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quinta-feira, 23 de outubro de 2025

O homem maduro e o vinho: a arte de transformar o ordinário em extraordinário

Introdução

Assim como o vinho não nasce pronto, o homem também não. Ambos precisam de tempo, de disciplina e de influência externa para que alcancem sua melhor forma. O vinho jovem é áspero e desequilibrado; o homem jovem é cheio de energia, mas carece de experiência e de sabedoria. O processo de maturação é o que os transforma em algo extraordinário.

O processo de maturação

No caso do vinho, repousar em tonéis de carvalho é essencial: a madeira imprime aromas, suaviza taninos e acrescenta profundidade. Esse tempo de contato, controlado com paciência, produz complexidade e harmonia.

Do mesmo modo, o homem, exposto às experiências, às derrotas e às vitórias, à disciplina do trabalho e à reflexão moral, suaviza suas arestas e adquire profundidade. A maturidade é o resultado de um processo lento, mas consistente.

O papel do gerenciamento

Nem todo vinho se torna excelente — depende do cuidado do enólogo. É preciso regular a temperatura, a oxigenação e o tempo de repouso. Da mesma forma, o gerenciamento de homens (managing) é a arte de criar condições para que indivíduos comuns se transformem em extraordinários.

Um bom líder é como o mestre do vinho: conhece o potencial de cada pessoa, entende quando intervir e quando deixar que o tempo trabalhe. O ambiente organizacional, nesse sentido, é o “tonel de carvalho” onde homens se transformam.

O ordinário tornando-se extraordinário

Peter Drucker já dizia que o verdadeiro desafio da liderança não é obter feitos heroicos de gênios, mas criar uma cultura onde o ordinário possa render o máximo de si. Stephen Covey, em sua “Liderança

Centrada em Princípios”, reforça que a grandeza é resultado da combinação de caráter e competência ao longo do tempo. O líder, como o enólogo, não cria o vinho — ele apenas potencializa o que já existe. Assim também com os homens: a liderança extrai aquilo que o ordinário não sabia que tinha.

O envelhecimento como virtude

Aristóteles, na Ética a Nicômaco, nos lembra que a virtude se constrói pelo hábito. O vinho só se torna nobre com a repetição do tempo bem administrado; o homem só se torna sábio ao reiterar boas escolhas, transformando-as em hábitos.

O homem maduro, portanto, não é apenas aquele que envelheceu, mas aquele que soube envelhecer bem.

Conclusão

A metáfora é clara:

  • O vinho precisa de carvalho; o homem precisa de valores e disciplina.

  • O vinho precisa de tempo; o homem precisa de experiência e perseverança.

  • O vinho precisa de um enólogo; o homem precisa de liderança.

O extraordinário não surge por acaso. É fruto de um processo de gerenciamento, de maturação e de fé no potencial humano. O homem maduro, como o bom vinho, torna-se melhor a cada ano — não porque o tempo passou, mas porque soube transformar o tempo em virtude.

Bibliografia

  • ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. Trad. António C. Caeiro. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2004.

  • COVEY, Stephen R. Principle-Centered Leadership. New York: Free Press, 1991.

  • DRUCKER, Peter F. The Effective Executive: The Definitive Guide to Getting the Right Things Done. New York: Harper Business, 2006.

  • MAXWELL, John C. Developing the Leader Within You. Nashville: Thomas Nelson, 1993.

  • SENGE, Peter M. The Fifth Discipline: The Art and Practice of the Learning Organization. New York: Doubleday, 1990.

  • SILVEIRA, Sidney. A arte de governar-se a si mesmo. São Paulo: É Realizações, 2015.

  • WILKINSON, Alec. The Wine and the Vine: Symbolism in Christian Culture. London: Thames & Hudson, 2000.

 

quarta-feira, 22 de outubro de 2025

Jornalismo de Ficção: entre a imaginação e a realidade

Introdução

O fenômeno do chamado “jornalismo de ficção” vem ganhando espaço em plataformas digitais como o canal Crônicas do Brasil. Diferente das fake news, que são narrativas falsas travestidas de verdade com o intuito de manipulação e desinformação, o jornalismo de ficção assume, de forma explícita, sua natureza especulativa. Ele parte da estética e da forma jornalística, mas constrói narrativas que pertencem ao campo da imaginação, da possibilidade e da conotação.

