza de testemunhar. Porque, ao fim, é isso o que permanece: os filhos se esquecem dos discursos, mas jamais esquecem os exemplos.

E no que depender de mim, eles não esquecerão que seu pai se manteve firme, mesmo no mundo digital — porque o critério sempre foi Deus.

Amizade Digital, Méritos de Cristo e a Geografia da Fé

Vivemos em tempos em que o conceito de amizade é frequentemente dissolvido no caldo ralo das redes sociais. Para muitos, ser "amigo" é apenas aceitar uma solicitação, clicar num botão. Mas amizade, como sabiam os antigos, é coisa muito mais séria. Aristóteles já distinguia a  amizade da utilidade, pois para ele havia duas amizades: a de prazer e a verdadeira amizade — aquela fundada na virtude e no bem comum1. Ora, essa distinção, embora milenar, continua atualíssima no contexto digital.

Ao contrário da minha colega Cinthia Madeira, que adota o critério da convivência presencial como condição sine qua non para o vínculo digital, eu compreendi que a ausência de contato físico não é impedimento para a comunhão de espírito. Meu critério é outro: estudo o perfil de quem me adiciona, examino as postagens, as interações, as confissões públicas de fé e, sobretudo, procuro detectar a conformidade com o Todo que vem de Deus2. Se encontro afinidade nos fundamentos — e, mais ainda, a defesa de valores monárquicos, que compreendo como uma forma superior de organização do bem comum fundada na ordem transcendente —, aceito o vínculo.

Essa escolha não é casual, mas deliberada. A monarquia, compreendida aqui como símbolo da hierarquia natural e da autoridade derivada de Deus3, é para mim um critério espiritual e político. Da mesma forma, a geografia não limita minha busca por interlocutores: se a alma daquela pessoa está orientada pelo mesmo eixo que norteia a minha, podemos conversar em profundidade, nos méritos de Cristo, ainda que estejamos em hemisférios opostos.

As redes sociais, nesse sentido, tornam-se um instrumento de comunhão espiritual e intelectual — não uma vitrine de vaidades, mas um mosteiro digital, onde se pode encontrar, de tempos em tempos, monges dispersos, anacoretas conectados por fios invisíveis da graça.

Essa postura evita o risco de sermos escravizados pela cultura do algoritmo, que estimula conexões superficiais e impessoais. Ao fazer uso inteligente da rede, recuso o automatismo e abraço o discernimento. A amizade digital verdadeira exige estudo, oração e leitura atenta dos sinais — aquilo que os antigos chamavam de discernimento dos espíritos4.

Referências

  1. ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. Tradução de Leonel Vallandro e Gerd Bornheim. São Paulo: Abril Cultural, 1984. (Os Pensadores).

  2. Cf. ROMANOS 12,2: “E não vos conformeis com este mundo, mas transformai-vos pela renovação da vossa mente, para que experimenteis qual seja a boa, agradável e perfeita vontade de Deus.”

  3. DE MAISTRE, Joseph. Do Papa. São Paulo: É Realizações, 2010. O autor defende que a monarquia é reflexo na terra da ordem celeste, e que a autoridade legítima só pode provir de Deus.

  4. SANTO INÁCIO DE LOYOLA. Exercícios Espirituais. São Paulo: Loyola, 1999. Nos Exercícios, Inácio ensina a distinguir o bom espírito do mau, algo essencial para qualquer discernimento — inclusive nas redes.

O mercado da Hanse e A escola da vida: sobre o aprendizado de Idiomas em jogos sem tradução e a questão da superação das fronteiras próprias do mundo interior

1. Introdução: A criança diante da fronteira

Na infância, muitos de nós tivemos o primeiro contato com o inglês através de jogos eletrônicos. Numa época sem traduções, dicionários ou internet rápida, compreender o que se passava nas telas era um ato de fé. A criança sentava-se diante de uma nova linguagem como quem encara uma fronteira: havia algo além dela — um mundo —, mas também uma barreira a ser vencida.

No caso de José Octavio Dettmann, deste que vos fala, essa barreira era real: ainda no primário, sem pais que falassem inglês, sem professores e sem recursos, o mundo dos jogos era simultaneamente encantador e intransponível. Mas hoje, ao revisitar esses mesmos jogos — inclusive em línguas ainda mais desafiadoras como o alemão e o chinês —, ele volta àquela fronteira infantil, desta vez com os meios necessários para atravessá-la.

