Pesquisar este blog

sábado, 22 de março de 2025

Uma Conversa Imaginária entre Richard Cantillon e Thorstein Veblen

Cena: Um salão de estudos atemporal, onde Richard Cantillon e Thorstein Veblen se encontram para discutir as semelhanças e diferenças entre a economia da monarquia francesa e a financeirização contemporânea.

Cantillon: Caro Veblen, observo que a economia do seu tempo exibe características semelhantes às da monarquia francesa que analisei no meu Ensaio sobre a Natureza do Comércio em Geral. O controle da riqueza por uma elite que não produz é um padrão recorrente na história econômica.

Veblen: Concordo, Cantillon. Em minha obra A Teoria da Classe Ociosa, demonstrei como as elites modernas se afastaram da produção real, dedicando-se ao consumo conspícuo e à especulação financeira. A diferença, no entanto, está na forma como essa classe se legitima. No seu tempo, a nobreza justificava seu privilégio por meio da tradição e da graça divina; hoje, a elite financeira esconde sua ociosidade sob o manto da tecnocracia e da suposta eficiência dos mercados.

Cantillon: De fato, na monarquia francesa, os banqueiros e cortesãos acumulavam riquezas através da proximidade com o poder, manipulando moedas e concessões reais. Mas vejo que, em sua época, a economia se tornou ainda mais artificial: a financeirização permite que o capital circule sem jamais se converter em algo produtivo. No meu tempo, pelo menos, a terra e a produção agrícola ainda eram a base da economia.

Veblen: Exato. Hoje, as grandes corporações e bancos não se preocupam em criar valor real. Em vez disso, lucram através de um sistema de crédito inflado e de investimentos especulativos que garantem retornos sem qualquer envolvimento na produção. O capital se tornou um fim em si mesmo, e a classe que o controla se considera merecedora de sua posição, mesmo sem contribuir para a economia real.

Cantillon: Então podemos dizer que a classe financeira contemporânea é ainda mais isolada da realidade produtiva do que a aristocracia francesa?

Veblen: Sim, pois a classe ociosa de hoje não depende apenas de privilégios herdados, mas de um sistema financeiro que distorce a alocação de recursos e perpetua a desigualdade. O mais irônico é que, enquanto a nobreza do seu tempo ostentava sua riqueza de forma explícita, a elite financeira moderna finge uma modéstia pragmática, embora continue acumulando e concentrando poder.

Cantillon: Então, se entendi bem, seu argumento é que a aristocracia da financeirização é mais eficiente em ocultar sua inutilidade do que a monarquia francesa?

Veblen: Perfeitamente. Em minha análise, a classe ociosa moderna se disfarça de meritocrática, mas continua a praticar a mesma apropriação de riqueza sem produzir nada de real valor. O mecanismo mudou, mas a essência permaneceu a mesma: um pequeno grupo mantém o controle dos recursos, enquanto a maioria trabalha sem acesso real ao poder econômico.

Cantillon: Isso é uma perversão ainda maior do sistema! Pois no meu tempo, pelo menos, as distorções eram visíveis: os excessos da corte de Luís XV eram evidentes. Hoje, os artifícios financeiros criam uma ilusão de progresso econômico enquanto, na realidade, a riqueza se concentra de maneira mais extrema.

Veblen: E, ironicamente, o que chamamos de crise econômica não passa de um reajuste momentâneo dentro desse ciclo de exploração. O sistema financeiro moderno perpetua ciclos de crescimento e colapso que mantêm as elites no controle, enquanto os trabalhadores suportam os custos das falhas do mercado.

Cantillon: Isso me faz pensar: se a aristocracia francesa foi finalmente desmantelada, será que a aristocracia financeira moderna enfrentará um destino semelhante?

Veblen: Isso dependerá da capacidade das massas de enxergar a ilusão que lhes vendem. No entanto, a classe ociosa moderna aprendeu a se proteger melhor do que a sua nobreza. Em vez de confiar apenas em títulos e privilégios óbvios, ela se esconde por trás de algoritmos, bancos centrais e fundos de investimento globais.

Cantillon: Uma monarquia sem coroa, mas com um poder ainda mais sutil e absoluto. Fascinante e terrível ao mesmo tempo.

Veblen: Exatamente. E enquanto o ciclo não for rompido, a financeirização continuará sendo o meio pelo qual a classe ociosa perpetua sua dominação, sob o pretexto de eficiência econômica.

Cantillon: Então, parece que, apesar de separados por séculos, nossas análises convergem: a elite sempre encontrará maneiras de se sustentar à custa da maioria, a menos que surja um rompimento genuíno no sistema.

Veblen: E este rompimento será tanto econômico quanto cultural. Até que as pessoas percebam que a produtividade real é eclipsada por artifícios financeiros, a classe ociosa seguirá reinando—não mais nos salões dourados de Versalhes, mas nas torres de vidro de Wall Street.

Nenhum comentário:

Postar um comentário