A história das nações ibéricas, especialmente Portugal e Espanha, é marcada por uma profunda conexão espiritual e política, que remonta ao período das grandes navegações e da expansão do cristianismo para terras distantes. A ideia de uma ordem mundial, estabelecida por Cristo, ganha um caráter notável quando observamos a atuação de Portugal e Espanha durante a União das Coroas Ibéricas (1580-1640). Nesse período, esses dois reinos, unidos sob a mesma coroa, não apenas expandiram seus domínios, mas também promoveram uma "globalização cristã", com a evangelização e o trabalho missionário como seus pilares centrais.
O Milagre de Ourique e o Mito Fundador
O Milagre de Ourique, ocorrido em 1139, quando D. Afonso Henriques, primeiro rei de Portugal, afirmou ter recebido a bênção divina para derrotar os muçulmanos, é considerado um dos marcos fundacionais do Reino de Portugal. Esse evento é interpretado, por muitos estudiosos, como o momento em que o destino de Portugal foi selado não apenas em termos territoriais, mas espirituais. O milagre, em muitos sentidos, serve como um mito fundador que conectaria o povo português a uma missão divina, cujo objetivo maior seria a propagação do cristianismo para além das fronteiras do mundo conhecido.
Esse mito fundador se conecta diretamente à ideia de um projeto global cristão, que, no contexto da União das Coroas Ibéricas, assume uma expressão geopolítica sem precedentes. A integração das coroas de Portugal e Espanha sob Filipe II representou a união de dois impérios cuja missão comum era expandir a cristandade, não apenas na Europa, mas também nas Américas, na África e na Ásia. A unificação política e espiritual dessas duas potências pode ser entendida como um movimento para consolidar uma ordem mundial fundamentada na fé cristã, um projeto de globalização cristã promovido pela Espanha através do dólar espanhol, uma das moedas mais importantes na época.
O Papel do Dólar Espanhol na Globalização Cristã
O dólar espanhol, que circulava amplamente em diversas partes do mundo durante os séculos XVI e XVII, foi um instrumento essencial para financiar a expansão do império espanhol e, por conseguinte, da missão cristã. Este meio financeiro não era apenas um recurso material, mas um símbolo da expansão da ordem cristã para terras distantes, facilitando o comércio e a evangelização. A prata das minas da América, essencial para a cunhagem dessa moeda, permitiu que o império espanhol financiasse suas campanhas militares, a construção de infraestrutura e, sobretudo, a expansão das missões religiosas.
O fato de que a evangelização foi apoiada por um fluxo contínuo de recursos financeiros destaca a simbiose entre a fé e a economia na formação da primeira globalização mundial. A prata e o dólar espanhol, portanto, desempenham um papel fundamental na consolidação de uma ordem mundial cristã, onde o estudo e o trabalho realizados pelos missionários e exploradores eram vistos como formas de santificação, conforme a missão que Cristo deu aos portugueses e espanhóis de levar a fé a todos os cantos do mundo.
A União das Coroas Ibéricas como Unidade Espiritual e Política
A União das Coroas Ibéricas representou não apenas uma fusão política entre Portugal e Espanha, mas também uma convergência de seus projetos espirituais. O império ibérico, durante este período, se tornou um bastião da cristandade, com os dois reinos compartilhando uma missão comum: a propagação do cristianismo pelo mundo. A unificação das coroas, portanto, pode ser vista como uma tentativa de consolidar a cristandade não apenas dentro das fronteiras europeias, mas também nas colônias que surgiam no Novo Mundo, na África e na Ásia.
A ideia de que o iberismo, enquanto movimento político e espiritual, tem uma legitimidade histórica é, portanto, fundada na visão de que essa união representava uma unidade não apenas de governantes, mas de um propósito comum que transcende as divisões políticas e culturais da época. O iberismo não era apenas um projeto imperial, mas uma busca por uma ordem cristã global, onde a unidade de propósito, fundando-se nos méritos de Cristo, poderia proporcionar uma base sólida para a construção de um mundo mais justo e alinhado aos princípios da fé cristã.