2. A fronteira não é geográfica, é existencial

A tese clássica de Frederick Jackson Turner, em The Frontier in American History, propõe que a experiência americana foi moldada pela expansão rumo ao oeste: cada fronteira vencida exigia um novo tipo de homem. A fronteira era mais que um território — era uma forja espiritual. Ela separava o conhecido do inexplorado, o conforto do risco, a estagnação da descoberta.

Ao aplicar essa ideia à vida pessoal, compreendemos que há fronteiras íntimas a serem vencidas — e a infância é uma delas. A criança de ontem conheceu os limites da sua linguagem, da sua cultura, da sua condição social. Mas, ao retornar com maturidade e com domínio tecnológico, o adulto tem a chance de fazer aquilo que lhe era impossível.

Não se trata apenas de recordar o passado — trata-se de reabsorver a circunstância vivida, agora com ferramentas que antes não existiam, e superá-la. O que era sofrimento torna-se capital. O que era frustração vira vantagem.

3. Os jogos como portos de comércio intelectual

Jogos como Patrician, especialmente suas versões não traduzidas lançadas exclusivamente na Alemanha, oferecem uma linguagem rica em vocabulário mercantil, jurídico e político. Jogar esses títulos em alemão é como aportar num porto hanseático: exige negociação, compreensão, aprendizado rápido — e, agora, tudo isso é possível com o apoio de uma IA que serve como intérprete, professor e interlocutor.

O mesmo vale para jogos como Vagrus: The Riven Realms ou Merchants of Kaidan, que empregam um inglês arcaico, literário e exigente. Eles não simplificam para o jogador moderno. Mas o jogador que aprendeu a lidar com a ausência — que reconhece que existe uma fronteira — está pronto para explorar essas “terras estrangeiras” com destreza.

4. A tecnologia como meio de superação, não de comodismo

A geração mais nova reclama quando o jogo não está em português. Essa reclamação, no fundo, é sintoma de uma cultura que já não reconhece a existência da fronteira. Para esses, a tradução não é ferramenta, é pré-requisito. E ao exigir o conforto antes do esforço, perdem o valor da conquista.

Este que vos fala, ao contrário, sabe que a fronteira existe porque a viveu - não só viveu como a estudou na universidade. E hoje, com a tecnologia ao seu favor, não apenas joga melhor: ele aprende melhor, vive melhor, compreende melhor. A tecnologia não o afasta do esforço — ela o arma para vencer aquilo que antes lhe era intransponível.

Enquanto a nova geração se frustra, ele avança.

5. Conclusão: A fronteira é o lugar onde o espírito amadurece

Superar a própria infância é uma das maiores conquistas que um homem pode realizar. Mas essa superação não é negação: é retorno com justiça. Este que vos fala revisita aquele menino sem dicionário e sem inglês e o resgata — agora com conhecimento, inteligência artificial e vontade.

A fronteira não era o idioma. Era o medo de não compreender.

A tecnologia não é um atalho. É a caravela. 

E o jogo não é apenas um passatempo. É um território a ser conquistado.

O retorno da Liga Hanseática: por que o Patrician I merece um remake narrativo ou um 4X estratégico

 Lançado originalmente em 1992, Patrician I foi um marco discreto, porém significativo, nos jogos de simulação econômica. Ambientado no norte da Europa medieval e centrado na poderosa rede de cidades da Liga Hanseática, o jogo colocava o jogador no papel de um comerciante em ascensão — mas com foco mais narrativo e social do que seus sucessores. Diferentemente das versões posteriores, que priorizaram gestão logística e expansão de impérios comerciais, Patrician I guardava uma alma mais intimista e política. Hoje, diante do sucesso de jogos como Merchants of Kaidan, Vagrus: The Riven Realms e Tortuga: A Pirate’s Tale, é legítimo perguntar: não seria a hora de resgatar essa alma original em uma nova roupagem?

A alma do primeiro Patrician: narrativa, política e ambição

Enquanto Patrician III e IV se consolidaram como simuladores complexos de comércio e política urbana, o primeiro jogo da série era quase uma novela medieval interativa. O jogador precisava conquistar prestígio local, sobreviver à política urbana e ganhar influência nos conselhos das cidades hanseáticas. Ainda que rudimentar, essa estrutura favorecia uma narrativa mais orgânica, onde as decisões não eram apenas econômicas, mas éticas, relacionais e políticas.

Esse espírito é cada vez mais valorizado na nova onda de jogos com forte componente narrativo. Merchants of Kaidan, por exemplo, embora mais simplificado mecanicamente, resgatou esse comércio aventureiro entre vilarejos e cidades com decisões difíceis e imprevisíveis. Vagrus, por sua vez, criou um universo inteiro onde o comércio é só uma das ferramentas para sobreviver e influenciar o destino de uma civilização pós-apocalíptica. 

