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terça-feira, 2 de setembro de 2025

Quando uma obra entra em domínio público no Brasil: morte real e morte presumida

No Brasil, a proteção dos direitos autorais segue a regra de que uma obra permanece protegida até 70 anos após a morte do autor, contados a partir do 1º de janeiro do ano seguinte ao falecimento. Essa padronização simplifica a contagem e evita divergências sobre datas exatas.

1. Morte conhecida

Quando a data de falecimento do autor é conhecida, a contagem é direta. Por exemplo, Nelson Rodrigues faleceu em 1980. Assim:

  • O prazo de 70 anos começa a contar em 1981, o ano seguinte à morte.

  • As obras entram em domínio público em 01/01/2051, independentemente do dia do aniversário do autor.

  • Qualquer pessoa poderá, a partir dessa data, reproduzir, distribuir ou adaptar suas obras sem necessidade de autorização ou pagamento de direitos autorais.

Neste caso, minha própria idade pode servir como referência temporal: eu nasci em 1981 e os 70 anos que completarei em 2051 coincidem exatamente com o período necessário para que as obras de Nelson Rodrigues se tornem de uso público.

2. Morte desconhecida ou ausência

Existem casos em que o autor desaparece e não se tem notícia de sua morte. Nessa situação, a lei brasileira prevê mecanismos específicos:

  • O juiz pode decretar a declaração de ausência.

  • Durante a ausência, abre-se uma sucessão provisória, garantindo proteção temporária aos bens do autor.

  • A sucessão se torna definitiva a partir do décimo ano da sentença de declaração de ausência, configurando a chamada morte civil ou morte presumida.

A partir desse momento é que se inicia a contagem dos 70 anos de proteção da obra. Dessa forma, mesmo quando não há morte de fato registrada, a lei protege as obras e mantém a segurança jurídica para herdeiros e usuários.

3. Por que o 1º de janeiro é usado como referência?

O 1º de janeiro do ano seguinte à morte (ou à morte presumida) padroniza a contagem:

  • Evita debates sobre o dia exato do falecimento.

  • Permite calcular de maneira uniforme quando cada obra entra em domínio público.

  • Garante que obras de autores desaparecidos não fiquem sem proteção.

Conclusão

O sistema brasileiro de direitos autorais é cuidadoso e flexível: ele protege as obras tanto de autores cuja morte é conhecida quanto daqueles que desapareceram sem deixar registro, garantindo o direito dos herdeiros e o eventual acesso público às obras. A padronização do início da contagem no 1º de janeiro é um instrumento que simplifica o processo e assegura previsibilidade para todos os envolvidos.

Da idade de parentes como referência para contagem de prazo de obras para o domínio público: filosofia prática e planejamento editorial

No universo dos direitos autorais, a lei brasileira estabelece que uma obra entra em domínio público 70 anos após a morte do autor, contados a partir de 1º de janeiro do ano seguinte ao falecimento. Para quem deseja digitalizar, distribuir ou revender obras literárias, esse cálculo é essencial para evitar conflitos legais.

Uma abordagem prática e inovadora consiste em usar a idade de parentes como referência indireta para estimar quando determinada obra se tornará de uso livre. Esse método, que podemos chamar de referência transgeracional, transforma familiares em marcos temporais simbólicos, ajudando a organizar o planejamento editorial e a gestão de direitos de maneira consistente e previsível.

Como funciona a referência transgeracional

Quando um autor falece, é possível associar a sua data de falecimento à idade de um parente nascido antes, depois ou até mesmo no mesmo ano da morte do autor. Essa idade funciona como um marco simbólico indicando quando a obra entrará em domínio público.

Por exemplo, Olavo de Carvalho faleceu em 24 de janeiro de 2022, e minha sobrinha nasceu em 22 de abril de 2022. Pelo método da referência transgeracional, ao completar 70 anos, a idade da minha sobrinha representará o momento em que as obras de Olavo de Carvalho entrarão em domínio público. Assim, a vida de um parente se torna um instrumento de planejamento editorial, permitindo organizar a digitalização e a revenda de obras de forma segura e estruturada.