No entanto, ao trazer para o formato jornalístico aquilo que não é real, esse gênero carrega tanto um potencial criativo e reflexivo, quanto riscos de incompreensão em contextos onde o déficit educacional e midiático é profundo.

Jornalismo de ficção x Fake News

A distinção entre o jornalismo de ficção e a desinformação é crucial.

  • Fake news: narrativas falsas apresentadas como verdadeiras, com objetivo de enganar e manipular.

  • Jornalismo de ficção: relatos assumidamente ficcionais, que utilizam a linguagem e a forma jornalística para criar narrativas possíveis, cenários especulativos ou histórias alternativas.

Enquanto o primeiro destrói a confiança pública, o segundo pode ampliá-la, desde que seja bem delimitado, por se apresentar como um exercício literário e de entretenimento.

A função da ficção na linguagem jornalística

A literatura sempre trabalhou com a ideia do “e se?” – seja nas utopias, distopias ou ucronias. O jornalismo de ficção, portanto, é uma transposição desse exercício para o formato jornalístico.

  • Ele cria manchetes, reportagens e entrevistas fictícias que se conectam com possibilidades sociais ou históricas ainda não realizadas.

  • Funciona como uma simulação cultural: uma forma de imaginar o futuro, explorar alternativas políticas ou refletir sobre dilemas morais.

Umberto Eco, em Apocalípticos e Integrados, lembra que toda narrativa midiática é uma construção; Roland Barthes, em Mitologias, mostra como os discursos carregam sentidos que ultrapassam o literal. O jornalismo de ficção está justamente nesse campo do simbólico, da conotação, onde se desdobram possibilidades.

O desafio brasileiro

No Brasil, entretanto, essa prática enfrenta um desafio de recepção.

  • O baixo nível de educação midiática dificulta a distinção entre denotação (o fato real) e conotação (o sentido especulativo).

  • Em um país onde boa parte da população ainda tem dificuldade de interpretar textos complexos, um produto jornalístico ficcional pode ser confundido com realidade.

Isso exige dos produtores sinais claros de demarcação: avisos, disclaimers, estilo visual distinto e, sobretudo, a transparência quanto ao caráter fictício do conteúdo.

Potencial educativo e cultural

Apesar dos riscos, o jornalismo de ficção pode ter um papel formativo:

  • Educação crítica: ensina a ler o jornalismo como linguagem, e não apenas como “espelho da realidade”.

  • Expansão da imaginação política: permite ao público refletir sobre futuros possíveis, alternativas sociais e consequências de decisões coletivas.

  • Diálogo com a literatura: cria uma ponte entre jornalismo e ficção, resgatando o valor cultural da narrativa como ferramenta de pensamento.

Se bem conduzido, esse gênero pode ampliar horizontes intelectuais, convidando os cidadãos a pensar em hipóteses e a refletir criticamente sobre o presente.

Conclusão

O jornalismo de ficção não deve ser confundido com desinformação. Ele é um gênero híbrido que utiliza a forma jornalística para construir narrativas literárias, explorando possibilidades ainda não realizadas.

No entanto, seu êxito depende de um público capaz de diferenciar o real do especulativo, algo que no Brasil atual ainda é um desafio. Portanto, sua prática deve ser feita com parcimônia, clareza e responsabilidade.

Trata-se de uma iniciativa criativa e ousada, que pode contribuir para a cultura crítica e para a educação midiática, desde que não perca de vista o seu caráter: não informar sobre o que aconteceu, mas narrar aquilo que poderia acontecer.

Referências

  • BARTHES, Roland. Mitologias. Rio de Janeiro: Difel, 1982.

  • ECO, Umberto. Apocalípticos e Integrados. São Paulo: Perspectiva, 1979.

  • BAKHTIN, Mikhail. Estética da Criação Verbal. São Paulo: Martins Fontes, 1992.

  • SODRÉ, Muniz. A Máquina de Narciso: televisão, indivíduo e poder no Brasil. Rio de Janeiro: Vozes, 1996.