Duas direções possíveis para um renascimento do Patrician

1. Remake narrativo: “Patrician – Tales of the Hanse”

Inspirado em Vagrus e Kaidan, este remake manteria o comércio como pilar, mas o colocaria a serviço de decisões morais, histórias pessoais e disputas políticas locais. O foco deixaria de ser a macrogestão e passaria a ser o papel do indivíduo: um comerciante, um político, um possível prefeito ou líder regional.

  • O jogo se desenrolaria por eventos (em estilo de cartas ou escolhas múltiplas).

  • Cada cidade teria seu próprio ecossistema social: famílias influentes, guildas, candidatos, escândalos.

  • Elementos históricos poderiam ser explorados com mais liberdade literária, valorizando a vivência pessoal sobre a precisão documental.

  • Trilha sonora e arte em 2.5D dariam o tom imersivo, reforçando o drama e a ambientação do Báltico medieval.

2. Spin-off estratégico 4X: “Patrician – Rise of the Hanse”

Outra direção promissora é seguir o modelo Tortuga, também publicado pela Kalypso Media. O jogo manteria a identidade comercial, mas incorporaria elementos de exploração e estratégia em escala maior.

  • Exploração do mapa do Mar do Norte e Báltico, com desbloqueio de rotas marítimas, eventos climáticos e ameaças piratas.

  • Expansão econômica e política: alianças entre cidades, compra de títulos, influência sobre o conselho hanseático.

  • Exploração, Exploração, Expansão e Extermínio (4X) adaptados ao contexto medieval europeu, com foco comercial e diplomático, não bélico.

  • Possibilidade de campanha cooperativa ou competitiva online entre casas mercantis rivais.

Por que agora?

O mercado atual de jogos de estratégia e simulação está pronto para uma proposta desse tipo. Jogos como Old World, Terra Invicta, Against the Storm e o promissor Millennia mostram que há uma fome por jogos históricos que combinam profundidade estratégica com identidade narrativa. O ciclo de nostalgia também favorece o resgate de IPs antigas — especialmente quando se pode atualizar o conceito com mecânicas modernas e visuais aprimorados.

Além disso, a Kalypso já detém a marca Patrician e tem experiência recente com jogos similares (Tortuga, Port Royale 4). Com um motor gráfico já disponível e uma base de fãs cultivada ao longo dos anos, o investimento seria proporcionalmente baixo e o potencial de retorno, considerável.

Conclusão

A história da Liga Hanseática é rica em comércio, diplomacia, ambição e conflito velado. Patrician I capturou essa essência de forma simples, mas memorável. Hoje, temos tecnologia, público e precedentes para fazer essa proposta florescer de novo — seja com uma roupagem narrativa profunda e pessoal, seja com um sistema 4X estratégico e ambicioso.

A Europa medieval do norte nunca foi tão promissora. Resta saber quem ousará içar as velas do renascimento hanseático.

Honra e Oportunismo: como nos portamos diante da fragilidade alheia

Nos últimos anos, tornou-se visível e desconcertante o modo como certos homens reagem diante da vulnerabilidade feminina, especialmente em cenários de guerra e crise humanitária. Um dos casos mais vergonhosos veio à tona quando o então deputado Arthur do Val, conhecido pelo codinome “Mamãe Falei”, viajou à Ucrânia em meio ao conflito bélico, não para prestar solidariedade, mas para comentar com tom libidinoso sobre a beleza e a “facilidade” das mulheres refugiadas¹.

A repercussão não foi à toa: esse episódio expôs, de forma pública e escandalosa, uma estrutura de pensamento perversa — uma ética de conquista que nada tem de nobre ou viril, mas que se ancora na exploração da dor, na inversão da caridade, e na instrumentalização do outro para fins pessoais. É o oposto do que o amor cristão ensina.

1. A mulher frágil como campo de caça: crítica ao modelo predatório

O comportamento desse tipo de homem — travestido de coragem por se “aventurar” em zona de guerra — revela, na verdade, uma covardia moral. Ao invés de proteger, usa a fragilidade como alavanca para seu desejo. Ao invés de elevar, rebaixa.

Essa postura representa o modelo predatório de masculinidade, no qual o outro é reduzido a ocasião de consumo. A mulher em situação de guerra ou pobreza deixa de ser um “próximo” no sentido evangélico (cf. Lc 10,29-37), para ser vista como um “objeto sexualmente disponível”.