Transposição para gerações futuras

Uma característica interessante desse método é sua perpetuação: assim como você pode usar a idade de um parente anterior como referência, gerações futuras podem utilizar a sua idade para projetar a entrada de obras no domínio público. Dessa forma, a técnica se transforma em uma heurística de longo prazo, mantendo a organização e a segurança jurídica em projetos de digitalização ou empreendedorismo editorial.

Dimensão filosófica e prática

Essa prática não se limita a cálculos jurídicos ou administrativos: ela confere uma dimensão filosófica e prática à vida cotidiana. Ao transformar vidas familiares em referências para direitos autorais, você aplica na prática uma filosofia de gestão do tempo e do conhecimento, que remete à reflexão de Arthur Schopenhauer sobre a ação guiada pela vontade.

Para Schopenhauer, a vida humana encontra sentido quando organizada de forma inteligente e estratégica. Ao planejar a entrada de obras no domínio público usando a idade de parentes, a ação se torna um exercício concreto de vontade racional e organizada, unindo reflexão filosófica, planejamento de longo prazo e empreendedorismo no ramo dos livros.

Limites e considerações legais

É importante lembrar que, formalmente, a lei brasileira não reconhece a idade de parentes como critério legal para domínio público. O método funciona como uma estratégia prática e heurística, auxiliando na organização e na antecipação de projetos, mas não substitui a contagem oficial baseada na morte do autor. A decisão final de digitalização ou comercialização de uma obra deve sempre considerar os prazos legais oficiais.

Conclusão

A referência transgeracional é uma ferramenta engenhosa que combina planejamento editorial, gestão de conhecimento e filosofia prática. Ao transformar a idade de parentes em marcos simbólicos de domínio público, é possível organizar, antecipar e executar projetos de digitalização ou revenda de obras com segurança e estratégia. Mais do que um método de contagem, trata-se de um guia de ação racional, onde a vida prática, o empreendedorismo e a filosofia se encontram, permitindo que o conhecimento seja preservado e circulado de maneira estruturada, consciente e sustentável.

Sobre a condição de ser marco temporal e pescador: uma reflexão sobre domínio público e temporalidade pessoal

A vida de um indivíduo, além de seu valor intrínseco, pode ser entendida como um ponto de referência no fluxo do tempo cultural. Quando penso nos direitos autorais e na entrada de obras em domínio público, percebo que é possível estabelecer um critério pessoal que transforma a própria existência em uma medida universal de acesso ao conhecimento.

Nasci em 23 de janeiro de 1981. Para efeito de direitos autorais, estabeleço que todo autor falecido até 1980 terá suas obras em domínio público no ano em que eu completar 70 anos. No Brasil, a regra legal determina que as obras entram em domínio público no dia 01 de janeiro do ano seguinte ao marco de contagem, portanto, para este critério, seria 01/01/2051 — poucos dias antes do meu aniversário.

Esse método é mais do que um cálculo técnico: é uma forma de tornar a minha própria existência uma representação simbólica da universalidade. Ao me tornar esse marco temporal, faço de mim um filtro, uma lente através da qual a cultura do passado é organizada e liberada para todos. É uma perspectiva que une o tempo pessoal e o tempo legal, criando um ponto de interseção entre a vida de um indivíduo e a circulação da produção intelectual da humanidade.

A analogia com a pesca por arrastamento é clara: ao posicionar-me como marco temporal, permito-me “pescar” uma grande quantidade de obras simultaneamente, com mínimo esforço individual, mas com máxima abrangência. É a eficiência de um gesto simbólico que amplia o acesso ao conhecimento, sem a necessidade de uma análise caso a caso de cada obra. Cada obra que entra em domínio público é um peixe capturado nesse arrasto cultural — disponível para qualquer pessoa, transformando a produção intelectual em bem comum.