  • CHOMSKY, Noam; HERMAN, Edward. Manufacturing Consent: The Political Economy of the Mass Media. New York: Pantheon, 1988. 

terça-feira, 21 de outubro de 2025

Taxback do Imposto de Renda: o que pode significar para famílias com entes falecidos nos últimos cinco anos

A proposta legislativa da deputada Júlia Zanatta, que pretende extinguir o imposto de renda no Brasil, trouxe à tona uma série de reflexões jurídicas e práticas. Para além da discussão política e econômica sobre a viabilidade da medida, há um efeito direto que pode impactar fortemente famílias brasileiras: a possibilidade de reclamar a restituição do imposto de renda pago nos últimos cinco anos, inclusive por entes falecidos.

Este artigo é direcionado não apenas a quem paga imposto de renda hoje, mas também a famílias que perderam um ente querido recentemente — em especial nos últimos cinco anos.

📌 O fundamento jurídico do taxback

O Código Tributário Nacional (CTN) prevê, em seu artigo 165, que todo contribuinte tem direito à restituição do indébito tributário quando um tributo é pago indevidamente ou declarado inconstitucional. Já o artigo 168 fixa o prazo de cinco anos para pleitear essa devolução, contados a partir da data do pagamento.

Assim, se o imposto de renda for revogado ou considerado inválido, abre-se a possibilidade de os contribuintes pedirem de volta tudo o que foi pago nesse período. E isso se estende inclusive aos tributos pagos por pessoas que já faleceram.

📌 O caso dos falecidos

Quando alguém falece, seus bens e direitos passam a compor o espólio, que é representado pelo inventariante. Se a partilha dos bens já foi feita, mas posteriormente surge um novo direito patrimonial (como o crédito tributário de restituição), é cabível a chamada sobrepartilha — prevista no Código Civil (art. 2.020) e no CPC (art. 669).

Isso significa que:

  • O crédito de restituição referente ao imposto de renda pago pelo falecido nos últimos cinco anos é considerado um novo bem da herança.

  • Mesmo que a partilha já tenha sido concluída, ela pode ser reaberta para incluir esse crédito.

  • O valor restituído será então dividido entre os herdeiros conforme os quinhões já estabelecidos.

📌 Exemplo prático

Imagine uma pessoa que pagava, em média, R$ 1.000,00 de imposto de renda por mês.

  • Em um ano, isso corresponde a R$ 12.000,00.

  • Em cinco anos, R$ 60.000,00.

  • Corrigidos pela taxa SELIC, como manda a lei em casos de restituição tributária, esse valor pode facilmente superar os R$ 80.000,00.

Se essa pessoa faleceu há dois ou três anos, e a partilha já foi feita, os herdeiros ainda terão direito a receber esse montante via sobrepartilha, pois se trata de um bem “novo”, criado pela mudança legislativa ou por decisão judicial que reconheça a ilegalidade do tributo.

📌 Orientações para as famílias

  1. Guardar documentação: mantenha organizados todos os informes de rendimentos, declarações de imposto de renda e comprovantes de retenção, tanto da pessoa falecida quanto dos familiares que ainda pagam IR.

  2. Consultar o processo de inventário: tenha em mãos a partilha concluída, pois será necessário compará-la ao novo crédito para abertura da sobrepartilha.

  3. Acompanhar a tramitação da lei: o projeto ainda está em discussão no Congresso, e não há garantias de aprovação. Mas o monitoramento é essencial para agir no momento certo.

  4. Buscar orientação jurídica: caso a lei seja aprovada ou o imposto declarado inconstitucional, a restituição deverá ser reclamada judicialmente ou administrativamente. Para espólios, isso exigirá atuação processual própria.

📌 Conclusão

Estamos diante de uma situação extraordinária: o possível reconhecimento de que bilhões de reais foram pagos indevidamente em imposto de renda, abrindo caminho para uma devolução sem precedentes.

Para famílias que perderam entes queridos nos últimos cinco anos, o impacto pode ser ainda maior. Valores que não faziam parte da herança originalmente podem surgir retroativamente, exigindo reabertura de partilhas e redistribuição entre herdeiros.

Mais do que nunca, é hora de se preparar: pagar corretamente os tributos de hoje, mas manter organizada toda a documentação dos últimos cinco anos, para que o direito ao taxback seja exercido no futuro, caso o ordenamento jurídico brasileiro assim o permita.

