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sexta-feira, 2 de setembro de 2016

Notas sobre o conceito de anatocismo no Direito Civil e no Direito Comercial

1) Dois são os fundamentos do anatocismo.

1.1) O primeiro se dá por força de um juro devido e não pago. Por conta do fato de se amar mais o dinheiro do que a Deus - o que é um indício sociológico claro de que não existe senso de fraternidade universal na comunidade onde a relação de empréstimo é praticada -, arbitra-se um juro punitivo, por força da mora, que será cobrado por força daquilo que foi convencionado em contrato. E isso não é justo, pois forçará a pessoa a exercer arbitrariamente as próprias razões, por conta da desconfiança, o que é crime - e isso servirá de base para outros crimes, como a extorsão, que é cultura de desconfiança sistemática. Como isso gera conflito de interesses qualificado pela pretensão resistida, o direito civil tende a prevenir o conflito e vedar essa prática.

1.2) A segunda se dá por força do que já foi pago.

1.2.1) Se num mês A eu tinha R$ 1.000,00, então no mês B eu terei R$ 1,100,00, por força de um empréstimo desse capital com juros de 10% ao mês e que foi efetivamente pago. Como isso me gerou um enriquecimento, fundado numa causa justa, então, por força da ganância - que me leva a falsos entendimentos acerca da realidade -, eu tendo a querer chamar ainda mais dinheiro, por força desse dinheiro empestado sistematicamente - e esse novo valor logo estará disponível agora para ser emprestado ao próximo que tomar os meus serviços, valendo-se do princípio da integralidade do capital, já que o ato de emprestar sistematicamente acaba se tornando uma atividade profissional, feita com o intuito de se ganhar mais dinheiro, pouco importando se o meu tomador é bom ou mau pagador - o que caracteriza uma atividade comercial, uma atividade de trato sucessivo.

1.2.2) Como esse serviço está sendo feito sistematicamente, tal qual uma máquina - já que estou dando mais ênfase ao fato de ganhar dinheiro, aos bens presentes, do que em ajudar pessoas, o que me levaria a receber os bens futuros decorrentes da boa ajuda (o que seria arriscado, dado que me forçaria a conhecer as pessoas que tomam o meu dinheiro e assim participar do negócio) -, então haverá juros sobre juros, por força do princípio da impessoalidade, uma vez que estou mais interessado no dinheiro no que nas pessoas que estou ajudando - e se um empréstimo não me é devidamente pago, eu acabo arbitrando anatocismo, juro punitivo por força da maneira como administro o negócio, fundado no fato de que o capital deve ser integralizado de modo a gerar muito mais empréstimos, já que vivo disso.

1.2.3) Se o empréstimo é feito de maneira impessoal, fundado no amor ao dinheiro, então ele tende a ser sem causa - por isso mesmo, a atividade empresarial feita dessa forma acaba gerando liberdade para o nada, resultando em grave prejuízo para a ordem publica e para os meus semelhantes sistematicamente, pois, como agente da atividade bancária, não estou interessado em participar dos empreendimentos alheios, o que é negação da fraternidade universal.

2) A prática da usura, do anatocismo, está fundada no princípio de que dinheiro chama dinheiro - logo, o empréstimo perde sua dimensão de investimento, sua finalidade produtiva, sua causalidade e passa a gerar conflitos de interesse, já que a economia se tornará impessoal e as relações sociais se tornarão parasitárias, por força desse amor ao dinheiro. E isso edifica liberdade para o nada, a ponto de relativizar tudo o que há de mais sagrado, de modo a que as pessoas possam bem viver em comunidade. Não é à toa que o comunismo nasceu dessa cultura parasitária, uma vez que é ressentimento.

3) Não é à toa que o anatocismo nasce da impessoalidade, que nega o princípio da causalidade - e isso nega a justiça. Como serve liberdade para o nada, então eu vejo meu semelhante como um escravo e não como um irmão, pois não vejo nele a figura de Cristo.

José Octavio Dettmann

Rio de Janeiro, 2 de setembro de 2016.

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