1) Não
entendo nada de arte. Não sou filósofo nem humanista: não passo o dia
pensando nas grandes questões da humanidade. Como advogado, sou apenas
uma espécie de tecnólogo: as pessoas me procuram com problemas reais e
eu as ajudo a resolver. Pra mim um bom dia é aquele em que meu trabalho
foi tão socialmente útil quanto o de um pintor ou de um padeiro.
2) Mesmo sem entender nada de arte, eu contemplo o Davi de
Michelangelo, a Primavera de Botticelli ou ouço a 9ª Sinfonia de
Beethoven e sei que aquilo é Belo. Não entendo nada de sfumato, mas sei
que Da Vinci foi um gênio quando vejo a Mona Lisa. Nem Michelangelo, nem
Da Vinci, nem Botticelli nem Beethoven tinham uma agenda
político-ideológica em mente enquanto compunham suas obras primas.
Nenhum desses artistas queria moldar a sociedade ou transformar o mundo,
e contudo eles elevavam espiritualmente qualquer indivíduo que entrasse
em contato com suas obras. Em todas essas obras eu sei que estou diante
da vitória do gênio sobre a mediocridade, do avanço da técnica que é
fruto do espírito humano, e cada uma delas me inspira a tentar ser
melhor do que eu sou.
3) Se a arte tem a ver com os valores
estéticos da beleza, equilíbrio e harmonia, ela não deveria ter um
"objetivo social". Uma das maiores perversões do marxismo cultural é
justamente o de submeter toda a técnica humana aos objetivos da
revolução. Para o progressista, tudo tem que ter uma "função social".
Ninguém diria que o funk carioca é belo, ou que traduz uma técnica
inovadora de se fazer música, mas o ritmo é adorado pela esquerda do
Leblon justamente porque ajuda a destruir e subverter o próprio conceito
do que seja "belo". Quem acha que até a biologia é "socialmente
construída" sabe que sua primeira tarefa é DESCONSTRUIR tudo o que é
fruto da tradição e da sabedoria acumulada por sucessivas gerações.
Destroem um edifício pra erigir uma favela em seu lugar.
4) Isso não
ocorre só nas artes. A Arquitetura ensinada nas faculdades há muito
tempo deixou de ser a ciência da organização do homem no espaço para se
tornar instrumento de "inclusão social". Há 3 meses, alunos do curso de
Arquitetura da UFMG se recusaram a cumprir um exercício proposto por um
professor porque ele “incorpora a senzala e reforça os moldes de
dominação em pleno século 21”. O mesmo em relação ao Direito, em que
seus "operadores" atualmente se vêem como verdadeiros justiceiros
sociais de toga e beca, com teorias como a do Abolicionismo Penal ou
termos como "interpretação conforme", nomes bonitos pra esconder o
objetivo maior de rasgar a lei, caso ela se coloque à frente do que se
entenda como "justiça social". A Psicologia, a Pedagogia, a História,
tudo vira ferramenta nas mãos do engenheiro social, empenhado que está
em destruir o que ele não entende na tentativa de implantar uma utopia
que ele não conhece.
5) Todas essas premissas estão contidas na
bisonha nota do Santander Cultural, ao anunciar a suspensão da exposição
Queermuseu. Para eles, textualmente, o objetivo da Arte não é estético,
e sim "promover o debate sobre as grandes questões do mundo
contemporâneo". O papel do artista não é retratar o Belo, é "gerar
reflexão". A Arte, pra ser válida, deve ser "capaz de gerar inclusão".
Tudo é politizado, tudo é passível de "conscientização". E a nota faz
um mea-culpa num estranho tom passivo-agressivo, como se o problema não
fosse o fato de que a exposição não tinha nenhum caráter artístico, ou
que fazia apologia à pedofilia e à zoofilia, e sim os que "se sentiram
ofendidos" (esses, nesse momento, são as 25 mil pessoas que
classificaram a página com uma estrela são a "minoria reacionária" - os
cerca de 2.000 que curtiram a exposição, aparentemente, são o "povo", a
massa).
6) Isso não foi uma derrota, foi apenas um recuo
estratégico. Como uma criança, o progressismo vai testando os limites
dos adultos até tomar um tapão na cara. Eles sabem que dessa vez
exageraram na dose, mas daqui a pouco voltam com alguma coisa
ligeiramente mais palatável, que devagarinho vai educando as massas a
romantizar o feio e a idolatrar o profano.
Rafael Rosset (https://www.facebook.com/rafael.rosset/posts/10211775975773117)
Facebook, 12 de setembro de 2017.
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