Mais profundamente, esse raciocínio revela a dimensão quase mística de nossa relação com o tempo e o conhecimento. Somos ao mesmo tempo passageiros e pontos fixos: nossas vidas passam, mas podem servir como referência para organizar o fluxo cultural e legal que nos precede. Tornar-se marco é, portanto, uma forma de participar ativamente da memória coletiva, conectando a existência individual à perpetuação da cultura e à liberdade de acesso ao saber.

Em última análise, este método de contagem não é apenas um cálculo de datas ou um artifício jurídico. É uma forma de autorrepresentação simbólica, um gesto que une vida, tempo e cultura, e que nos convida a refletir sobre como nossas próprias trajetórias podem influenciar a circulação do conhecimento humano. Como o pescador por arrastamento, posicionamos nossas vidas de forma estratégica para colher, com consciência e propósito, os frutos do passado e disponibilizá-los ao futuro.

Notas sobre um método pessoal de contagem de direitos autorais

A contagem de direitos autorais sempre foi um tema complexo, especialmente quando se deseja determinar de maneira prática se uma obra já se encontra em domínio público. A legislação brasileira estabelece que obras entram em domínio público 70 anos após a morte do autor, mas, na prática, encontrar e conferir datas de falecimento nem sempre é tarefa simples. Para lidar com isso, desenvolvi um método pessoal de contagem baseado em marcos geracionais próximos, como familiares.

O Marco de Referência: uma solução prática

Originalmente, utilizei meu pai como referência. Ele nasceu em 04/04/1951, mas, para efeitos de cálculo, adotava-se 01/01/1951 como marco inicial. A lógica é simples: obras cujos autores faleceram antes desse marco entram em domínio público mais cedo, enquanto obras de autores falecidos após a data de referência ainda estão protegidas.

Este método traz duas vantagens imediatas:

  1. Praticidade: elimina a necessidade de buscar a data exata de falecimento do autor, algo que nem sempre é facilmente acessível.

  2. Consistência: mantém uma linha temporal clara, permitindo organizar obras por gerações sem depender de informações externas.

A transição para a próxima geração

Hoje, com a ausência de meu pai, comecei a adotar a mesma metodologia usando minha sobrinha como referência. Ela nasceu em 22/04/2022, e, novamente, adotamos 01/01/2022 como marco inicial para simplificar a contagem.

A ideia permanece a mesma: obras cujos autores faleceram antes desse marco já poderiam ser consideradas em domínio público, enquanto obras de autores que faleceram depois permanecem protegidas. Assim, a metodologia mantém a consistência, mas se adapta a novas gerações, funcionando como um ciclo contínuo de referência temporal.

Por Que Funciona

O método funciona porque estabelece uma âncora temporal confiável e prática, baseada em uma vida próxima e conhecida. Ele não substitui a legislação, mas fornece um critério heurístico para organizar, estudar e catalogar obras, especialmente quando se trabalha com grandes volumes de material ou quando a precisão absoluta das datas não é crítica.

Conclusão

Este método geracional, simples, mas eficiente, mostra que é possível lidar com direitos autorais de maneira prática e organizada, sem depender de registros formais ou de complicadas pesquisas históricas. Ele combina a precisão temporal com uma abordagem pessoal e intuitiva, tornando a tarefa de gerir obras em domínio público mais ágil e acessível.

Em um mundo onde a informação é vasta e nem sempre exata, métodos assim permitem não apenas preservar o respeito à lei, mas também facilitar o acesso à cultura e ao conhecimento, garantindo que obras possam ser apreciadas e estudadas sem barreiras desnecessárias.

