Roberto Santos: Se a pessoa jurídica ou corporativa é o meio pelo qual a gnose mística ou conservantista logrou criar uma pessoa fictícia perene, o transumanismo, então o transumanismo é o meio pelo qual a gnose científica ou progressista pretende criar uma pessoa humana perene.
Thomé Sabbag Neto: Qual é a relação entre pessoas jurídicas e gnose? Não alcancei o sentido disso.
Roberto Santos: A pessoa jurídica é uma ficção que surge de uma dialética, tal como as pessoas divinas surgem de uma dialética na explicação à Trindade dada por Santo Agostinho. Essa explicação é essencialmente neoplatônica - por isso mesmo, gnóstica.
Thomé Sabbag Neto: Mas a alternativa é não haver pessoas jurídicas?
Roberto Santos: A alternativa é adquirir uma cosmovisão em que as pessoas sejam transcendentes à dialética. O que surgirá daí não dá para saber, pois ainda não foi tentado - pelo menos, na era cristã.
Thomé Sabbag Neto: Mas que problemas há nas pessoas jurídicas?
Roberto Santos: Ela eclipsa a noção de pessoa natural, a ponto de tornar-se uma pessoa perene. Se o homem é pecador e é uma pessoa que causa males, então pessoas perenes causam males perenes, permanentes.
Thomé Sabbag Neto: A igreja tem personalidade jurídica, não?
Adriano Dal Molin: Imagino que o Roberto não deve estar usando o termo "pessoa jurídica" na acepção do direito comercial.Talvez ele esteja mais mais próximo da idéia de "ficção jurídica" do que da "personalidade jurídica".
Roberto Santos: Exatamente
Thomé Sabbag Neto: A igreja católica é o corpo de Cristo. Não é isso?
Roberto Santos: Corpo não é pessoa.
Kevin Powers: A Igreja é um ente místico; sua personalidade não fica no mesmo patamar das pessoas jurídicas seculares. A maior prova disso é que o Estado, tomado como se fosse religião, poderia ser o ente perene anti-Igreja, causando males perenes, em nome de uma autodeclarada infalibilidade, quando ministros do naipe de um Ari Pargendler, do STJ, declaram que uma lei não tem termos inúteis.
Thomé Sabbag Neto: As outras pessoas jurídicas, por seu caráter ficcional-jurídico, também somente o são para o Estado.
Athos Barbosa Lima: Essa ficção da pessoa jurídica, Roberto, parece-me vir do fato de que apenas uma pessoa pode ser responsabilizada.
Roberto Santos: Por isso que a Igreja não é uma pessoa verdadeira, mas um corpo, embora tenha se tornado uma pessoa, uma ONG, uma pessoa de Direito Privado para todos os efeitos de direito, o que é uma verdadeira perversão relativista, pois iguala a Igreja Católica às demais "igrejas" heréticas, ou mesmo cismáticas.
Athos Barbosa Lima: Dito de outra maneira: somente uma pessoa pode ser sujeito de direitos e deveres - daí a ficção da "pessoa" jurídica - e em tempo: a Igreja é uma realidade sobrenatural, antes de tudo. Essa "personalidade jurídica", salvo engano, vem só depois, bem depois dela, de fato, existir
Kevin Powers: Exatamente. A verdadeira natureza é a da alma, que é de ordem sobrenatural, espiritual.
Roberto Santos: Atenção, pessoal. Não confundam pessoa com alma. Eu 'sou' uma pessoa, mas 'tenho' uma alma. Alma é a operação da natureza.
Athos Barbosa Lima: Acho não estou confundindo, pois já tinha refletido sobre isso quando meditei sobre o Estado - que é a pessoa jurídica por excelência, que é uma ficção jurídica, embora a personalidade seja precondição para ser sujeito de direitos e deveres, daí a questão a "personalidade jurídica". Afinal, ninguém vê o Estado andando no meio da rua: "olha, lá vai o Estado", senão por aquela figura de linguagem que agora esqueci o nome (risos).
Kevin Powers: Trata-se de metonímia, Athos Barbosa Lima. Acho ainda que o Estado - ou "pessoa jurídica" enquanto leviatã - é dado a nascer como uma "materialização" coletiva dos pecados da nação, como fenômeno espiritual. O Estado se torna análogo à pessoa a partir de suas leis, donde o Poder Executivo tira sua ação. Então a "personalidade" do Estado seria de seus tipos legais. A maior prova disso é que Estado islâmico tem uma "personalidade" diferente da ocidental.