📚 Bibliografia essencial

  • BRASIL. Código Tributário Nacional (Lei nº 5.172/1966).
    Artigos 165 a 168 (restituição do indébito tributário e prazo quinquenal).

  • BRASIL. Código Civil (Lei nº 10.406/2002).
    Art. 2.020 – sobrepartilha.

  • BRASIL. Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015).
    Art. 669 – hipóteses de sobrepartilha.

  • Projeto de Lei nº 4329/2025. Deputada Júlia Zanatta (PL/SC). Câmara dos Deputados.
    Ficha de tramitação

Conhece-te a ti mesmo, tuas circunstâncias e o Direito: entre o que se vê e o que não se vê

Introdução

Pensar o direito não é apenas tarefa do legislador, do juiz ou do jurista profissional. Cada pessoa, em suas circunstâncias únicas, é chamada a refletir sobre como as normas gerais e abstratas se aplicam concretamente à sua vida. O princípio socrático “conhece-te a ti mesmo”, somado à máxima de Ortega y Gasset — “eu sou eu e minha circunstância” —, oferece um método para verificar se a lei aperfeiçoa a liberdade ou se, ao contrário, a restringe indevidamente.

O direito como regra geral e abstrata

O direito positivo possui caráter geral e abstrato. As normas são formuladas para abarcar um número indeterminado de pessoas e situações, garantindo previsibilidade e igualdade formal. No entanto, somente ao encarnar-se em casos concretos é que se verifica se esse ideal cumpre sua função: promover a justiça e a liberdade real.

Nesse sentido, a introspecção é um exercício hermenêutico: ao examinar a si mesmo e às próprias circunstâncias, o indivíduo pode perceber se a lei está em harmonia com os valores que pretende resguardar ou se existem falhas ocultas.

Bastiat e o que não se vê

Frédéric Bastiat, em sua célebre obra O que se vê e o que não se vê, adverte que as consequências das leis e políticas públicas não se limitam aos efeitos imediatos. O que se é apenas a superfície; o que não se vê são os efeitos indiretos, difusos, de longo prazo.

Assim, o exercício de autoanálise não apenas revela como a lei atua sobre a vida do indivíduo, mas também permite identificar externalidades invisíveis: desigualdades reforçadas, liberdades corroídas, injustiças não intencionadas. Ao iluminar o não visto, o cidadão se torna intérprete crítico do ordenamento jurídico.

O Direito e a liberdade concreta

A medida última da justiça de uma lei é sua capacidade de aperfeiçoar a liberdade. A norma que protege a vida, a honra e a dignidade amplia a esfera de ação do indivíduo; a que o aprisiona em formalismos ou injustiças ocultas reduz seu potencial humano.

Nesse ponto, a experiência pessoal se torna critério avaliativo: se, nas minhas circunstâncias, a lei me conduz a uma vida mais justa e livre, ela cumpre sua finalidade; se não, denuncia-se uma falha legislativa ou interpretativa que precisa ser corrigida.

Conclusão

Pensar o direito a partir do “conhece-te a ti mesmo” é resgatar a dimensão humana da norma jurídica. É olhar para além do texto legal e perceber o impacto real sobre a vida concreta. Quando esse exercício se alia à lição de Bastiat — ver também o que não se vê —, o direito deixa de ser mera abstração e se transforma em caminho para a realização da liberdade.

Bibliografia

  • BASTIAT, Frédéric. O que se vê e o que não se vê. São Paulo: Instituto Mises Brasil, 2010.

  • ORTEGA Y GASSET, José. Meditaciones del Quijote. Madrid: Revista de Occidente, 1914.

  • SÓCRATES. Fragmentos preservados por Platão em Apologia de Sócrates.

  • REALE, Miguel. Lições Preliminares de Direito. 27. ed. São Paulo: Saraiva, 2002.

  • FRANKL, Viktor. Em Busca de Sentido. Petrópolis: Vozes, 2019.

Capital Moral como categoria jurídica: uma proposta para a Teoria do Direito

Introdução

O Direito moderno reconhece como bens tutelados a propriedade (material e imaterial), a honra, a dignidade e o nome. No entanto, ainda não há, de forma explícita, o reconhecimento jurídico do capital moral como categoria autônoma.