Esse imaginário é uma forma moderna de colonialismo afetivo: o homem "ocidental", rico ou ao menos em situação de estabilidade, se vale da ruína alheia para extrair o que deseja, sem compromisso, sem entrega, sem reciprocidade.

2. A liberdade no amor e a ética cristã da honra

Em contraste a esse modelo está o homem honrado, que se orienta por outro princípio: o da liberdade fundada na verdade. Em minha experiência pessoal, por exemplo, tenho mantido contato com mulheres ucranianas por meio de plataformas de relacionamento como o Amal Date. E, embora muitas delas tenham se mostrado receptivas e até empenhadas em conquistar minha atenção, não vejo nisso uma brecha para exploração, mas um convite à responsabilidade.

Esse olhar é cristão porque vê o outro como um fim em si mesmo, não como meio. O verdadeiro amor não se aproveita da liberdade do outro, mas se submete a ela. Ele não invade, mas convida. Como diz São Paulo, “o amor é paciente, é benigno; [...] não busca os seus próprios interesses, não se irrita, não suspeita mal” (1Cor 13,4-5).

A liberdade, neste caso, não é a de fazer o que se quer, mas de agir segundo a verdade do bem. E isso supõe o domínio de si, o controle do desejo e o reconhecimento da dignidade alheia. É o que Aristóteles chamava de sophrosyne, e que Santo Tomás traduz em termos de temperança.

3. Josiah Royce e a lealdade como fundamento da amizade verdadeira

O filósofo americano Josiah Royce, em sua obra A Filosofia da Lealdade, estabelece que o bem mais alto da convivência humana está em se viver por uma causa que transcenda o interesse próprio². A lealdade, nesse sentido, não é um mero sentimento de fidelidade, mas uma escolha ativa de dedicar-se a uma causa digna, como a verdade, a justiça ou — neste caso — o amor que edifica.

Relacionamentos fundados na desigualdade e na manipulação do outro estão em contradição direta com esse ideal. Se a mulher ama ou se entrega apenas porque se sente sem saída, não há ali liberdade, logo, não há verdadeira reciprocidade. A lealdade exige liberdade interior de ambas as partes.

4. O exílio como campo de prova da honra masculina

Vivemos tempos de dispersão e exílio. Muitos de nós não habitamos mais as terras onde nascemos, seja física ou espiritualmente. E é justamente nesse estado de "estrangeiros no mundo" (cf. Hb 11,13) que a honra se torna mais necessária.

Se, como ensinava Olavo de Carvalho, o exílio é uma condição espiritual antes de ser geográfica, então é justamente nesse estado que somos chamados a reafirmar a nossa fidelidade ao que é justo, belo e verdadeiro³. E isso inclui o trato com as mulheres, especialmente com as mais vulneráveis.

Ser homem, à imagem de Cristo, é carregar a cruz, não impô-la ao outro. É proteger, não possuir. É amar até o fim, mesmo que o fim não traga vantagem alguma.

Conclusão

Enquanto o mundo celebra o cinismo, a esperteza e a conquista a qualquer custo, o homem honrado — aquele que ama nos méritos de Cristo — se distingue pela reverência ao mistério da liberdade alheia. Ele vê no rosto da mulher estrangeira, ferida, solitária, não um corpo a ser usado, mas uma alma a ser ouvida, cuidada e, se Deus quiser, amada.

Ao contrário do predador que vagueia em meio aos escombros da guerra à procura de prazer, o homem justo se aproxima com temor e tremor, sabendo que, diante dele, está uma filha de Deus. E com isso, cumpre aquilo que está escrito: “O que fizerdes a um destes pequeninos, a mim o fizestes” (Mt 25,40).

Notas de rodapé

  1. A viagem de Arthur do Val à Ucrânia e seus comentários foram amplamente repercutidos na imprensa brasileira em março de 2022, culminando em sua renúncia ao cargo de deputado estadual e sua inelegibilidade por oito anos.

  2. Royce, Josiah. The Philosophy of Loyalty. New York: Macmillan, 1908. Ver especialmente o capítulo “Loyalty and the Moral Life”, onde o autor sustenta que o bem moral está no comprometimento com uma causa contínua e partilhada.

  3. Cf. Carvalho, Olavo de. O Jardim das Aflições. Rio de Janeiro: Record, 1995. O autor mostra como a perda do eixo espiritual leva o homem moderno a um estado permanente de desterro existencial, sendo a fidelidade à verdade o único remédio contra a dissolução da alma.