A banalização do divino: de “Lua de Cristal” à política contemporânea

Em 1990, a música “Lua de Cristal”, interpretada por Xuxa, tornou-se um fenômeno cultural no Brasil. O refrão “Tudo que eu quiser, o cara lá de cima vai me dar” parecia inofensivo, voltado para o universo infantil, mas revela algo mais profundo: a redução da divindade ao nível do mundano. Ao se referir a Deus como “o cara lá de cima”, a música transforma o Todo-Poderoso em um prestador de serviços pessoal, submetido à vontade de cada indivíduo.

Essa representação não é apenas coloquialidade ou irreverência juvenil. É, em termos teológicos, uma forma de blasfêmia — não no sentido de insulto explícito, mas como uma distorção do respeito devido à majestade divina. Reduzir Deus à dimensão do cotidiano e da conveniência humana é uma maneira de domesticar o sagrado, transformando-o em instrumento de desejo pessoal.

O fenômeno atravessa a cultura e chega à política. Décadas antes de “Lua de Cristal” ser regravada em memórias afetivas, líderes públicos, como Lula, adotaram um registro semelhante. Ao chamar Deus de “cara”, não há exaltação, mas um rebaixamento da divindade, aproximando-o do nível humano e fazendo dele um quase-subordinado das vontades políticas e pessoais. A situação lembra, em termos simbólicos, o gesto de Obama ao lidar com líderes estrangeiros: uma dinâmica de proximidade que, quando aplicada a Deus, se transforma em desrespeito ritualizado, pois subverte a hierarquia natural entre Criador e criatura.

O problema não é meramente semântico. Trata-se de uma inversão moral e espiritual: quando Deus é domesticado, Ele deixa de ser referência ética e transcendente e se torna mero executor das conveniências humanas. A tradição cristã alerta que esse tipo de atitude é blasfema, porque corrompe a noção de santidade e transforma o Sagrado em uma ferramenta do mundano.

Mais do que uma crítica à música ou a gestos políticos isolados, o fenômeno revela algo sobre a cultura contemporânea: há uma tendência crescente de instrumentalizar o divino. Deus é reduzido a um facilitador, a um “fornecedor” de bênçãos, em vez de ser reconhecido como Soberano e Juiz Supremo. Essa inversão não é neutra; ela modela a percepção coletiva sobre o sagrado e enfraquece a consciência moral.

Portanto, a banalização de Deus na música, na mídia ou na política não é apenas irreverência. É um sintoma de blasfêmia moderna, que exige reflexão crítica. Chamar Deus de “cara” ou tratá-lo como prestador de desejos pessoais não é inofensivo: é um deslocamento espiritual que desafia a ordem ética e hierárquica estabelecida desde os tempos bíblicos. A preservação do respeito e da reverência à divindade é, assim, não apenas uma questão de fé, mas de ordem moral e cultural.

Os segredos do poder para quem não conhece

O conceito de poder é tão central para as ciências sociais quanto o de energia é para a física. Bertrand Russell já apontava essa analogia, lembrando que nada pode ser compreendido na física sem recorrer à noção de energia. Da mesma forma, nenhuma análise social ou política se sustenta sem encarar a realidade do poder.

Mas, afinal, o que é o poder?

Antes de tudo, é preciso compreendê-lo como a capacidade de realizar uma ação deliberada, voltada para um fim específico. Não se trata de qualquer movimento, mas de uma intervenção consciente, seja para mudar uma situação, seja para preservá-la. Assim, toda ação humana pressupõe algum grau de poder — e é daí que surge a necessidade de compreender seus meios e formas.

As três formas de poder

O poder não se exerce no vazio: ele depende de meios de ação. Esses meios podem ser classificados em três grandes tipos:

  1. Poder político-militar – É o mais imediato, baseado na força, na ameaça de morte ou de dano físico. Ele age diretamente sobre o corpo e a vida.

  2. Poder econômico-financeiro – Atua oferecendo ou negando vantagens materiais. Embora poderoso, depende do primeiro: dinheiro algum intimida por si só, mas pode contratar a força de quem intimida.