À luz de Hernando de Soto (O Mistério do Capital), podemos compreender que a riqueza não se limita ao domínio de bens formais, mas ao conjunto de instrumentos que dão segurança às transações. Do mesmo modo, à luz de Hayek, Leão XIII, Szondi e Frankl, é possível afirmar que existe uma forma de capital anterior e mais profunda: o capital moral, encarnado sobretudo no bom nome da família.

Este ensaio propõe a formalização do capital moral como categoria jurídica, dotada de tutela própria e de funções essenciais à ordem social e econômica.

1. Definição de Capital Moral

O capital moral é o conjunto de valores, virtudes e reputação acumulados por uma pessoa ou família ao longo do tempo, que geram confiança social e funcionam como garantia natural nas relações jurídicas, econômicas e políticas.

Ele é:

  • Personalíssimo: inalienável, não pode ser vendido nem transferido.

  • Intergeracional: transmitido como herança moral.

  • Funcional: reduz custos de transação, gera crédito e confiança.

  • Existencial: confere sentido à vida ao inserir o indivíduo numa cadeia de gerações.

2. Diferença em relação à honra e ao nome

A honra e o nome já são bens tutelados pelo ordenamento jurídico (CF/88, art. 5º, X; CC/2002, arts. 12 e 20). No entanto, tratam-se de bens de personalidade, voltados à proteção da individualidade.

O capital moral vai além: ele é coletivo, acumulativo e funcional. Não protege apenas a subjetividade da pessoa, mas a reputação da linhagem e sua função econômica e política como moeda natural.

3. Funções do capital moral no direito

O capital moral exerce funções comparáveis às da propriedade formal em Hernando de Soto:

  1. Identificação – distingue famílias e indivíduos pela reputação herdada.

  2. Garantia – funciona como colateral moral, assegurando confiança em contratos.

  3. Proteção das transações – reduz a insegurança jurídica e a necessidade de coerção estatal.

  4. Continuidade – preserva a ordem espontânea (Hayek) e a cadeia de gerações (Lovejoy).

  5. Sentido existencial – protege o homem da falta de sentido (Frankl) e o vincula à missão herdada (Szondi).

4. Tutela Jurídica Proposta

A formalização do capital moral como categoria jurídica poderia se dar em três níveis:

  • Constitucional: reconhecimento expresso do capital moral como bem da personalidade coletiva da família, ligado à dignidade da pessoa humana.

  • Civil: inserção no Código Civil de dispositivos que reconheçam o capital moral como patrimônio imaterial transmissível, protegido contra calúnia, difamação e abuso de autoridade.

  • Penal: agravamento das penas para crimes contra a honra que destruam não apenas o indivíduo, mas também a reputação intergeracional de famílias.

Exemplo de dispositivo normativo (proposta):

“Art. X – O capital moral, consistente no bom nome e na reputação acumulados por pessoa ou família, constitui bem jurídico imaterial e personalíssimo, transmissível intergeracionalmente, protegido contra qualquer forma de ataque, abuso de autoridade ou difamação que comprometa sua função social e econômica.”

5. Capital Moral em tempos de democracia relativa

Em contextos de democracia relativa e de estado de exceção, quando instituições falham ou se tornam instrumentos de difamação, a proteção do capital moral é ainda mais urgente. Autoridades ilegítimas que enlameiam o bom nome de inocentes cometem não apenas um crime contra a honra individual, mas um atentado contra o capital moral da sociedade.

A democracia só pode subsistir quando há confiança entre os cidadãos. E essa confiança depende do bom nome — a verdadeira moeda moral da vida social.

Conclusão

O capital moral deve ser reconhecido como categoria autônoma no Direito. Ele não é apenas honra ou nome, mas a moeda natural que sustenta a confiança, garante a cooperação e dá sentido à vida social.

Assim como Hernando de Soto revelou o mistério do capital na formalização da propriedade, precisamos hoje desvendar o mistério do capital moral: a herança imaterial que sustenta a ordem espontânea, a dignidade das famílias e a legitimidade da democracia.

