1) No Egito Antigo, o sistema de escrita hieroglífico era dividido em duas vertentes: o sistema hierático, que era versado em assuntos mais elevados - já que os sacerdotes, os escribas e os guerreiros constituíam a classe mais alta do país -, enquanto o sistema demótico reunia todo o conhecimento acumulado pelo povo, a base da pirâmide, dividido em várias classes profissionais, conhecimento esse essencialmente prático.
2) Como conhecimento é poder, o conhecimento fundado nas classes mais altas acabaria formando um conhecimento de tradição hierárquica, a ponto de formar os costumes administrativos do império egípcio. Esse conhecimento foi organizado em códices e armazenados na biblioteca de Alexandria, a ponto de compor uma tradição hermética. Já os conhecimentos de ordem popular, esses serviram de base para os avanços científicos da Antigüididade. Eram conhecimentos de cunho democrático.
3) Quando a base tende a imitar as virtudes dos membros da sociedade que se encontram no topo da pirâmide, o conhecimento demótico tende a ficar tão elevado quanto o sistema hierático que lhe influenciou e mais prático por ser mais simples. Como as coisas mais belas estão naquilo que é simples e humilde, não foi à toa que a língua copta adotou um versão demótica da escrita grega, imitando a estrutura do Egito Antigo.
4.1) É por conta de haver um sistema hierático e um sistema demótico de escrita que o direito em Roma foi dividido em Direito Público e em Direito Privado. Com a implantação da lei canuléia, essas duas tradições de conhecimento puderam ser juntadas numa mesma família, formando uma nova tradição de saberes. E aí surge uma demarquia, o início do processo de inversão do sentido da pirâmide, apontando para uma soberania popular.
4.2) Para que a demarquia ocorra, é preciso que a base tenha uma longa tradição em imitar uma elite virtuosa. Uma vez que essa elite entre em degeneração, os membros do povo, os mais virtuosos, poderão tomar o seu lugar por meio do mérito, reoxigenando a civilização com novos saberes fundados na virtude.
José Octavio Dettmann
Rio de Janeiro, 21 de janeiro de 2021 (data da postagem original).
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