A Inglaterra é frequentemente definida, na geopolítica mundial, como um poder marítimo. Sua localização insular no Atlântico Norte, aliada à tradição naval que se consolidou desde o século XVI, reforça sua identidade de potência voltada para o comércio e a projeção no mar. Entretanto, quando analisada sob a ótica da geopolítica continental, a Inglaterra pode ser entendida como um subcontinente em miniatura, funcionando como um verdadeiro laboratório de experiências geopolíticas continentais.
Essa perspectiva encontra respaldo na teoria do Heartland de Halford Mackinder, que aponta a importância estratégica do controle de territórios centrais para o domínio global. Embora a Inglaterra não esteja situada no Heartland eurasiático, ela demonstrou, historicamente, capacidade de influenciar diretamente dinâmicas continentais por meio de sua economia industrial, de sua diplomacia e de sua capacidade de projetar poder de forma indireta. O desenvolvimento industrial, tanto na Primeira Revolução Industrial quanto na Segunda Revolução Industrial, comprova essa característica híbrida: um país insular capaz de implementar experiências sociais, econômicas e tecnológicas que em outros contextos exigiriam um território continental maior.
Nesse sentido, a Inglaterra possui duas naturezas geopolíticas. Por um lado, é isolada, mas não completamente — sua insularidade oferece segurança natural, mas não limita suas influências externas. Por outro, transcende a categoria geográfica de ilha. Como observou Frederick Jackson Turner, em sua análise do frontier norte-americano, as fronteiras — e mesmo a ausência delas — são fatores cruciais na formação de caráter nacional e na inovação institucional. Na Inglaterra, o frontier não é físico, mas conceitual: trata-se da capacidade de superar sua condição insular, ampliando horizontes geopolíticos e experimentando dinâmicas continentais em escala reduzida.
O caráter híbrido da Inglaterra é evidenciado em vários planos:
-
Industrial e econômico: cidades como Manchester e Birmingham funcionaram como laboratórios de inovação tecnológica e organizacional, antecipando padrões que mais tarde se espalhariam por grandes territórios continentais.
-
Estratégico e militar: embora a defesa natural das ilhas proporcionasse segurança, a Inglaterra manteve forte presença em continentes vizinhos e em colônias, influenciando conflitos europeus sem depender de controle territorial contínuo.
-
Cultural e científico: a produção cultural e intelectual inglesa, de Shakespeare a Newton, mostra como um espaço relativamente pequeno pode irradiar influência global, modelo que se replicaria em estratégias geopolíticas e comerciais.
Dessa forma, a Inglaterra representa um espaço híbrido, onde o poder marítimo e o potencial continental se interseccionam. Esse equilíbrio permitiu que o país experimentasse fenômenos típicos de grandes continentes, mas em um território limitado, consolidando sua posição como um laboratório singular da história geopolítica mundial.
Bibliografia sugerida:
-
Mackinder, Halford. The Geographical Pivot of History. London: Royal Geographical Society, 1904.
-
Turner, Frederick Jackson. The Frontier in American History. New York: Holt, 1920.
-
Landes, David S. The Wealth and Poverty of Nations: Why Some Are So Rich and Some So Poor. New York: W.W. Norton, 1998.
-
Hobsbawm, Eric. The Age of Revolution: Europe 1789–1848. London: Weidenfeld & Nicolson, 1962.
-
Parker, Geoffrey. The Military Revolution: Military Innovation and the Rise of the West, 1500–1800. Cambridge: Cambridge University Press, 1996.