Proteger o bom nome da família como NFT natural é, portanto, não só um dever jurídico, mas um ato de resistência cultural e espiritual — pois, nos méritos de Cristo, esse é o talento recebido que deve ser multiplicado em favor da verdade e da liberdade.

Bibliografia

  • Aristóteles. Política. Tradução de Mário da Gama Kury. Brasília: Editora UnB, 1991.

  • Bauman, Zygmunt. Amor Líquido: sobre a fragilidade dos laços humanos. Rio de Janeiro: Zahar, 2004.

  • Bourdieu, Pierre. Formas de Capital. In: NOGUEIRA, Maria Alice; CATANI, Afrânio (orgs.). Escritos de Educação. Petrópolis: Vozes, 1998.

  • Brough, William. The Natural Law of Money. New York: Appleton and Company, 1896.

  • Burke, Edmund. Reflections on the Revolution in France. London: Penguin Classics, 2004.

  • Coleman, James. Foundations of Social Theory. Cambridge: Harvard University Press, 1990.

  • Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília: Senado Federal.

  • De Soto, Hernando. O Mistério do Capital: por que o capitalismo triunfa no Ocidente e fracassa em todo o resto do mundo. Rio de Janeiro: Record, 2001.

  • Frankl, Viktor. Em Busca de Sentido. Petrópolis: Vozes, 2011.

  • Hayek, Friedrich. Law, Legislation and Liberty. London: Routledge, 1973.

  • Leão XIII (Papa). Rerum Novarum. Roma, 1891.

  • Lovejoy, Arthur O. The Great Chain of Being: A Study of the History of an Idea. Cambridge: Harvard University Press, 1936.

  • Menger, Carl. Principles of Economics. Auburn: Ludwig von Mises Institute, 2007 [1871].

  • Szondi, Leopold. Schicksalsanalyse: Wahl in Liebe, Freundschaft, Beruf, Krankheit und Tod. Bern: Hans Huber, 1963.

  • Código Civil Brasileiro (Lei n. 10.406/2002). Brasília: Senado Federal.

O Mistério do Capital Moral: o bom nome da família como NFT natural em tempos de democracia relativa e estado de exceção no Brasil

Introdução

Hernando de Soto, em sua obra clássica O Mistério do Capital, mostrou que a riqueza das nações não reside apenas na posse de bens, mas na formalização da propriedade, que transforma ativos em capital vivo. Essa formalização garante segurança às transações, mesmo em tempos de instabilidade ou estado de exceção.

No entanto, há um capital anterior, mais profundo e mais resistente às crises institucionais: o capital moral. Ele se manifesta sobretudo no bom nome da família, patrimônio imaterial e intergeracional que funciona como verdadeira moeda natural. Assim como o dinheiro nasceu da confiança social (Menger, Brough), também o bom nome da família é reconhecido como crédito natural. É, por isso, o verdadeiro NFT natural: único, personalíssimo, inalienável e duradouro.

1. A função da propriedade segundo Hernando de Soto

De Soto destacou que a propriedade formal:

  • Identifica e dá unicidade a um bem.

  • Permite que seja usado como garantia em contratos.

  • Protege transações contra fraude e insegurança.

  • Funciona mesmo em contextos de instabilidade política, dando previsibilidade às trocas.

Essa função de segurança é o que torna a propriedade instrumento essencial de confiança econômica.

2. O NFT digital: tentativa artificial de proteção das transações 

O NFT digital, criado pela tecnologia blockchain, busca cumprir uma dessas funções da propriedade descritas por De Soto: a proteção das transações. Ele assegura a unicidade de bens digitais, confere autenticidade e permite trocas mesmo em ambientes de incerteza.

Trata-se, porém, de uma solução artificial e limitada: dependente de tecnologia, energia computacional e confiança em redes que podem, em última análise, ser manipuladas ou perder relevância.

3. O bom nome da família: o verdadeiro NFT natural

O que o NFT digital tenta reproduzir de forma tecnológica, o bom nome da família já realiza de modo natural:

  • É único e personalíssimo, ligado a uma linhagem específica.

  • É inalienável, não pode ser vendido ou transferido, apenas herdado como missão.

  • É natural, construído pela virtude, pela honra e pela reputação ao longo do tempo.

  • É garantia de transações, pois reduz custos e aumenta a confiança nos contratos.