O Iberismo à Luz do Curso de Integração Pessoal de Mário Ferreira dos Santos
O Curso de Integração Pessoal de Mário Ferreira dos Santos propõe uma reflexão profunda sobre a evolução do homem e seu lugar no cosmos, levando em consideração os aspectos históricos, espirituais e filosóficos que moldam a experiência humana. A proposta de integração pessoal, no contexto desse curso, reflete a ideia de que o ser humano não deve se limitar à busca de interesses egoístas ou utilitaristas, mas deve buscar a harmonia com a ordem universal, que está fundamentada nos princípios da verdade, do amor e do serviço ao bem comum.
À luz dessa filosofia, o iberismo pode ser interpretado como um movimento legítimo, especialmente se compreendido dentro do conceito de integração pessoal. Para Mário Ferreira dos Santos, a construção de um projeto de unidade — seja ele pessoal ou político — não pode ser baseada apenas na força ou na conveniência, mas na busca pela verdade e pelo bem comum, que se realiza plenamente quando o ser humano se alinha aos princípios espirituais que fundamentam sua existência. Nesse sentido, a união das Coroas Ibéricas, com seu foco na propagação do cristianismo e na construção de uma ordem mundial cristã, pode ser vista como um exemplo de tentativa de integração pessoal e coletiva em prol de um bem maior.
O ibérico, enquanto movimento de união espiritual e política, se alinha com os conceitos de integração pessoal propostos por Mário Ferreira dos Santos, uma vez que buscava, por meio da unificação dos reinos ibéricos, uma harmonia de propósito que transcende interesses nacionais ou pessoais. Esse tipo de integração é precisamente o que o autor sugere como necessário para uma verdadeira evolução espiritual, que se reflete na forma como os povos e as nações interagem com os valores mais elevados e universais.
O Iberismo como Movimento Legítimo
Considerando o contexto histórico da União das Coroas Ibéricas, é possível argumentar que o iberismo possui uma legitimidade em sua base ideológica, especialmente quando se observa o caráter de unidade espiritual e política que foi buscado durante esse período. A missão cristã, que guiou os governantes ibéricos, pode ser entendida como um reflexo de uma visão transcendente de globalização, onde as fronteiras físicas e políticas não se sobrepõem ao propósito divino de unir os povos em Cristo.
Essa perspectiva traz à tona a ideia de que o iberismo, em sua essência, pode ser buscado como um movimento legítimo, pois não se trata apenas de uma união política, mas de uma busca por uma ordem mundial cristã fundada no amor e no serviço a Cristo. A ideia de que o império ibérico, enquanto uma unidade, não deve ser vista apenas sob a ótica das disputas políticas e territoriais, mas também como uma expressão da missão cristã global, oferece uma nova interpretação para os movimentos de integração territorial e cultural dos séculos passados.
Conclusão: A Relevância da História para o Mundo Contemporâneo
A história da União das Coroas Ibéricas e da expansão cristã global nos oferece lições valiosas para o mundo contemporâneo. Ao refletirmos sobre o papel central da fé cristã na formação de uma ordem mundial, é possível perceber como a política e a história podem ser entrelaçadas de maneira a servir a um propósito mais elevado: o serviço a Cristo, em terras distantes, por Cristo e para Cristo. Esse modelo de globalização, que não se baseia apenas em interesses econômicos ou políticos, mas em valores espirituais, é um convite para que a humanidade busque uma unidade verdadeira, fundada na justiça, no amor e na verdade divina.
Dessa forma, o iberismo, entendido como um movimento legítimo baseado na unidade histórica e espiritual, pode ser revisitado como uma fonte de inspiração para a construção de um mundo mais justo e alinhado com os princípios da fé cristã.
Bibliografia
Mário Ferreira dos Santos. Curso de Integração Pessoal. São Paulo: Livraria Martins Fontes, 2004.
José Enrique Ruiz-Domènec. A História das Duas Coroas. Lisboa: Edições 70, 2007.
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Afonso Costa. O Milagre de Ourique: A Fundamento de uma Nação. Lisboa: Academia Portuguesa de História, 2001.
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