  3. Poder intelectual ou psíquico – É a origem remota de todos os demais, porque consiste na capacidade de convencer, persuadir e formar programas de ação. Sem essa base, nem a riqueza nem a força se sustentam.

Em termos de velocidade, o poder militar é imediato, o econômico requer negociação, e o intelectual opera no longo prazo, lançando as sementes que depois se transformam em riqueza e em força.

O poder dos meios

A análise política exige sempre a pergunta: quais meios de ação um agente possui? Ignorar essa questão leva a interpretações superficiais, baseadas em prestígio ou aparência de força.

A história política brasileira oferece exemplos claros. Enquanto especialistas previam a derrota do Partido dos Trabalhadores em determinada eleição, a vitória era inevitável porque apenas ele possuía militância organizada, capaz de influenciar diretamente a população nas fábricas, nas ruas, nas portas das casas. Os demais partidos, baseados apenas em prestígio passado ou em propaganda difusa, careciam de meios concretos de mobilização.

Militância não é eleitorado. O eleitor vota de maneira livre, muitas vezes por motivos dispersos e individuais. Já a militância é uma massa organizada, obediente a comandos, capaz de agir de forma coordenada. Nesse sentido, quem detém militância detém poder real.

Ilusões e Realidades do Poder

Muitos confundem prestígio, títulos ou riqueza com poder efetivo. Um ex-presidente pode ser lembrado, mas isso, isoladamente, não lhe dá capacidade de ação política. Um bilionário pode concentrar fortunas, mas sem redes de influência intelectual, sem militância ou sem acesso à força, sua capacidade de agir é limitada.

O verdadeiro segredo do poder está na articulação dos meios de ação. Ele nasce na inteligência, transforma-se em influência econômica e se impõe, quando necessário, pela força. Entender essa dinâmica é compreender como sociedades se organizam, como partidos vencem eleições e como indivíduos podem ou não deixar sua marca na história.

Conclusão: 

O poder não é um conceito abstrato ou meramente simbólico. Ele é sempre ação planejada, apoiada em meios concretos. Compreender os segredos do poder significa enxergar além das aparências, distinguir entre prestígio e capacidade de ação, e perceber que toda transformação política começa, inevitavelmente, no campo intelectual — lá onde se moldam as ideias que movem dinheiro, corpos e nações. 

Bibliografia

  • Russell, Bertrand. Power: A New Social Analysis. London: Allen & Unwin, 1938.
    (Obra clássica que compara o conceito de poder nas ciências sociais ao de energia na física.)

  • Mises, Ludwig von. Human Action: A Treatise on Economics. New Haven: Yale University Press, 1949.
    (Fundamenta a praxeologia, a filosofia da ação, base para compreender o poder como exercício deliberado.)

  • Foucault, Michel. Microfísica do Poder. Rio de Janeiro: Graal, 1979.
    (Apesar das críticas na transcrição, sua visão de poder como onipresente na vida social é uma referência incontornável.)

  • Weber, Max. Economia e Sociedade. Brasília: Editora UnB, 1999 [1922].
    (Define poder como a probabilidade de impor a própria vontade em uma relação social, mesmo contra resistências.)

  • Arendt, Hannah. Sobre a Violência. Rio de Janeiro: Relume-Dumará, 1994 [1970].
    (Distingue poder, força, autoridade e violência, ressaltando o caráter coletivo do poder político.)

  • Machiavelli, Niccolò. O Príncipe. São Paulo: Martins Fontes, 2001 [1532].
    (Clássico sobre a conquista e manutenção do poder político, ainda fundamental para análises contemporâneas.)

  • Pareto, Vilfredo. As Elites e a Sociedade. Rio de Janeiro: Zahar, 1984.
    (Explica como as elites se renovam e mantém o poder através de diferentes meios de ação.)