  • Funciona como moeda moral em tempos de ordem ou de exceção, sustentando a confiança mesmo quando o Estado falha.

Enquanto o NFT digital tem sua “blockchain” em algoritmos, o bom nome tem sua “blockchain” na memória social e moral das gerações.

4. O mistério do capital moral

Aqui podemos formular um conceito paralelo ao de Hernando de Soto: o mistério do capital moral. Ele consiste no fato de que a verdadeira riqueza de uma sociedade não está apenas em ativos formalizados, mas no patrimônio invisível da confiança herdada.

  • Hayek mostra que a ordem social é fruto da continuidade espontânea de tradições. O bom nome é um desses pilares invisíveis da ordem espontânea.

  • Leão XIII, na Rerum Novarum, ensina que o capital é fruto do trabalho acumulado. O bom nome é a dimensão moral desse capital, acumulado pela fidelidade das gerações.

  • Szondi vê o homem como construtor de pontes entre passado e futuro. O bom nome é uma dessas pontes, transmitindo missão e sentido.

  • Frankl ensina que o homem sobrevive a tudo, menos à falta de sentido. O bom nome preserva o sentido, porque insere o indivíduo numa história maior que si mesmo.

Assim, o capital moral é aquilo que transforma não apenas ativos em capital, mas vidas em continuidade de confiança e dignidade.

5. Democracia Relativa e Estado de Exceção

Nos tempos atuais, marcados por uma democracia relativa, autoridades ilegítimas muitas vezes difamam inocentes, enlameando seu bom nome com acusações falsas. Esse ataque não destrói apenas indivíduos, mas também o tecido moral da sociedade, pois mina a moeda natural da confiança.

Nesses contextos de exceção, o NFT digital pode oferecer alguma segurança para transações artificiais. Mas o verdadeiro baluarte contra o caos é o bom nome da família, que continua sustentando a confiança entre pessoas mesmo quando instituições falham.

Conclusão

O bom nome da família é o verdadeiro NFT natural: personalíssimo, único, inalienável e duradouro. Ele cumpre de forma espontânea e superior aquilo que Hernando de Soto atribuiu à propriedade formal: dar segurança às transações e confiança às trocas, sobretudo em tempos de instabilidade.

O mistério do capital moral consiste justamente nisso: a riqueza maior de uma sociedade não está na acumulação de ativos formais, mas na continuidade da honra, da confiança e da dignidade herdadas. Nos méritos de Cristo, herdar o bom nome é receber um talento que deve ser multiplicado — não apenas para benefício econômico, mas para dar sentido à vida, preservar a ordem social e resistir ao niilismo de uma democracia corrompida.

O bom nome da família como NFT natural: moeda moral, democracia relativa e defesa da dignidade em face de autoridade ilegítimas

Introdução

Vivemos num tempo de democracia relativa, em que as instituições, muitas vezes fragilizadas por crises de legitimidade, falham em proteger a dignidade do indivíduo. Pior ainda, por vezes são as próprias autoridades — desprovidas de legitimidade moral — que atentam contra a honra de inocentes, difamando-os e enlameando seu bom nome com acusações infundadas.

Numa sociedade assim, o direito ao bom nome da família adquire peso ainda mais relevante. Ele não é apenas um direito individual, mas um patrimônio intergeracional, uma verdadeira moeda personalíssima, comparável a um token não-fungível natural (NFT). Diferente dos tokens digitais artificiais, que dependem da blockchain e da especulação de mercado, o bom nome é natural, personalíssimo, inalienável e duradouro. Ele é fundamento da confiança social e da própria ordem democrática.

1. O bom nome como moeda natural e personalíssima

O bom nome da família funciona como uma moeda moral:

  • É único e personalíssimo, não podendo ser transferido ou alienado.

  • É inalienável, herdado como missão e responsabilidade.

  • É natural, porque nasce da vida moral e da história da família, não de códigos artificiais.

  • É intergeracional, transmitido como crédito moral acumulado ao longo do tempo.

À luz de William Brough (The Natural Law of Money), podemos afirmar que o bom nome é um dinheiro natural, surgido da confiança social. Assim como o ouro foi reconhecido como meio de troca por sua raridade e valor intrínseco, o bom nome é reconhecido como crédito por sua reputação e honra.

