Moderador: Bem-vindos novamente ao nosso debate. Hoje, juntamos ao diálogo Stan van Hooft, filósofo conhecido por seu trabalho sobre ética e cosmopolitismo, para enriquecer a discussão entre Danilo Zolo e Stephen Toulmin sobre Cosmópolis. Vamos começar com uma breve provocação: é possível conciliar o ideal cosmopolita com a realidade das desigualdades globais? Toulmin, pode começar.
Stephen Toulmin: Obrigado. Como mencionei anteriormente, em Cosmópolis: The Hidden Agenda of Modernity, critiquei a tendência moderna de buscar sistemas universais que ignoram as particularidades humanas. Proponho um cosmopolitismo baseado em uma razão prática, que valorize contextos locais e diferenças culturais. Não defendo uniformidade, mas um diálogo global que enfrente problemas comuns, como a crise ambiental e as desigualdades, sem abandonar a diversidade.
Danilo Zolo: Toulmin, aprecio sua ênfase na diversidade, mas continuo cético quanto à sua visão de um diálogo global. Em minha perspectiva, apresentada em Cosmopolis: Prospects for World Government, os projetos cosmopolitas frequentemente são dominados por potências hegemônicas e servem mais para consolidar o poder do que para promover a justiça. Mesmo o diálogo que você propõe pode ser uma forma de imposição, pois os termos desse diálogo raramente são definidos de maneira equitativa. Prefiro uma abordagem pluralista radical, que reconheça que muitos conflitos e diferenças são irreconciliáveis.
Stan van Hooft: Ambos levantam questões importantes, mas vejo o cosmopolitismo como uma ética, mais do que um projeto político ou uma imposição universalista. Em meu trabalho, defendo que ser cosmopolita é reconhecer a dignidade de todas as pessoas, independentemente de fronteiras ou culturas. Isso não significa eliminar diferenças ou forçar consensos, mas cultivar uma atitude de abertura e responsabilidade global. Sim, o poder pode distorcer os ideais cosmopolitas, como Zolo argumenta, mas isso não deve nos levar ao ceticismo absoluto. A interconexão global é uma realidade; o desafio é torná-la mais ética.
Danilo Zolo: Hooft, admiro sua ênfase na ética, mas acho sua abordagem excessivamente otimista. O problema não está apenas nas distorções do poder, mas na própria ideia de interconexão global como algo inerentemente positivo. Para muitos no Sul Global, essa interconexão é vivida como exploração econômica e dominação cultural. Um cosmopolitismo ético deve começar reconhecendo essas assimetrias e permitindo resistência, não apenas diálogo.
Stephen Toulmin: Concordo com Hooft que a ética cosmopolita é essencial, mas compartilho parte da crítica de Zolo. Não acredito que o diálogo global deva ser imposto, mas também não podemos abandonar a ideia de colaboração. A crise climática, por exemplo, é um problema que transcende fronteiras e exige ação coletiva. O cosmopolitismo que defendo busca soluções práticas e contextuais para questões universais, sem ignorar os desequilíbrios de poder.
Stan van Hooft: Zolo, seu ponto sobre as assimetrias é fundamental. Contudo, não acredito que o reconhecimento dessas desigualdades deva nos levar a rejeitar o cosmopolitismo. Pelo contrário, é exatamente por causa dessas desigualdades que precisamos de um compromisso ético global. Concordo que resistências locais são importantes, mas elas também precisam de solidariedade global. O cosmopolitismo que proponho não é um “projeto universalista” no estilo cartesiano criticado por Toulmin, mas uma ética que respeita as diferenças enquanto promove a cooperação.
Danilo Zolo: Hooft, sua visão é generosa, mas temo que seja ingênua. A solidariedade global, por mais bem-intencionada que seja, frequentemente esconde dinâmicas de poder desiguais. Mesmo projetos bem-intencionados podem reforçar desigualdades estruturais. É mais prudente adotar um realismo político que aceite a fragmentação e a pluralidade como dados da condição humana.
Stephen Toulmin: Talvez possamos encontrar um ponto de convergência aqui. Ambos apontam que o poder pode distorcer o cosmopolitismo. A solução, penso, é um pragmatismo ético: não buscar soluções perfeitas ou universais, mas aproximar as partes interessadas em torno de problemas concretos. Um cosmopolitismo mais humilde, que aprenda com a história e reconheça suas limitações, pode evitar o autoritarismo que Zolo teme.
Stan van Hooft: Concordo, Toulmin. Um cosmopolitismo pragmático e ético pode ser a base para enfrentar os desafios globais. Ao mesmo tempo, reconheço a advertência de Zolo: precisamos ser vigilantes quanto às formas como poder e privilégio moldam nossas iniciativas. Mas acredito que um cosmopolitismo ético pode ser transformador, desde que se baseie no respeito e na responsabilidade compartilhada.
Moderador: Obrigado a todos. Este debate nos deixa com uma reflexão profunda: o cosmopolitismo, seja como projeto ético, político ou prático, enfrenta desafios significativos em um mundo marcado por desigualdades. No entanto, a busca por equilíbrio entre o global e o local, o universal e o particular, permanece uma questão central para nossa época.
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