Athos Barbosa Lima: Mas espere um minuto, Kevin. Pelo que entendi o Roberto falou, ao menos em algum momento, sobre a questão da personalidade jurídica, que de fato é outra coisa, que é diferente da personalidade em sentido estrito, apesar do nome. Trata-se de uma ficção jurídica tão-somente, de modo a conferir essa qualidade de sujeito titular de direitos e deveres para além dos indivíduos que efetivamente integram tal instituição, de modo a perdurarem no tempo, já que as pessoas físicas são sucedidas por outras com o passar do tempo. Isso tem a ver com relaõoes jurídicas, com obrigações de todo os tipo que, se não cumpridas, levam à responsabilização patrimonial. Se isso tem uma inspiração gnóstica, isto me parece bastante plausível. Esta tese precisaria ser um pouco mais aprofundada.
Athos Barbosa Lima: Kevin, quando você diz que " o estado islâmico tem uma "personalidade" diferente do ocidental", aí já mudou o sentido aí de "personalidade" , como se dissesse que "o fulano tem uma personalidade diferente da de seu irmão, beltrano". Eis a pegadinha
Athos Barbosa Lima que tal se respondêssemos primeiro a pergunta: a qual das categorias pertence a "personalidade jurídica"? E antes ainda: a qual das categorias pertence a "personalidade" tout court ? Acho que tem que começar por aí.
Kevin Powers: Athos, eu estava seguindo o seu comentário: "a personalidade é precondição para ser sujeito de direitos e deveres", considerando que cada ser humano tenha predisposições pessoais diferentes que condicionam seus direitos e deveres. Por exemplo, se eu sou deficiente físico tenho direitos e deveres diferentes, ou se sou advogado é porque minha personalidade se inclina a isso e da forma a meus direitos e deveres e assim por diante. Me refiro a essa distinção apenas por questão formal para colocar o que diz seu comentário. Estava falando em termos de abstração, mesmo.
Roberto Santos:
1) Parece que o pesoal está com problemas para entender a questão da pessoa jurídica ou corporativa de que estou a fala. Vamos a um exemplo histórico concreto:
2) Quando os Templários surgem, eles constituem uma ordem que faz voto de pobreza; nenhum dos seus membros deveria enriquecer e sua função seria a de defender os cristãos dos muçulmanos e, eventualmente, combater alguma heresia.
2) Acontece que, com o tempo, os Templários acabam se tornando os primeiros banqueiros do mundo ocidental, e - junto com isso, e por força disso - também acabam se tornando uma espécie de serviço de inteligência do Vaticano. Os Templários se tornaram a ordem mais rica e poderosa da Idade Média, e, a reboque, veio a corrupção, que levou o Papa Clemente V a extingui-la.
3) Os Templários atentaram contra o voto de pobreza? Não, pois individualmente falando eles não eram ricos. Quem se enriqueceu foi a Ordem em si, como pessoa jurídica ou corporativa, já que esta não estava sob a obrigação do voto de pobreza, de forma que é aí que temos o primeiro exemplo histórico de uma pessoa corporativa em quem é lançada toda a responsabilidade por atos históricos, sem que os 'indivíduos' que a compõem possam ser responsabilizados.
4.1) A pessoa corporativa de que falo tem menos a ver com uma concepção jurídica propriamente dita do que com uma certa concepção metafísica da personalidade. Nesse sentido, portanto, a máfia, que não é uma pessoa jurídica legitimamente reconhecida pelo Estado, é igualmente uma pessoa corporativa.
4.2) O ponto fulcral aqui é a idéia de que um grupo possa constituir uma personalidade corporativa, independentemente do reconhecimento estatal. A idéia de que uma pessoa possa emergir da dialética grupal é gnóstica por excelência, pois é um vírus por meio do qual o mundo ocidental foi infectado.
5.1) São João Crisóstomo dizia que a morte existe por uma única razão: Para que o mal não se perpetue no mundo. Um Hitler ou Stálin perenes significariam a perenidade insustentável do mal no mundo. Eis a natureza do Estado tomado como se fosse religião.
5.2.1) Acontece, porém, que a agenda gnóstica conseguiu dar um jeito nesse problema com a criação da pessoa jurídica ou corporativa.