 2. NFT Digital × NFT Natural

Aspecto NFT Digital NFT Natural – Bom Nome da Família
Origem Criado por tecnologia (blockchain) Criado pela vida moral, história e virtude
Unicidade Garante exclusividade de um item digital Personalíssimo, único e intransferível por natureza
Garantia de autenticidade Algoritmos e registros em rede História viva das gerações e reputação consolidada
Transferibilidade Pode ser comprado, vendido ou perdido em transações Inalienável: só pode ser herdado como missão e responsabilidade
Valor Especulativo, sujeito à moda e ao mercado Intrínseco, ligado à honra, confiança e dignidade
Durabilidade Depende da tecnologia e do mercado Duradouro: resiste ao tempo e gera continuidade intergeracional
Finalidade Arte, colecionismo, investimento especulativo Sustentar confiança, crédito e cooperação social
Base de funcionamento Código e blockchain Memória social e moral da família (cadeia do ser)
Dimensão espiritual Ausente, limitada ao material Presente: talento recebido para ser multiplicado nos méritos de Cristo

3. Democracia Relativa e a fragilização do bom nome

No cenário de democracia relativa, onde as instituições funcionam apenas parcialmente e sofrem influência de forças ilegítimas, o bom nome é constantemente ameaçado. Autoridades ilegítimas, usando o aparato do Estado, podem:

  • Acusar inocentes de crimes que nunca cometeram.

  • Difamar famílias inteiras por interesses políticos ou ideológicos.

  • Destruir reputações com narrativas midiáticas, sem devido processo legal.

O resultado é a quebra da moeda moral: o inocente perde crédito e confiança social, não por culpa própria, mas pela ação de agentes que deveriam garantir sua dignidade. Essa prática mina a ordem espontânea (Hayek), corrompe a justiça natural (Santo Tomás de Aquino) e destrói a base do capital moral que sustenta a sociedade.

4. O sentido existencial do bom nome

A psicologia contemporânea confirma essa visão:

  • Szondi mostra que o homem é construtor de pontes entre passado e futuro. O bom nome é uma dessas pontes. Quando é destruído por calúnia ou abuso de autoridade, o indivíduo perde o eixo da sua identidade.

  • Frankl ensina que o homem sobrevive a tudo, menos à falta de sentido. Ser injustamente difamado mina o sentido da vida, pois rouba a missão herdada dos pais.

  • Numa sociedade onde o amor é líquido e os afetos são desordenados (Bauman), a economia e a política também se tornam concupiscentes, degenerando em crematística (Aristóteles): busca pelo poder e lucro pelo lucro, sem finalidade ética ou comunitária.

5. Proposta: reconhecimento do bom nome como bem jurídico e político a ser protegido

Diante desse quadro, é urgente que o bom nome da família seja reconhecido:

  1. Juridicamente, como patrimônio imaterial transmissível, dotado de proteção reforçada contra abusos de autoridade e calúnia midiática.

  2. Economicamente, como capital social e crédito natural, a ser protegido de ataques que desestabilizam a confiança.

  3. Politicamente, como fundamento da legitimidade democrática: sem confiança e honra, não há cidadania plena, mas apenas sujeição a narrativas impostas.

  4. Espiritualmente, como talento recebido de Deus, a ser multiplicado nos méritos de Cristo, em oposição ao niilismo e à liquidez dos afetos modernos.

Conclusão

O bom nome da família é o verdadeiro NFT natural: personalíssimo, único, inalienável e duradouro. Ele é moeda moral, capital social e ponte de sentido entre gerações. Num tempo de democracia relativa, sua proteção torna-se ainda mais urgente, pois autoridades ilegítimas e narrativas difamatórias podem destruí-lo e, com ele, arruinar vidas inocentes.

Reconhecer juridicamente o bom nome como herança imaterial é resgatar a dignidade humana, restaurar a confiança social e proteger a ordem espontânea que sustenta a liberdade. Mais do que isso, é resistir ao niilismo da modernidade, reafirmando que o verdadeiro valor não está nos tokens artificiais da tecnologia, mas no token natural da honra, inscrito no coração das famílias e garantido nos méritos de Cristo.