  • Olavo de Carvalho. O Imbecil Coletivo. Rio de Janeiro: Record, 1996.
    (Obra em que o autor – de quem a transcrição provavelmente é uma aula – discute o papel da intelectualidade na formação do poder cultural e político no Brasil.) 

segunda-feira, 1 de setembro de 2025

O projeto de lei de Júlia Zanatta e a proposta de extinção do imposto de renda

No dia 28 de agosto de 2025, a deputada federal Júlia Zanatta (PL-SC) apresentou o Projeto de Lei nº 4329/2025, que propõe a extinção completa do Imposto de Renda (IR) no Brasil, tanto para pessoas físicas quanto para jurídicas. A medida, ousada e de alto impacto, reacendeu o debate sobre a carga tributária nacional e os rumos da política fiscal brasileira.

O que propõe o projeto

O texto do PL é direto: revogar todas as legislações que regulam a cobrança do IR, estipulando um prazo máximo de 180 dias após a promulgação da lei para que o imposto deixe de existir. Em outras palavras, em pouco mais de seis meses após eventual aprovação, um dos pilares da arrecadação brasileira desapareceria.

A justificativa da deputada se baseia em três pontos centrais:

  1. O Imposto de Renda, criado em diversos países como medida temporária para financiar guerras, teria perdido sua razão de ser.

  2. A cobrança atual desestimula a produção, a formalidade das relações econômicas e a liberdade financeira dos cidadãos.

  3. A manutenção desse tributo compromete a competitividade do país, ao reduzir a capacidade de investimento e inovação do setor produtivo.

Importância do IR na arrecadação

Segundo dados da Receita Federal, o Imposto de Renda representou cerca de 27% da arrecadação federal em 2022, sendo, portanto, uma das principais fontes de recursos da União. A receita obtida com o IR alimenta fundos constitucionais que sustentam áreas como saúde, educação, segurança pública e infraestrutura. Além disso, parte significativa do IR é repassada a estados e municípios, garantindo o equilíbrio federativo.

Diante disso, a extinção do IR implicaria na necessidade de reorganizar completamente a estrutura fiscal do país, seja substituindo essa receita por outros tributos, seja reduzindo de forma drástica o tamanho do Estado.

A polêmica política

O projeto de Júlia Zanatta surge em contraste com outras propostas em discussão no Congresso e no Executivo. Enquanto a parlamentar defende o fim absoluto do IR, o governo federal tem discutido apenas elevar a faixa de isenção do IRPF para até R$ 5 mil mensais, buscando aliviar o peso tributário da classe média sem abrir mão da arrecadação.

O tema coloca em choque duas visões de país:

  • Visão liberal radical, que enxerga o imposto como entrave à liberdade e à prosperidade, e defende sua eliminação total.

  • Visão reformista, que reconhece os problemas da carga tributária, mas propõe ajustes graduais dentro do sistema existente.

Impactos possíveis

Caso aprovado, o projeto teria repercussões imediatas:

  • No orçamento da União: um rombo bilionário exigiria cortes profundos ou a criação de novos tributos compensatórios.

  • Nos estados e municípios: o fim do repasse do IR afetaria diretamente o financiamento de políticas públicas locais.

  • Na economia: setores produtivos poderiam ser estimulados pelo alívio tributário, mas a incerteza sobre o modelo substituto poderia gerar instabilidade no curto prazo.

Considerações finais

O PL 4329/2025 da deputada Júlia Zanatta coloca na mesa uma discussão que até então parecia intocável: seria possível manter um Estado moderno sem Imposto de Renda? A resposta dependerá do equilíbrio entre os princípios de liberdade econômica e as necessidades concretas de financiamento público.

Mais do que uma proposta legislativa, o projeto funciona como um provocador de debates. Ele obriga sociedade, governo e parlamento a refletirem sobre até que ponto o modelo tributário atual é sustentável e até onde é possível avançar em direção a uma verdadeira reforma fiscal que combine justiça tributária, incentivo à produção e responsabilidade orçamentária.