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sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

Como sair do quinhentismo?


01) Para se fazer toda uma má literatura, é preciso que haja toda uma sorte de bons sentimentos - e dos bons sentimentos emana toda uma sorte de boas intenções; nisso, o inferno está cheio. Neste ponto, André Gide tem toda a razão.

02) Por esse prisma, o romantismo brasileiro deu causa a toda uma tradição de literatura ruim que em nada ajudou para a construção do imaginário da pátria recém-independente. Pelo contrário, ela deu causa para que se tomasse o Brasil como se fosse religião de Estado. Através do indianismo, ela estabeleceu entre nós a cultura do quinhentismo, que sedimentou um nacionalismo estatolátrico, de tipo republicano, de cujo atoleiro a gente não consegue mais sair.

03) Ao se tomar como marco fundacional da literatura em nossa terra a Carta de Pero Vaz de Caminha, instalou-se a confusão: Cabral - que deveria ser visto como conseqüência daquela visão que El-Rei D. Afonso Henriques teve de Cristo Crucificado, que, por sua vez, disse que Portugal seria grande se servisse a Ele em terras distantes como a nossa - agora foi tomado como causa da fundação da pátria. Quando se confunde causa com conseqüência o materialismo histórico termina sedimentado entre nós.

04) Da má literatura decorre toda uma cultura de má consciência. Como a experiência humana coletada é ruim, a tendência é a pátria morrer em plena vida, com o passar do tempo.

05) À medida que o país foi caindo no marxismo cultural, o ciclo foi se completando. Hoje não temos mais literatura - sinal de que o quinhentismo entrou em crise, pois ele já não produz mais frutos. Graças a Deus, a árvore envenenada parou de frutificar.

06) O primeiro passo para se restaurar a imaginação do povo é a restauração do sentido pelo qual esta pátria foi fundada. O Brasil foi fundado a partir da visão que D. Afonso Henriques teve de Cristo crucificado, de que era preciso servir a Ele em terras distantes. Por essa via, Cabral é conseqüência e não causa.

07) Como o povoamento do país se deu em razão dessa missão, o modelo inteiro de sociedade virtuosa que devemos ter deve se fundar a partir dessa visão - e toda a literatura rica de imaginação deve ser construída no sentido de que Portugal e seus territórios serão grandes enquanto servirem a Cristo em terras distantes.

08) Enfim, o que vige para o mundo lusitano como um todo é cláusula natural e constitucional do enquanto bem servir - e disso não podemos sair. O maior exemplo dessa experiência é que temos o Padre Antônio Vieira como a maior expressão viva de toda essa tradição literária fundacional anterior a 1822. Até hoje insuperável.

09) Conforme o país foi perdendo toda essa relação com o transcendente, mais a literatura foi ficando pobre. O realismo resgata um pouco da riqueza literária, mas a partir do materialismo, a partir de figuras humanas pobres e mesquinhas, nascidas de um tecido social em que a sociedade se formou a partir de filhos naturais (bastardos), criados sem a figura do pai como cabeça de uma família, base de toda e qualquer fundação civilizacional cristã. Toda essa relação com o transcendente foi-se perdendo ao longo da colonização durante o período das revoluções liberais que sacudiram a Europa e que tiveram séria influência na literatura daqui, pois muitos imitavam as coisas que vinham de lá -  isso facilitou a ocupação de espaço promovida pelo marxismo cultural, que matou o pouco que ainda sobrava do país. Foi um longo processo de decantação, decorrente de pecados acumulados ao longo das gerações.

10) O problema da nossa literatura não é reflexo de uma má economia - é decorrente de um processo de formação nacional extremamente falho e deficiente. Desse atoleiro a gente só sai quando o sentido da missão em servir a Cristo Crucificado em terras distantes for restaurado - o sentido de se tomar o país como um lar decorre daí. E é daí que saem as experiências sociais ricas e virtuosas tão necessárias para se fazer boa literatura, pois da pátria pequena das circunstâncias do nosso dia-a-dia é que nasce toda a experiência necessária para se tomar a pátria imperial como sendo o nosso único e verdadeiro lar. Pois outro caminho não há.

11) Esse resgate do realismo só teve um alcance provisório e não se sustentou com o passar do tempo, dado que não havia uma causa perene que mantivesse nossa imaginação rica, de modo a que servíssemos exemplos de virtudes aos nossos semelhantes.

12) Enfim, eis o segredo: precisamos escrever com realismo, mas fundado na conformidade com o Todo que vem de Deus. Este é o segredo para se casar ciência com literatura, de modo a tomar o país como um lar em Cristo.

José Octavio Dettmann

Rio de Janeiro, 14 de fevereiro de 2014.

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