5.2.2) A cosmovisão ocidental, que advém de uma cosmologia gnóstica, contaminou todo o espectro político. Não pense você que, por estar contra o Estado, que é uma pessoa jurídica, você está lutando contra a gnose, pois quem está contra o Estado em geral está a favor das corporações capitalistas, as quais, por sua vez, são também pessoas jurídicas. E o que estamos vendo hoje em dia é a grande síntese gnóstico-hegeliana entre Estado e Grandes Corporações, quer dizer, o fascismo internacional.
5.3) Enquanto o conservador não entender que sua cosmovisão é gnóstica e imanente, que ele perdeu de vista a transcendência das Pessoas Divinas, e que ele está totalmente enredado pela dialética neoplatônica que remonta à "teologia" agostiniana, a grande síntese gnóstica inevitavelmente se dará, e ele será esmagado.
Matheus Conrado Scandolo: De onde vinha o dinheiro dos templários
Robero Santos:
1) Eles criaram um sistema de notas promissórias para os fiéis que iam para a Palestina. Como era inconveniente levar ouro ou prata na viagem, a pessoas depositavam esses metais aqui no ocidente, recebiam uma espécie de cheque ou nota promissória e trocavam novamente lá na Palestina.
2) Com o tempo os Templários começaram a perceber que as pessoas depositavam seus metais preciosos apenas por questões de segurança - e apenas uma parte dessas pessoas voltava para fazer o saque. Aí então eles começaram a fazer empréstimo a juros com base nessa reserva. Como a maioria não voltava para sacar, eles começaram a fracionar a reserva. Imprimiam mais notas do que possuíam de reserva, exatamente como os bancos fazem hoje.
3) Essa prática, em si mesma, já pode ser considerada "magia negra". Vou explicar isso em posts futuros.
Matheus Conrado Scandolo: Existe alguma literatura em português sobre o assunto?
Roberto Santos: Infelizmente, eu não conheço.
Amanda kelly: Amigo, não entendi onde Santo Agostinho se encaixa no contexto que você descreve. Confesso que estou entendendo seus posts apenas parcialmente.
Roberto Santos: Santo Agostinho, ao explicar a Trindade pelo neoplatonismo, reduziu as Pessoas Divinas à Natureza Divina.
Amanda Kelly: Entendi.
Pedro Chudyk Huberuk: Como perceber a Trindade sem cair nesse problema neoplatônico?
Roberto Santos: Um camarada que ajuda a entender esse problema é São Máximo Confessor, principalmente no diálogo com Pyrrus. Agostinho reduziu as Pessoas Divinas à Natureza Divina, de forma que hoje em dia é difícil para um ocidental perceber a distinção entre Pessoa e Natureza, não só na Trindade, mas em nós mesmos. Não raro você percebe que as pessoas confundem a alma com o eu ou a pessoa. Por que acontece isso? Por causa dessa confusão gerada pela explicação agostiniana da Trindade.
Pedro Chudyk Huberuk: Duns Scott ajuda a diminuir essa confusão?
Roberto Santos: Duns Scott não ajuda.
Fábio Salatiel: Você querendo está dizer que uma pessoa jurídica é aquilo que une as pessoas físicas que estão sob a sua "jurisdição" num acordo de ação mútua em prol dos fins daquela mesma instituição?
Roberto Santos: Mais ou menos isso.
Fábio Salatiel: E, nesse sentido, a dialética é a soma de conflitos e convergências de interesse que se formulam num determinado acordo que visa a relação entre as partes concordantes? Isso me um conceito semelhante ao contrato que Antônio e Shylock lavraram na peça O Mercador de Veneza, de Shakespeare. Onde já se cria aí um corpo fictício imperecível que pode assumir dívidas ilimitadas.
Roberto Santos: Sim.
Fábio Salatiel: É incrível como a literatura influencia a nossa capacidade de entendimento!
Doug Nogueira: A idéia do cidadão tem relação ao que você disse? "você é um cidadão e têm direitos próprios de cidadão". (esta pergunta ainda não foi respondida).
Fontes deste debate:
https://web.facebook.com/roberto.santos.3114/posts/10215904211741622
https://web.facebook.com/roberto.santos.3114/posts/10215905682178382
https://web.facebook.com/roberto.santos.3114/posts/10215905932344636
https://web.facebook.com/roberto.santos.3114/posts/10215905932344636
Facebook, 4 de março de 2018 (data da postagem original).